Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
Para ver, clicar SFF.
Evangelho: Mc 2, 23-28; 3, 1-12
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23 Sucedeu também que,
caminhando Jesus em dia de sábado, por entre campos de trigo, os discípulos
começaram a colher espigas, enquanto caminhavam. 24 Os fariseus
diziam-Lhe: «Como é que fazem ao sábado o que não é permitido?». 25
Ele respondeu: «Nunca lestes o que fez David, quando se viu necessitado, e teve
fome, ele e os que com ele estavam? 26 Como entrou na casa de Deus,
sendo sumo sacerdote Abiatar, e comeu os pães da proposição, dos quais não era
permitido comer, senão aos sacerdotes, e deu também aos que o acompanhavam?». 27
E acrescentou: «O sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado. 28
Por isso o Filho do Homem é Senhor também do sábado».
3 1
Novamente entrou Jesus na sinagoga, e encontrava-se lá um homem que tinha uma
das mãos atrofiada. 2 Observavam-n'O a ver se curaria em dia de
sábado, para O acusarem. 3 Jesus disse ao homem que tinha a mão
atrofiada: «Vem para o meio». 4 Depois disse-lhes: «É lícito em dia
de sábado fazer bem ou fazer mal? Salvar a vida a uma pessoa ou tirá-la?».
Eles, porém, calaram-se. 5 Então olhando-os com indignação,
contristado da cegueira de seus corações, disse ao homem: «Estende a tua mão».
Ele estendeu-a, e a mão ficou curada. 6 Mas os fariseus,
retirando-se, reuniram-se logo em conselho com os herodianos contra Ele para
ver como O haviam de matar. 7 Jesus retirou-Se com Seus discípulos
para o mar, e segiu-O uma grande multidão do povo da Galileia; também da
Judeia, 8 de Jerusalém, da Idumeia, da Transjordânia e das
vizinhanças de Tiro e de Sidónia, tendo ouvido as coisas que fazia, foram em
grande multidão ter com Ele. 9 Mandou aos Seus discípulos que Lhe
aprontassem uma barca para que a multidão não O apertasse. 10
Porque, como curava muitos, todos os que padeciam algum mal lançavam-se sobre
Ele para O tocarem. 11 E os espíritos imundos, quando O viam, prostravam-se
diante d'Ele e gritavam: «Tu és o Filho de Deus». 12 Mas Ele
ordenava-lhes com severidade que não O manifestassem.
CARTA
ENCÍCLICA
ECCLESIA DE
EUCHARISTIA
DO
SUMO PONTÍFICE
JOÃO
PAULO II
AOS
BISPOS
AOS
PRESBÍTEROS E DIÁCONOS
ÀS
PESSOAS CONSAGRADAS
E
A TODOS OS FIÉIS LEIGOS
SOBRE
A EUCARISTIA
NA
SUA RELAÇÃO COM A IGREJA
INTRODUÇÃO
1.
A Igreja vive da Eucaristia. Esta verdade não exprime apenas uma experiência
diária de fé, mas contém em síntese o próprio núcleo do mistério da Igreja. É
com alegria que ela experimenta, de diversas maneiras, a realização incessante
desta promessa: «Eu estarei sempre convosco, até ao fim do mundo» (Mt 28,
20); mas, na sagrada Eucaristia, pela conversão do pão e do vinho no
corpo e no sangue do Senhor, goza desta presença com uma intensidade sem par.
Desde o Pentecostes, quando a Igreja, povo da nova aliança, iniciou a sua
peregrinação para a pátria celeste, este sacramento divino foi ritmando os seus
dias, enchendo-os de consoladora esperança.
O Concílio Vaticano II justamente afirmou
que o sacrifício eucarístico é «fonte e centro de toda a vida cristã». [i]
Com
efeito, «na santíssima Eucaristia, está contido todo o tesouro espiritual da
Igreja, isto é, o próprio Cristo, a nossa Páscoa e o pão vivo que dá aos homens
a vida mediante a sua carne vivificada e vivificadora pelo Espírito Santo». [ii]
Por
isso, o olhar da Igreja volta-se continuamente para o seu Senhor, presente no
sacramento do Altar, onde descobre a plena manifestação do seu imenso amor.
2.
Durante o Grande Jubileu do ano 2000, pude celebrar a Eucaristia no Cenáculo de
Jerusalém, onde, segundo a tradição, o próprio Cristo a realizou pela primeira
vez. O Cenáculo é o lugar da instituição deste santíssimo sacramento. Foi lá
que Jesus tomou nas suas mãos o pão, partiu-o e deu-o aos seus discípulos,
dizendo: «Tomai, todos, e comei: Isto é o meu Corpo que será entregue por vós» (cf.
