18/01/2013

Tratado dos actos humanos 6


Art. 5 ― Se a violência causa o involuntariedade.



(Infra. q. 73. a . 6, III Ethic., lect. I).





O quinto discute-se assim. ― Parece que a violência não causa o involuntariedade.


1. ― Pois, voluntariedade e involuntariedade procedem da vontade. Ora, esta, como já se disse, não pode ser violentada. Logo, a violência não pode causar o involuntariedade.

2. Demais. ― A involuntarioriedade é acompanhada de tristeza, como diz Damasceno1 e o Filósofo 2. Ora, podemos às vezes sofrer violência sem nos contristarmos. Logo, ela não causa o involuntariedade.

3. Demais. ― O que procede da vontade não pode ser involuntariedade. Ora, há certa violência procedente da vontade, assim quando alguém sobe, carregando um corpo pesado, e quando inflecte os membros contra a flexibilidade natural deles. Logo, a violência não causa o involuntariedade.

Mas, em contrário, diz Damasceno 3 e o Filósofo 4, que há involuntariedade por violência.

A violência se opõe directamente ao voluntário, como também ao natural. Pois a um e outro é comum proceder de princípio intrínseco, pela razão seguinte. Assim como no ser carente de conhecimento, a violência causa o que vai contra a natureza, assim, nos seres que conhecem, a violência produz o que vai contra a vontade. Ora, assim como o que vai contra a natureza se chama inatural, assim, o que vai contra a vontade, chama-se involuntariedade. Donde, a violência causa a voluntariedade.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A involuntariedade opõe-se à voluntariedade, pois, como já se disse 5, chama-se voluntário não só o acto procedente, imediatamente, da própria vontade, mas também ao imperado por ela. Quanto ao primeiro, a vontade não pode ser violentada, como já se disse 6, donde, a violência não pode tornar tal acto involuntariedade. Mas, quanto ao acto imperado, a vontade pode padecer violência e então, relativamente a tal acto, a violência causa a voluntariedade.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Assim como se chama natural ao que é conforme a inclinação da natureza, assim, voluntário ao que é conforme à da vontade. Ora, toma-se natural em dupla acepção. Numa, significa o procedente da natureza como princípio activo, assim, aquecer é natural ao fogo. Noutra, como princípio passivo, e isso porque há, na natureza, inclinação a receber a acção de princípio extrínseco, assim, diz-se que o movimento do céu é natural, por causa da aptidão natural do corpo celeste a tal movimento. Embora seja motor voluntário. E semelhantemente, voluntariedade pode ser tomada em dupla acepção. Numa, relativa à acção, como quando alguém quer fazer alguma coisa, noutra, relativo à paixão, como quando alguém quer sofrer alguma coisa, de outrem. Donde, sendo a acção causada por algo exterior, e permanecendo, no que sofre, a vontade de sofrer, não há, no caso, violento em si, porque, embora o que sofre não contribua para a acção, contribui contudo, querendo sofrer e, por isso, não pode ser considerado involuntariedade.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Como diz o Filósofo 7, o movimento do animal pelo qual às vezes se move contra a inclinação natural do corpo, embora não lhe seja natural, é contudo de certo modo natural ao animal, porque lho é o ser movido conforme o apetite. E portanto, não há violência, absoluta, mas relativamente falando. E, o mesmo devemos dizer, quando inflectimos os membros contra a disposição natural. Pois isto é violento relativamente, a saber, quanto ao membro particular, não porém absolutamente, quanto ao homem agente, em si mesmo.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. Lib. II Orth. Fid., cap. XXIV.
2. III Ethic., lect. IV.
3. Loc. Cit.
4. Lect. I.
5. Q. 6, a. 4.
6. Ibid.
7. VIII Physic., lect. VII.

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