21/06/2013

Tratado das paixões da alma 58



Questão 34: Da bondade e da malicia dos prazeres

Art. 4 ― Se o prazer é a medida ou a regra do bem e do mal.

(IV Sent., dist. XLIX, q. 3, a. 4, qa. 3, ad 1).



O quarto discute-se assim. ― Parece que o prazer não é a medida ou regra do bem e do mal moral.


1. ― Pois, como diz Aristóteles, todas as coisas se medem pela primeira no género 1. Ora, o prazer não está em primeiro lugar no género da moralidade, mas o precedem o amor e o desejo. Logo, não é a regra da bondade e da malícia moral.

2. Demais. ― A medida e a regra devem ser uniformes, e por isso o movimento uniforme por excelência é a medida e a regra de todos os outros movimentos, como diz Aristóteles 2. Ora, o prazer é vário e multiforme, pois uns são bons e outros maus. Logo, não é a medida e a regra da moralidade.

3. Demais. ― Julgamos mais certamente do efeito pela causa do que inversamente. Ora, a bondade ou a malícia da acção é causa da bondade ou malícia do prazer, porque bons são os prazeres consecutivos às boas acções, maus os consecutivos às más, como diz Aristóteles 3. Logo, os prazeres não são a regra e a medida da bondade e da malícia moral.

Mas, em contrário, diz Agostinho, a propósito de um salmo ― ó Deus, que sondas os corações e as entranhas: O fim dos cuidados e dos pensamentos é o prazer, a que todos nos esforçamos por chegar. E o Filósofo diz, que o prazer é um fim arquitectónico, i. é., principal, relativamente ao qual julgamos que tal acção é boa e tal outra má, absolutamente 4.

A bondade e a malícia moral consistem principalmente na vontade, como já dissemos 5. E pelo fim conhecemos se esta é boa ou má. Ora, consideramos como fim aquilo no que a vontade descansa, e o descanso da vontade ou de qualquer apetite no bem é o prazer. Donde, julgamos principalmente pelo prazer da vontade humana se um homem é bom ou mau: bom e virtuoso é o que se compraz nas obras das virtudes, mau, o que se compraz nas obras más.

Os prazeres do apetite sensitivo porém não são a regra da bondade nem da malícia, assim, a comida é deleitável em geral para o apetite sensitivo tanto do bom como do mau. Mas a vontade dos bons com ela se deleita conforme a conveniência da razão, da qual não cura a vontade dos maus.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― O amor e o desejo têm prioridade sobre o prazer, na via da geração. O prazer porém é anterior se considerarmos a ideia de fim, pois este exerce a função de princípio, relativamente às acções, ora, julgamos sobretudo como regra ou medida por este princípio.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Todos os prazeres são uniformes no serem o repouso em algum bem, e assim podem servir de regra ou medida. Assim, bom é aquele cuja vontade repousa no verdadeiro bem, mau pelo contrário aquele cuja vontade descansa no mal.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― O prazer aperfeiçoando, como fim, a operação, como já dissemos 6, não pode ser perfeitamente boa uma operação sem ser acompanhada do prazer fundado no bem, pois a bondade de uma acção depende do fim. E assim, de certo modo, a bondade do prazer é a causa da bondade da operação.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. X Metaph., lect. II.
2. X Metaph., lect. II.
3. X Ethic., lect. VIII.
4. VII Ethic., lect. XI.
5. Q. 20, a. 1.
6. Q. 33, a. 4.

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