Mt 26, 26; Lc 22, 19; 1 Cor 11, 24). Depois, tomou nas suas mãos o cálice
com vinho e disse-lhes: «Tomai, todos, e bebei: Este é o cálice do meu Sangue,
o Sangue da nova e eterna aliança, que será derramado por vós e por todos para
remissão dos pecados» (cf. Mc 14, 24; Lc 22, 20; 1 Cor 11, 25). Dou
graças ao Senhor Jesus por me ter permitido repetir no mesmo lugar, obedecendo
ao seu mandato: «Fazei isto em memória de Mim» (Lc 22, 19), as
palavras por Ele pronunciadas há dois mil anos.
Teriam
os Apóstolos, que tomaram parte na Última Ceia, entendido o significado das
palavras saídas dos lábios de Cristo? Talvez não. Aquelas palavras seriam
esclarecidas plenamente só no fim do Triduum
Sacrum, ou seja, aquele período de tempo que vai da tarde de Quinta-feira
Santa até à manhã do Domingo de Páscoa. Nestes dias, está contido o mysterium paschale; neles está incluído
também o mysterium eucharisticum.
3.
Do mistério pascal nasce a Igreja. Por isso mesmo a Eucaristia, que é o
sacramento por excelência do mistério pascal, está colocada no centro da vida
eclesial. Isto é visível desde as primeiras imagens da Igreja que nos dão os
Actos do Apóstolos: «Eram assíduos ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à
fracção do pão, e às orações» (2, 42). Na «fracção do pão», é
evocada a Eucaristia. Dois mil anos depois, continuamos a realizar aquela
imagem primordial da Igreja. E, ao fazê-lo na celebração eucarística, os olhos
da alma voltam-se para o Tríduo Pascal: para o que se realizou na noite de
Quinta-feira Santa, durante a Última Ceia, e nas horas sucessivas. De facto, a
instituição da Eucaristia antecipava, sacramentalmente, os acontecimentos que
teriam lugar pouco depois, a começar da agonia no Getsémani. Revemos Jesus que
sai do Cenáculo, desce com os discípulos, atravessa a torrente do Cedron e
chega ao Horto das Oliveiras. Existem ainda hoje naquele lugar algumas
oliveiras muito antigas; talvez tenham sido testemunhas do que aconteceu junto
delas naquela noite, quando Cristo, em oração, sentiu uma angústia mortal «e o
seu suor tornou-se-Lhe como grossas gotas de sangue, que caíam na terra» (Lc
22, 44). O sangue que, pouco antes, tinha entregue à Igreja como vinho de
salvação no sacramento eucarístico, começava a ser derramado; a sua efusão
completar-se-ia depois no Gólgota, tornando-se o instrumento da nossa redenção:
«Cristo, vindo como Sumo Sacerdote dos bens futuros (...) entrou uma só vez no
Santo dos Santos, não com o sangue dos carneiros ou dos bezerros, mas com o seu
próprio sangue, tendo obtido uma redenção eterna» (Heb 9, 11-12).
4.
A hora da nossa redenção. Embora profundamente turvado, Jesus não foge ao ver
chegar a sua «hora»: «E que direi Eu? Pai, salva-Me desta hora? Mas por causa
disto é que cheguei a esta hora!» (Jo 12, 27). Quer que os discípulos
Lhe façam companhia, mas deve experimentar a solidão e o abandono: «Nem sequer
pudestes vigiar uma hora Comigo. Vigiai e orai para não cairdes em tentação» (Mt
26, 40-41). Aos pés da cruz, estará apenas João ao lado de Maria e das
piedosas mulheres. A agonia no Getsémani foi o prelúdio da agonia na cruz de
Sexta-feira Santa. A hora santa, a hora da redenção do mundo. Quando se celebra
a Eucaristia na basílica do Santo Sepulcro, em Jerusalém, volta-se de modo
quase palpável à «hora» de Jesus, a hora da cruz e da glorificação. Até àquele
lugar e àquela hora se deixa transportar em espírito cada presbítero ao
celebrar a Santa Missa, juntamente com a comunidade cristã que nela participa.
