Art. 1 — Se os hábitos
intelectuais especulativos são virtudes.
(III Sent., dist. XXIII, q. 1,
a. 4, qª 1, De Virtut., q. 1 a. 7).
O
primeiro discute-se assim. — Parece que os hábitos intelectuais especulativos
não são virtudes.
1.
— Pois, a virtude é um hábito operativo, como já se disse 1. Ora, os
hábitos especulativos não são operativos, pois o especulativo difere do prático
ou operativo. Logo, os hábitos intelectuais especulativos não são virtudes.
2.
Demais. — A virtude visa tornar o homem feliz ou beato, pois, a felicidade é o
prémio da virtude, como diz Aristóteles 2. Ora, os hábitos
intelectuais não consideram os actos humanos ou os outros bens humanos pelos
quais o homem alcança a felicidade, mas antes, as coisas naturais e divinas.
Logo tais hábitos se não podem denominar virtudes.
3.
Demais. — A ciência é um hábito especulativo. Ora, a ciência e a virtude
distinguem-se entre si como géneros diversos não subalternados, segundo se vê
no Filósofo 3. Logo, os hábitos especulativos não são virtudes.
Mas,
em contrário. — Só os hábitos especulativos consideram o necessário e que não
pode existir de outro modo. Ora, o Filósofo inclui, certas virtudes
intelectuais na parte da alma que considera o necessário e que não pode ter
outro modo de existir 4. Logo, os hábitos intelectuais especulativos
são virtudes.
Toda virtude, sendo ordenada para o bem, como já dissemos 5, de
duplo modo um hábito pode ser considerado virtude, conforme também já ficou
dito 6. Ou porque dá a faculdade de obrar rectamente, ou porque, com
a faculdade, torna também bom o uso da mesma. Ora, este último caso, segundo já
ficou dito 7, só pertence aos hábitos referentes à parte apetitiva,
porque a faculdade apetitiva da alma é que nos faculta usar de todas as
potências e hábitos.
Como
pois os hábitos intelectuais especulativos não aperfeiçoam a parte apetitiva,
nem de certo modo, lhe digam respeito, senão só à intelectiva, podem-se chamar
virtudes, enquanto tornam capaz a faculdade da sua acção recta, que é a
consideração da verdade, actividade recta do intelecto. Mas não se chamam
virtudes, conforme o segundo modo, quase fazendo com que usemos bem da potência
ou do hábito. Pois, não é por termos o hábito da ciência especulativa que nos
inclinaremos a usar dele, esse hábito só nos confere a faculdade de especular a
verdade em relação àquilo de que temos ciência. Mas só a moção da vontade é que
nos leva a usar da ciência habitual. Donde, a virtude que aperfeiçoa a vontade,
como a caridade ou a justiça, também nos leva a empregar rectamente os hábitos
especulativos de que tratamos. E assim sendo, pode haver mérito também nos actos
desses hábitos, se forem feitos com caridade, e neste sentido Gregório diz que
a vida contemplativa tem maior mérito que a activa 8.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Há uma dupla actividade: a exterior e a
interior. Ora, o que é prático ou operativo, e se opõe ao especulativo, se
funda na actividade exterior, ao que não se ordena o hábito especulativo. Mas
este ordena-se à actividade interna do intelecto, consistente em especular a
verdade, e por este lado é um hábito operativo.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — De dois modos se diz que a virtude visa sobre certos respeitos. —
De um modo, como sendo estes, objectos. E então, as referidas virtudes
especulativas não respeitam o porque o homem se torna feliz, a menos que a
expressão por que exprima a causa eficiente, ou o objecto da felicidade
completa, que é Deus, objecto supremo da especulação. — De outro modo, como
sendo actos, e então as virtudes intelectuais visam o por que o homem se torna
feliz, quer por poderem os actos dessas virtudes ser meritórias, como já se
disse, quer por serem uma incoação da perfeita beatitude, consistente na
contemplação da verdade, conforme ficou dito acima 9.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — A ciência opõe-se à virtude tomada na segunda acepção e
pertencente à potência apetitiva.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. Q. 57, a. 2.
2. I Ethic. (lect. XIV).
3. IV Top. (cap. II).
4. VI Ethic. (lect. IV).
5. Q. 55, a. 3.
6. Q. 56, a. 3.
7. Ibid.
8. VI Moral. Cap.
XXXVII.
9.
Q. 3, a. 7.
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