Em
seguida devemos tratar dos actos da vontade concernentes aos meios. São três:
eleger, consentir e usar. Ora, como à eleição precede o conselho, devemos
tratar, primeiro, da eleição, segundo, do conselho, terceiro, do consentimento,
quarto do uso.
Sobre
a eleição, seis artigos se discutem:
Art.
1 ― Se a eleição é acto da vontade ou da razão.
Art.
2 ― Se a eleição convém aos brutos.
Art.
3 ― Se a eleição só existe em relação aos meios.
Art.
4 ― Se a eleição só existe em relação aos actos humanos.
Art.
5 ― Se há eleição só do possível.
Art.
6 ― Se o homem elege necessariamente.
(I, q. 83, ª 3, II Sent., dist.
XXIV,
q. 1, a . 2, De Verit., q. 22, a . 15, III Ethic., lect. VI, IX, VI, lect. II).
O
primeiro discute-se assim. ― Parece que a eleição não é acto da vontade, mas da
razão.
1.
― Pois, a eleição importa numa certa comparação, pela qual se refere uma coisa
a outra. Ora, comparar é próprio da razão. Logo, também a esta pertence a
eleição.
2.
Demais. ― A mesma faculdade é a que raciocina e conclui. Ora, raciocinar, na
ordem dos actos é próprio da razão. E como a eleição é uma como conclusão, na
ordem dos actos, como diz Aristóteles 1, parece que ela é um acto da
razão.
3.
Demais. ― A ignorância não é própria da vontade, mas, da virtude cognitiva.
Ora, há uma certa ignorância da eleição, como diz Aristóteles 2.
Logo, a eleição não pertence à vontade mas, à razão.
Mas,
em contrário, diz o Filósofo, que a eleição é o desejo das coisas que estão em
nosso poder 3.
Ora,
o desejo é acto da vontade. Logo, também a eleição.
A palavra eleição inclui algo pertencente à razão ou intelecto e algo
pertencente à vontade. Pois, como diz o Filósofo, a eleição é o intelecto
apetitivo, ou o apetite intelectivo 4. Ora, sempre que dois
elementos concorrem para constituir uma só realidade, um deles é como formal
relativamente ao outro. Donde, Gregório Nisseno (Nemésio), diz que a eleição
nem é o apetite, em si mesma, nem só conselho, mas algo de composto desses dois
elementos5. Pois, assim como dizemos que o animal é composto de corpo e alma, e
que nem o corpo existe por si só, nem a alma só, mas ambos, assim também a
eleição.
Devemos
porém considerar, em relação aos actos da alma, que o acto essencialmente
procedente de uma potência ou hábito, recebe a forma e a espécie da potência ou
hábito superior, segundo a lei que subordina o inferior ao superior. Assim, se
alguém pratica um acto de fortaleza, por amor de Deus, esse acto materialmente
é, certo, de fortaleza, formalmente porém de caridade. Ora, como é manifesto, a
razão precede de certo modo a vontade e lhe ordena o acto, a saber enquanto a
vontade tende para o seu objecto conforme à ordem da razão, pois que a virtude
apreensiva apresenta à apetitiva o seu objecto. Donde, o acto pelo qual a
vontade tende para algo que é proposto como bom, desde que é ordenado a um fim
pela razão, é, certo, um acto de vontade, materialmente, formalmente, porém é acto
de razão. Ora, a substância de tais actos é a matéria, relativamente à ordem
imposta pela potência superior. E portanto, a eleição não é, substancialmente, acto
da razão, mas da vontade, pois ela se completa por um certo movimento da alma
para o bem escolhido. Logo, é de manifesto, acto de potência apetitiva.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A eleição importa numa certa comparação
precedente, mas não é essencialmente a comparação mesma.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― A conclusão do silogismo, mesmo relativo aos actos, pertence à
razão e se chama sentença ou juízo, a que a eleição se subordina. E por isso, a
conclusão, em si, pertence à eleição como a algo dela resultante.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― Diz-se que há ignorância da eleição, não porque a eleição mesma
seja ciência, mas por se ignorar o que se deve escolher.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. VII Ethic., lect. III.
2. III Ethic., lect. III.
3. III Ethic., lect. IX.
4. VI Ethic., lect. II.
5. Lib. De
natura homini., cap. XXXIII.
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