«Foi
crucificado, morto e sepultado; desceu à mansão dos mortos; ressuscitou ao
terceiro dia». Estes artigos da profissão de fé ecoam nas seguintes palavras de
contemplação e proclamação: Ecce lignum
crucis in quo salus mundi pependit. Venite adoremus - «Eis o madeiro da
Cruz, no qual esteve suspenso o Salvador do mundo. Vinde adoremos!» É o convite
que a Igreja faz a todos na tarde de Sexta-feira Santa. E, quando voltar novamente
a cantar já no tempo pascal, será para proclamar: Surrexit Dominus de sepulcro qui pro nobis pependit in ligno. Alleluia
- «Ressuscitou do sepulcro o Senhor que por nós esteve suspenso no madeiro. Aleluia».
5.
Mysterium fidei! - «Mistério da fé».
Quando o sacerdote pronuncia ou canta estas palavras, os presentes aclamam:
«Anunciamos, Senhor, a vossa morte, proclamamos a vossa ressurreição. Vinde,
Senhor Jesus!».
Com
estas palavras ou outras semelhantes, a Igreja, ao mesmo tempo que apresenta
Cristo no mistério da sua Paixão, revela também o seu próprio mistério: Ecclesia de Eucharistia. Se é com o dom
do Espírito Santo, no Pentecostes, que a Igreja nasce e se encaminha pelas
estradas do mundo, um momento decisivo da sua formação foi certamente a instituição
da Eucaristia no Cenáculo. O seu fundamento e a sua fonte é todo o Triduum Paschale, mas este está de certo
modo guardado, antecipado e «concentrado» para sempre no dom eucarístico. Neste,
Jesus Cristo entregava à Igreja a actualização perene do mistério pascal. Com
ele, instituía uma misteriosa «contemporaneidade» entre aquele Triduum e o arco inteiro dos séculos.
Este
pensamento suscita em nós sentimentos de grande e reconhecido enlevo. Há, no
evento pascal e na Eucaristia que o actualiza ao longo dos séculos, uma
«capacidade» realmente imensa, na qual está contida a história inteira,
enquanto destinatária da graça da redenção. Este enlevo deve invadir sempre a
assembleia eclesial reunida para a celebração eucarística; mas, de maneira
especial, deve inundar o ministro da Eucaristia, o qual, pela faculdade
recebida na Ordenação sacerdotal, realiza a consagração; é ele, com o poder que
lhe vem de Cristo, do Cenáculo, que pronuncia: «Isto é o meu Corpo que será
entregue por vós»; «este é o cálice do meu Sangue, (...) que será derramado por
vós». O sacerdote pronuncia estas palavras ou, antes, coloca a sua boca e a sua
voz à disposição d'Aquele que as pronunciou no Cenáculo e quis que fossem
repetidas de geração em geração por todos aqueles que, na Igreja, participam
ministerialmente do seu sacerdócio.
6.
É este «enlevo» eucarístico que desejo despertar com esta carta encíclica, que
dá continuidade à herança jubilar que quis entregar à Igreja com a Carta Apostólica Novo millennio ineunte
e o seu coroamento mariano – a Carta
Apostólica Rosarium Virginis Mariæ. Contemplar o rosto de Cristo e
contemplá-lo com Maria é o «programa» que propus à Igreja na aurora do terceiro
milénio, convidando-a a fazer-se ao largo no mar da história lançando-se com
entusiasmo na nova evangelização. Contemplar Cristo implica saber reconhecê-Lo
onde quer que Ele Se manifeste, com as suas diversas presenças mas sobretudo no
sacramento vivo do seu corpo e do seu sangue. A Igreja vive de Jesus
eucarístico, por Ele é nutrida, por Ele é iluminada. A Eucaristia é mistério de
fé e, ao mesmo tempo, «mistério de luz». [iii] Sempre
que a Igreja a celebra, os fiéis podem de certo modo reviver a experiência dos
dois discípulos de Emaús: «Abriram-se-lhes os olhos e reconheceram-No» (Lc
24, 31).
7.
Desde quando iniciei o ministério de Sucessor de Pedro, sempre quis contemplar
a Quinta-feira Santa, dia da Eucaristia e do Sacerdócio, com um sinal de
particular atenção enviando uma carta a todos os sacerdotes do mundo. Neste
vigésimo quinto ano do meu Pontificado, desejo envolver mais plenamente a
Igreja inteira nesta reflexão eucarística para agradecer ao Senhor
especialmente pelo dom da Eucaristia e do sacerdócio: «Dom e mistério». [iv]
Se, ao proclamar o Ano do Rosário, quis pôr este meu vigésimo quinto ano sob o
signo da contemplação de Cristo na escola de Maria, não posso deixar passar
esta Quinta-feira Santa de 2003 sem me deter diante do «rosto eucarístico» de
Jesus, propondo à Igreja, com renovado ardor, a centralidade da Eucaristia.
