Art. 6 ― Se o pecado é
convenientemente definido assim: o dito, feito ou desejado contra a lei eterna.
(II Sent., dist. XXXV, a. 2; De
Malo, q. 2, a. 1).
O
sexto discute-se assim. ― Parece que o pecado é inconvenientemente definido: o
dito, feito ou desejado contra a lei eterna.
2.
Demais. ― Agostinho diz: O pecado é a vontade de reter ou conseguir o que a
justiça proíbe 2. Ora, tomando-se a consequência em sentido lato, no
sentido de qualquer apetite, ela compreende a vontade. Logo, bastaria dizer: é
pecado o desejado contra a lei eterna, sem ser preciso acrescentar: dito ou
feito.
3.
Demais. ― O pecado parece que consiste propriamente no desvio do fim, pois, o
bem e o mal consideram-se principalmente em relação ao fim, como do sobredito
resulta 3. Por isso, Agostinho define o pecado relativamente ao fim,
dizendo 4: pecar não é senão buscar as causas temporais, desprezando
as eternas, e ainda: toda a perversidade humana consiste em usarmos do que
devemos fruir e fruirmos do que devemos usar. Ora, na definição pré-citada não
se faz nenhuma menção do desvio do fim devido. Logo, o pecado é
insuficientemente definido.
4.
Demais. ― Chama-se proibido ao contrário à lei. Ora, nem todos os pecados são
maus por serem proibidos, antes, alguns são proibidos por serem maus. Logo,
numa definição comum, não se devia dizer que o pecado vai contra a lei de Deus.
5.
Demais. ― Pecado significa um acto humano mau, como do sobredito resulta 5.
Ora, o mal do homem é ir contra a razão, como diz Dionísio 6. Logo,
devia antes dizer, que o pecado é contra a razão do que contra a lei eterna.
Em
contrário, basta a autoridade Agostinho.
Como é claro pelo já dito 7, o pecado não é senão um acto humano
mau. Ora, o que torna humano um acto é o ser voluntário, como pelo sobredito se
patenteia 8. Voluntário, ou por ser como elícito da vontade, sendo
tal o caso do querer ou do escolher, ou por ser por ela imperado, como os actos
exteriores de falar ou obrar. Por outro lado, o que torna mau é o ser falto da
comensuração devida. E como toda comensuração supõe a comparação com uma regra,
faltando esta, essa coisa será in-comensurada. Ora, a regra da vontade humana é
dupla. Uma próxima e homogénea, que é a própria razão humana, a outra é a regra
primeira, a saber, a lei eterna, que é a quase razão de Deus. E por isso
Agostinho, na definição do pecado, introduziu dois elementos. Um pertence à
substância do acto humano, como o que é quase material no pecado, quando diz: o
dito, o feito ou desejado, outro, pertencente à essência do mal, como sendo o
que no pecado é quase formal, quando diz: contra a lei eterna.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― Afirmação e negação reduzem-se ao mesmo género,
assim como, nas Pessoas Divinas, gerado e não gerado se reduzem à relação, no
dizer de Agostinho 9. Portanto, devemos considerar como significando
o mesmo ― dito e não dito, feito e não feito.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― A causa primeira do pecado está na vontade, que rege todos os actos
voluntários, únicos susceptíveis dele. E por isso, Agostinho às vezes define o
pecado só pela vontade. Mas como também os actos exteriores pertencem à
substância do pecado, sendo em si mesmos, maus, segundo dissemos, é necessário
também introduzir na definição dele algo de pertencente a tais actos.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― A lei eterna, primária e principalmente, ordena o homem para o
fim, e por consequência leva-o a usar bem dos meios. E por isso, quando a
definição diz ― contra a lei eterna ― toca no desvio do fim e em tudo o mais
que seja desordenado.
RESPOSTA
À QUARTA. ― Quando se diz que nem todo pecado é um mal por ser proibido,
entende-se a proibição do direito positivo. Se porém nos referimos ao direito
natural, contido primariamente na lei eterna, e secundariamente no judicatório
natural da razão humana, então todo pecado é mal, por ser proibido. Pois, sendo
por isso mesmo desordenado repugna ao direito natural.
RESPOSTA
À QUINTA. ― O pecado é considerado pelos teólogos principalmente como ofensa a
Deus, porém, pelo filósofo moral, enquanto contrário à razão. Por onde,
Agostinho definia o pecado convenientemente, antes, pelo que tem de contrário à
lei eterna, do que por ser contra a razão. Tanto mais que, pela lei eterna, nós
nos regulamos em muitos casos excedentes à razão humana, como se dá com as
coisas da fé.
Revisão da tradução portuguesa por ama
_______________________________________
Notas:
1.
q. 71, a. 5.
2.
De duabus animabus (cap. XI).
3.
Q. 18, a. 6.
4.
I De libero arbitr. (cap. XVI).
5.
Q. 71, a. 1.
6.
IV De div. nom., cap. XII.
7.
Q. 71, a. 1.
8.
Q. 1, a. 1.
9.
V De Trinit. (cap. VI et VII).
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