Art. 2 — Se as virtudes
morais se distinguem entre si por serem, umas relativas às obras e outras, às
paixões.
(III
Ethic., lect. VIII).
O
segundo discute-se assim. — Parece que as virtudes morais não se distinguem
entre si por serem, umas, relativas às obras e outras, às paixões.
1.
— Pois, como diz o Filósofo, a virtude moral versa sobre o prazer e a tristeza
e obra o que é ótimo 1. Ora, o prazer e a tristeza são paixões, como
já se disse 2. Logo, a mesma virtude, que versa sobre as paixões,
versa também, como operativa, sobre as obras.
2.
Demais. — Sendo as paixões princípios das obras externas, as virtudes que as
retificam, hão-de, consequente e necessariamente, retificar também as obras.
Logo, as mesmas virtudes morais versam sobre as paixões e sobre as obras.
3.
Demais. — O apetite sensitivo é movido, bem ou mal, a todas as obras
exteriores. Ora, estes movimentos são paixões. Logo, as mesmas virtudes, que
versam sobre as obras versam também sobre as paixões.
Mas,
em contrário, o Filósofo diz que a justiça versa sobre as obras, e por outro
lado, a temperança, a fortaleza e a mansidão, sobre certas paixões 3.
A obra e a paixão podem relacionar-se de dois modos com a virtude. Primeiro,
como efeito e, então, toda virtude moral produz certas obras boas, e uma certa
deleitação ou tristeza, que são paixões, como já dissemos 4. — Em
segundo lugar, a obra pode relacionar-se com a virtude moral, como a matéria
sobre a qual versa. E então, as virtudes morais, umas versam sobre as obras e
outras, sobre as paixões.
E
a razão disto está em o bem e o mal de algumas obras se fundarem nelas próprias,
como quer que o homem seja afectado por elas, i. é, o bem e o mal depende delas
da relação de medida com outra coisa. Assim sendo, é necessário haver uma
virtude directiva das obras, em si mesmas, tal é o caso da compra e venda, e actos
semelhantes, nos quais se leva em conta a relação de débito ou de não-débito
para com outrem. E por isso a justiça e as suas partes dizem respeito propriamente
às obras, como sua matéria adequada. — O bem e o mal de outras porém fundam-se apenas
na relação de medida com o sujeito delas. E por isso, neste caso, é necessário
levar em conta o modo bom ou mau por que este é afectado, e por consequência
necessária, as virtudes, relativas a essas obras versam principalmente sobre os
afectos internos chamados paixões da alma, e isso dá-se com a temperança, a
fortaleza e virtudes semelhantes.
Ora,
pode acontecer que, nas obras relativas a outrem, seja posposto o bem da
virtude pela paixão desordenada da alma. E então, desaparecida a relação de
medida da obra exterior, há-de desvanecer-se a justiça, e a desaparição
corrompida da relação de medida das paixões interiores acarretará a desaparição
de alguma outra virtude. Assim, quem levado da ira, fere indevidamente outrem,
lesa ao mesmo tempo a justiça, ao passo que a ira imoderada elimina a mansidão.
E o mesmo se dá nos casos semelhantes.
E
daqui se deduzem as RESPOSTAS ÀS OBJEÇÕES. — Pois, a primeira objecção funda-se
na obra enquanto efeito da virtude. — As outras duas fundam-se em que o acto e
a paixão concorrem para o mesmo fim, mas, em certos casos, a virtude versa
principalmente sobre a obra — e, em outros, sobre a paixão, pela razão já
exposta.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
____________________
Notas:
1. II Ethic. (lect. III).
2. Q. 31, a. 1, q. 3, a. 1.
3. II Ethic., lect. VIII.
4. Q. 59, a. 4, ad 1.
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