Dela vive a Igreja; nutre-se deste «pão vivo». Por isso senti a necessidade de
exortar a todos a experimentá-lo sempre de novo.
8.
Quando penso na Eucaristia e olho para a minha vida de sacerdote, de Bispo, de
Sucessor de Pedro, espontaneamente ponho-me a recordar tantos momentos e
lugares onde tive a dita de celebrá-la. Recordo a igreja paroquial de Niegowić,
onde desempenhei o meu primeiro encargo pastoral, a colegiada de S. Floriano em
Cracóvia, a catedral do Wawel, a basílica de S. Pedro e tantas basílicas e
igrejas de Roma e do mundo inteiro. Pude celebrar a Santa Missa em capelas
situadas em caminhos de montanha, nas margens dos lagos, à beira do mar; celebrei-a
em altares construídos nos estádios, nas praças das cidades... Este cenário tão
variado das minhas celebrações eucarísticas faz-me experimentar intensamente o
seu carácter universal e, por assim dizer, cósmico. Sim, cósmico! Porque mesmo
quando tem lugar no pequeno altar duma igreja da aldeia, a Eucaristia é sempre
celebrada, de certo modo, sobre o altar do mundo. Une o céu e a terra. Abraça e
impregna toda a criação. O Filho de Deus fez-Se homem para, num supremo acto de
louvor, devolver toda a criação Àquele que a fez surgir do nada. Assim, Ele, o
sumo e eterno Sacerdote, entrando com o sangue da sua cruz no santuário eterno,
devolve ao Criador e Pai toda a criação redimida. Fá-lo através do ministério
sacerdotal da Igreja, para glória da Santíssima Trindade. Verdadeiramente este
é o mysterium fidei que se realiza na
Eucaristia: o mundo saído das mãos de Deus criador volta a Ele redimido por
Cristo.
9.
A Eucaristia, presença salvífica de Jesus na comunidade dos fiéis e seu
alimento espiritual, é o que de mais precioso pode ter a Igreja no seu caminho
ao longo da história. Assim se explica a cuidadosa atenção que ela sempre
reservou ao mistério eucarístico, uma atenção que sobressai com autoridade no
magistério dos Concílios e dos Sumos Pontífices. Como não admirar as exposições
doutrinais dos decretos sobre a Santíssima Eucaristia e sobre o Santo
Sacrifício da Missa promulgados pelo Concílio
de Trento? Aquelas páginas guiaram a teologia e a catequese nos séculos
sucessivos, permanecendo ainda como ponto de referência dogmático para a
incessante renovação e crescimento do povo de Deus na sua fé e amor à
Eucaristia. Em tempos mais recentes, há que mencionar três encíclicas: a Encíclica Miræ caritatis de Leão XIII (28
de Maio de 1902), [v]
a
Encíclica Mediator Dei de Pio XII (20
de Novembro de 1947) [vi]
e
a Encíclica Mysterium fidei de Paulo
VI (3 de Setembro de 1965). [vii]
O Concílio Vaticano II, embora não tenha
publicado qualquer documento específico sobre o mistério eucarístico, todavia
ilustra os seus vários aspectos no conjunto dos documentos, especialmente na Constituição Dogmática Igreja Lumen gentium
e na Constituição Liturgia Sacrosanctum
concilium.
Eu
mesmo, nos primeiros anos do meu ministério apostólico na Cátedra de Pedro,
tive oportunidade de tratar alguns aspectos do mistério eucarístico e da sua
incidência na vida daquele que é o seu ministro, com a Carta Apostólica Dominicæ Cenæ (24 de Fevereiro de 1980).
[viii]
Hoje retomo o fio daquele discurso com o coração transbordante de emoção e gratidão,
dando eco às palavras do Salmista: «Que darei eu ao Senhor por todos os seus
benefícios? Elevarei o cálice da salvação invocando o nome do Senhor» (Sal
116/115, 12-13).
10.
A este esforço de anúncio por parte do Magistério correspondeu um crescimento
interior da comunidade cristã. Não há dúvida que a reforma litúrgica do Concílio trouxe grandes vantagens para
uma participação mais consciente, activa e frutuosa dos fiéis no santo
sacrifício do altar. Mais ainda, em muitos lugares, é dedicado amplo espaço à
adoração do Santíssimo Sacramento, tornando-se fonte inesgotável de santidade.
