Art. 3 — Se a nossa
excelência é a causa de nos irarmos mais facilmente.
O
terceiro discute-se assim. — Parece que a nossa excelência não é a causa de nos
irarmos mais facilmente.
1. — Pois, como diz o Filósofo, alguns, como os enfermos, os necessitados e os que não obtêm o que desejam ficam mais irados, quando ofendidos 1. Ora, tudo isto parece supor uma certa deficiência. Logo, esta, mais que a excelência, torna-nos inclinados à ira.
2.
Demais — No mesmo passo diz o Filósofo, que nós nos iramos, sobretudo, quando
os outros nos desprezam suspeitando que não tenhamos uma determinada qualidade,
ou apenas diminutamente, mas, isso não nos importa, pois nos julgamos
excelentes relativamente aquilo por que nos desprezam 2. Ora, o
desprezo em questão funda-se numa deficiência. Logo, esta é, mais que a
excelência, causa de nos irarmos.
3.
Demais — Tudo o concernente à excelência é o que sobretudo torna os homens
alegres e esperançosos. Ora, o Filósofo diz, que os homens não se iram quando
se divertem, riem, vão a festas, gozam da prosperidade, realizam os seus
planos, deleitam-se com o que não é torpe e vivem esperançosos 3.
Logo, a excelência não é causa da ira.
Mas,
em contrário, diz o Filósofo, que a excelência é causa de os homens ficarem
indignados 4.
Podemos considerar a causa da ira no irado, de dois modos. — Primeiro,
relativamente ao motivo dela, e, então a excelência é a causa de nos irarmos
facilmente. Pois, o motivo da ira é o desprezo injusto, como já dissemos 5.
Ora, é claro que quanto mais excelentes formos, tanto mais injustamente seremos
desprezados, naquilo porque excelemos. Donde, os que têm alguma excelência
ficam sobretudo irados quando os desprezamos, p. ex., quando desprezamos o rico
no seu dinheiro, o orador na sua eloquência e assim por diante. — De outro
modo, relativamente à disposição que o desprezo causa em nós. Pois, como é
manifesto, o que nos move à ira não é senão a ofensa, que nos punge. Ora, é por
algum defeito que sobretudo sofremos, pois nos ofendemos facilmente pelos
defeitos que temos. E esta é a causa de os fracos, ou os que têm outras deficiências,
se irarem mais facilmente, pois, mais facilmente se ofendem.
Donde
se deduz clara a RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Quem é desprezado naquilo precisamente onde é manifestamente
excelente, como julga não padecer com isso nenhum detrimento, não sofre, e por
isso não se ira. Mas, por outro lado, por ser mais indignamente desprezado tem
maior razão de se irar, a menos que não se julgue objecto de zombaria e
escárnio, não por desprezo, mas por ignorância ou coisa semelhante.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — Tudo o que a objecção enumera trava a ira na medida em que impede
o sofrimento. Mas por outro lado, provoca naturalmente a ira, fazendo com que
sejamos desprezados mais inconvenientemente.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
____________________
Notas:
1.
II Rhetoric. (cap. II).
2.
Ibidem.
3. II Rhetoric. (cap. III).
4. II Rhetoric. (cap.
IX).
5.
Q. 47, a. 2.
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