17/01/2014

Tratado dos dons do Espírito Santo 03



Questão 68: Dos dons.


Art. 3 — Se os dons do Espírito Santo são hábitos.




O terceiro discute-se assim — Parece que os dons do Espírito Santo não são hábitos.

1. — Pois, o hábito, sendo uma qualidade dificilmente mutável, como se disse 1, é qualidade permanente no homem. Ora, é próprio de Cristo, que os dons do Espírito Santo descansem nele, como diz a Escritura (Is 11, 2). E noutro lugar (Jo 1, 33): Aquele sobre que tu vires descer o Espírito, e repousar sobre ele, esse é o que baptiza. E Gregório, expondo este texto diz: O Espírito Santo vem ter com todos os fiéis, mas permanece singularmente só com o Mediador 2. Logo, os dons do Espírito Santo não são hábitos.

2. Demais. — Os dons do Espírito Santo aperfeiçoam o homem, levando-o pelo Espírito de Deus, como já se disse 3. Ora, levado por esse Espírito, o homem desempenha o papel de instrumento em relação a ele. Ora, não é próprio do instrumento ser aperfeiçoado por um hábito, senão do agente principal. Logo, os dons do Espírito Santo não são hábitos.

3. Demais. — Assim como os dons do Espírito Santo provêm da inspiração divina, assim também o dom da profecia. Ora, este não é hábito, pois o espírito de profecia não está sempre presente ao profeta, como diz Gregório 4. Logo os dons do Espírito Santo também não são hábitos.

Mas, em contrário, o Senhor diz aos discípulos, falando do Espírito Santo (Jo 14, 17): Ele ficará connosco e estará em vós. Ora, o Espírito Santo não está no homem sem os seus dons. Logo, estes ficam nos homens e, portanto, não são só actos ou paixões, mas também hábitos permanentes.

Como já se disse 5, os dons são certas perfeições do homem, que o tornam bem-disposto a seguir o instinto do Espírito Santo. Ora, é manifesto, pelo sobredito, que as virtudes morais aperfeiçoam a potência apetitiva, fazendo-a participar, de certo modo, da razão, pois é-lhe natural ser movida pelo império desta última. Donde, os dons do Espírito Santo estão para o homem, relativamente ao Espírito, como as virtudes morais para a potência apetitiva, relativamente à razão. Ora, as virtudes morais são hábitos que dispõem as potências apetitivas a obedecerem prontamente à razão. Donde, também os dons do Espírito Santo são hábitos que tornam o homem apto a obedecer prontamente a esse Espírito.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Gregório, no mesmo passo aduzido, solve a dificuldade dizendo: O Espírito Santo permanece sempre em todos os eleitos, quanto aos dons sem os quais não podem chegar à vida eterna, mas, quanto aos outros, nem sempre permanece 6. Ora, os sete dons são necessários à salvação, como já dissemos 7. Logo, quanto a eles, o Espírito Santo permanece sempre nos santos.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A objecção procede quanto ao instrumento, que não age, mas é somente passivo. Ora, o homem não é tal instrumento, pois, dotado de livre arbítrio, também assim age quando levado pelo Espírito Santo. Logo, precisa de um hábito.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A profecia é um dos dons que servem à manifestação do Espírito, e não é de necessidade para a salvação. Por onde, não há símile.

(Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama)
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Notas:
1. Praedicamentis (cap. IV).
2. II Moral. (cap. LVI).
3. Q. 68, a. 1, 2.
4. Homil. I sup. Ezechielem.
5. Q. 68, a. 1.
6. II Moral. (cap. LVI).

7. Q. 68, a. 2.

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