03/12/2012

CULTIVAR A FÉ 13


Uma pedagogia da fé na família - a propósito de alguns ensinamentos de S. Josemaria …/8

Educação para a santidade.

O primado da graça.


Como era um óptimo teólogo, S. Josemaria não caiu nunca no engano mais clássico do educador cristão: tentar obter do educando com meios humanos o que só pode ser alcançado com a ajuda da graça de Deus. Pelo contrário, desenvolveu uma constante catequese sobre a necessidade de recorrer sempre às fontes da graça, aos sacramentos, e propôs a luta ascética pessoal como correspondência à graça.

Utilizando a terminologia de muitos Padres
[i], falava de divinização do cristão, como uma realidade de facto e como um objectivo. Levava absolutamente a sério, como pertencentes à vida cristã, as expressões de S. João sobre a comunhão (koinonía) entre Cristo e o fiel, que tem como protótipo a comunhão entre Cristo e o Pai. Por exemplo, ensinava a recitar frequentemente e a meditar as palavras de Jesus: “que todos sejam um, como Tu, Pai, em mim e eu em Ti, que assim eles estejam em nós” [ii]. E também: “Se algum me ama, guardará a minha palavra, e o meu Pai o amará e viremos a ele e faremos morada nele” [iii]. Frase que comentava assim: “o coração sente então a necessidade de distinguir e adorar cada uma das pessoas divinas. De certo modo, é uma descoberta que a alma faz na vida sobrenatural, como as de uma criancinha que vai abrindo os olhos à existência. E entretém-se amorosamente com o Pai e com o Filho e com o Espírito Santo; e submete-se facilmente à actividade do Paráclito vivificador, que se nos entrega sem o merecermos; os dons e as virtudes sobrenaturais!” [iv].

Basta um olhar aos escritos de S. Josemaria Escrivá para dar-se conta da profusão com que volta ao tema da inabitação da Santíssima Trindade na alma, do qual faz derivar o programa prático da vida cristã: vida de “filhos no Filho”
[v], quer dizer filhos de Deus in Christo, segundo a expressão recorrente em S. Paulo, pelo envio do Espírito Santo [vi]. S. Paulo, com efeito, desenvolveu o conceito da presença do Espírito na alma, de algum modo pré-anunciada, como foi dito [vii]], por la shekinah de Deus no Templo: “Não sabeis que sois templo de Deus e que o Espírito de Deus habita em vós? (…). O templo de Deus é santo, e esse templo sois vós” [viii].

S. Josemaria formula toda a formação cristã como uma ajuda para que a inabitação e a divinização – e, portanto, a consciência de ser filhos de Deus em Cristo – se traduzam na oração e no recurso oportuno e consciente aos sacramentos. Para ele, conduzir à oração e aos sacramentos era realmente educar.

“Se abandonarmos os Sacramentos, desaparece a verdadeira vida cristã. Contudo, não se nos oculta que particularmente nesta época não falta quem pareça esquecer, e até chegue a desprezar, esta corrente redentora da graça de Cristo. É doloroso falar desta chaga da sociedade que se chama cristã, mas torna-se necessário, para que nas nossas almas se afinque o desejo de recorrermos com mais gratidão e amor a essas fontes de santificação”
[ix].

michele dolz, publicado em Romana, n. 32 (2001), 2011.09.12

Nota: Revisão gráfica por ama.



[i] Cfr., por exemplo, J. Grosso, La divinisation du chrétien d’après les Pères Grecs, Gabalda, Paris 1938; cfr. também o artigo Divinisation, no Dictionnaire de Spiritualité, Beauchesne, Paris.
[ii] Jo 17, 21.
[iii] Jo 14, 23.
[iv] S. Josemaria Escrivá, Amigos de Deus, n. 306.
[v] Concílio Vaticano II, Decl. Gaudium et spes, n. 22.
[vi] Cfr. Gal 4, 6.
[vii] Cfr. L. Bouyer, La Bible et l’Évangile, Du Cerf, Paris 1952; Idem,Mysterion. Du mystère à la mystique, Oeil, Paris 1986.
[viii] 1 Cor 3, 16-17.
[ix] S. Josemaria Escrivá, Cristo que passa, n. 78.

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