
Questão
6: Da voluntariedade e da involuntariedade.
Questão
7: Das circunstâncias dos actos humanos.
Questão
8: Dos actos em que há vontade.
Questão
9: Do motivo da vontade.
Questão
10: Do modo pelo qual a vontade é movida.
Questão
11: Da fruição.
Questão
12: Da intenção.
Questão
13: Da eleição.
Questão
14: Do conselho.
Questão
15: Do consentimento.
Questão
16: Do uso.
Questão
17: Dos actos ordenados pela vontade.
Questão
18: Da bondade e da malícia dos actos humanos em geral.
Questão
19: Da bondade do acto interior da vontade.
Questão
20: Da bondade e da malícia dos actos humanos exteriores.
Questão
21: Das consequências dos actos humanos em razão da bondade ou da malícia
deles.
Questão
6: Da voluntariedade e da involuntariedade.
Como
é necessário, pois, chegar-se à bem-aventurança por meio de certos actos, é
preciso, consequentemente, tratar dos actos humanos, para conhecermos os que a
ela conduzem ou dela se desviam. Mas, como as operações e os actos dizem
respeito ao singular, toda ciência considerada em particular, operativa se
completa. Donde, a ciência moral, que versa sobre os actos humanos há-de ser
tratada, primeiro, em universal e, segundo, em particular.
Quanto
à consideração universal dos actos humanos, há que, primeiro, tratar deles em
si mesmos, segundo, dos seus princípios. Ora, desses actos, uns são próprios ao
homem, outros são-lhe comuns aos animais. E como a bem-aventurança é bem
próprio do homem, conduzem a ela mais proximamente os actos propriamente
humanos, que os que lhe são comuns com os animais. Portanto, há-de tratar-se,
primeiro, dos actos próprios ao homem. Segundo, dos que lhe são comuns com os
animais, chamados paixões.
Sobre
o primeiro ponto apresentam-se duas considerações: primeira, da condição dos actos
humanos, segunda, da distinção deles. Mas como se chamam actos humanos
propriamente ditos, aos voluntários, por ser a vontade o apetite racional
próprio do homem, é preciso considerar os actos enquanto voluntários. E portanto,
há-de tratar-se, primeiro, da voluntariedade e da involuntariedade em comum,
segundo, dos actos voluntários ilícitos da própria vontade, dela procedente
imediatamente, terceiro, dos actos voluntários imperados pela vontade,
procedentes da vontade mediante outras potências.
E
como os actos voluntários têm certas circunstâncias pelas quais são julgados há-de
tratar-se, primeiro, da voluntariedade e da involuntariedade, e consequentemente,
das circunstâncias dos actos em si, onde se manifesta a voluntariedade e a
involuntariedade.
Sobre
o primeiro ponto oito artigos se discutem:
Art.
1 ― Se há voluntariedade nos actos humanos.
Art.
2 ― Se há voluntariedade nos brutos.
Art.
3 ― Se a voluntariedade pode existir sem algum acto.
Art.
4 ― Se se pode violentar a vontade.
Art.
5 ― Se a violência causa a involuntariedade.
Art.
6 ― Se o medo causa a involuntariedade absoluta.
Art.
7 ― Se a concupiscência causa a involuntariedade.
Art.
8 ― Se a ignorância causa a involuntariedade.
Art.
1 ― Se há voluntariedade nos actos humanos.
(De
Verit., q. 23, a . 1).
O
primeiro discute-se assim. ― Parece que não há voluntariedade nos actos
humanos.
1. ― Pois, como se vê em Gregório Nisseno 1, Damasceno 2 e Aristóteles 3, é voluntariedade o que tem em si mesmo o seu princípio. Ora, o princípio dos actos humanos não está no próprio homem, mas é-lhe exterior, pois, o apetite do homem é movido a agir pelo apetecível, que lhe é exterior e é como que um motor não-movido, conforme diz Aristóteles 4. Logo, nos actos humanos não há voluntariedade.
2.
Demais. ― Como prova o Filósofo 5, não há nos animais nenhum
movimento incipiente que não seja precedido de algum movimento exterior. Ora,
todos os actos do homem principiam, pois nenhum é eterno. Logo, o princípio de
todos os actos humanos é exterior, e portanto não há neles voluntariedade.
3.
Demais. ― Quem age voluntariamente pode agir por si. Ora, tal não convém ao
homem, pois, diz a Escritura (Jo 15, 5): Vós sem mim não podeis fazer nada.
Logo, não há voluntariedade nos actos humanos.
Mas,
em contrário, como diz Damasceno 6, voluntariedade é o acto que é
operação racional. Ora, tais são os actos humanos. Logo, neles há voluntariedade.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Nem todo princípio é princípio primeiro.
Embora, pois, seja da essência da voluntariedade ter princípio intrínseco, não
lhe vai contudo contra a essência que esse princípio seja causado ou movido por
um princípio externo, pois essa essência não exige que tal princípio seja um
princípio primeiro. Deve porém saber-se que pode um princípio de movimento ser
primeiro, genericamente e não o ser em si mesmo, assim, no género dos seres
alteráveis, o alterador primeiro é o corpo celeste, que todavia não é em si
mesmo o primeiro motor, mas é movido localmente, pelo motor superior. Assim,
pois, o princípio intrínseco do acto voluntário, que é a virtude cognoscitiva e
apetitiva, é o primeiro princípio genérico do movimento apetitivo, embora seja
movido por um princípio externo, quanto a outras espécies de movimento.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― Certamente o primeiro movimento do animal é precedido de algum
movimento externo, sob duplo aspecto. Primeiro, enquanto por este movimento
externo um sensível é apresentado ao sentido do animal, cujo sensível,
apreendido, move o apetite. Assim o leão, vendo um veado aproximar-se, pelo seu
movimento, começa a ser movido para ele. Segundo, enquanto, pelo movimento
externo, o corpo do animal começa, de algum modo, a imutar-se, por imutação
natural, p. ex., pelo frio ou pelo calor. Ora, imutado um corpo, pelo movimento
de outro corpo externo, também se imuta, acidentalmente, o apetite sensitivo,
que é virtude do corpo orgânico, assim quando, por uma alteração do corpo,
juntamente se move o apetite à concupiscência. Mas isto não vai contra a
essência da voluntariedade, como já se disse, pois, tais moções por um
princípio externo são de outro género.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― Deus move o homem a agir, não só propondo-lhe ao sentido o apetecível,
ou imutando-lhe o corpo, mas também movendo a própria vontade, porque todo
movimento, tanto da vontade como da natureza, dele procede, como primeiro
motor. E assim como não é contra a essência da natureza que o seu movimento
provenha de Deus, como primeiro motor, por ser a natureza um instrumento de
Deus, que se move, assim, não é contra a essência do acto voluntário proceder
de Deus, por ser a vontade movida por ele. É, porém, comum à essência do
movimento, tanto natural, como voluntário, proceder de um princípio intrínseco.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
_______________________
Notas:
1.
Nemesium, lib. De Nat. Hom., c. XXXII.
2. Lib. II Orthod. Fid., cap.
XXIV.
3. III Ethic., lect. IV.
4.
III De Anima, lect. XV.
5. VIII Physic., lect. IV.
6. II lib. Orthod. Fid.,
cap. XXIV.
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