A devota participação dos fiéis na procissão eucarística da solenidade do Corpo
e Sangue de Cristo é uma graça do Senhor que anualmente enche de alegria
quantos nela participam. E mais sinais positivos de fé e de amor eucarísticos
se poderiam mencionar.
A
par destas luzes, não faltam sombras, infelizmente. De facto, há lugares onde
se verifica um abandono quase completo do culto de adoração eucarística. Num
contexto eclesial ou outro, existem abusos que contribuem para obscurecer a
recta fé e a doutrina católica acerca deste admirável sacramento. Às vezes
transparece uma compreensão muito redutiva do mistério eucarístico. Despojado
do seu valor sacrificial, é vivido como se em nada ultrapassasse o sentido e o
valor de um encontro fraterno ao redor da mesa. Além disso, a necessidade do
sacerdócio ministerial, que assenta na sucessão apostólica, fica às vezes
obscurecida, e a sacramentalidade da Eucaristia é reduzida à simples eficácia
do anúncio. Aparecem depois, aqui e além, iniciativas ecuménicas que, embora
bem-intencionadas, levam a práticas na Eucaristia contrárias à disciplina que
serve à Igreja para exprimir a sua fé. Como não manifestar profunda mágoa por
tudo isto? A Eucaristia é um dom demasiado grande para suportar ambiguidades e
reduções.
Espero
que esta minha carta encíclica possa contribuir eficazmente para dissipar as sombras
de doutrinas e práticas não aceitáveis, a fim de que a Eucaristia continue a
resplandecer em todo o fulgor do seu mistério.
CAPÍTULO I
MISTÉRIO DA FÉ
11.
«O Senhor Jesus, na noite em que foi entregue» (1 Cor 11, 23),
instituiu o sacrifício eucarístico do seu corpo e sangue. As palavras do
apóstolo Paulo recordam-nos as circunstâncias dramáticas em que nasceu a
Eucaristia. Esta tem indelevelmente inscrito o evento da paixão e morte do
Senhor. Não é só a sua evocação, mas presença sacramental. É o sacrifício da
cruz que se perpetua através dos séculos. [ix] Esta
verdade está claramente expressa nas palavras com que o povo, no rito latino,
responde à proclamação «mistério da fé» feita pelo sacerdote: «Anunciamos,
Senhor, a vossa morte».
A
Igreja recebeu a Eucaristia de Cristo seu Senhor, não como um dom, embora
precioso, entre muitos outros, mas como o dom por excelência, porque dom d'Ele
mesmo, da sua Pessoa na humanidade sagrada, e também da sua obra de salvação.
Esta não fica circunscrita no passado, pois «tudo o que Cristo é, tudo o que
fez e sofreu por todos os homens, participa da eternidade divina, e assim
transcende todos os tempos e em todos se torna presente». [x]
Quando
a Igreja celebra a Eucaristia, memorial da morte e ressurreição do seu Senhor,
este acontecimento central de salvação torna-se realmente presente e
«realiza-se também a obra da nossa redenção». [xi] Este
sacrifício é tão decisivo para a salvação do género humano que Jesus Cristo realizou-o
e só voltou ao Pai depois de nos ter deixado o meio para dele participarmos
como se tivéssemos estado presentes. Assim cada fiel pode tomar parte nela,
alimentando-se dos seus frutos inexauríveis. Esta é a fé que as gerações
cristãs viveram ao longo dos séculos, e que o magistério da Igreja tem continuamente
reafirmado com jubilosa gratidão por dom tão inestimável. [xii]
É
esta verdade que desejo recordar mais uma vez, colocando-me convosco, meus
queridos irmãos e irmãs, em adoração diante deste Mistério: mistério grande, mistério
de misericórdia. Que mais poderia Jesus ter feito por nós? Verdadeiramente, na
Eucaristia demonstra-nos um amor levado até ao «extremo» (cf. Jo 13, 1),
um amor sem medida.
12.
Este aspecto de caridade universal do sacramento eucarístico está fundado nas
próprias palavras do Salvador. Ao instituí-lo, não Se limitou a dizer «isto é o
meu corpo», «isto é o meu sangue», mas acrescenta: «entregue por vós (...)
derramado por vós» (Lc 22, 19-20). Não se limitou a afirmar que o
que lhes dava a comer e a beber era o seu corpo e o seu sangue, mas exprimiu
também o seu valor sacrificial, tornando sacramentalmente presente o seu
sacrifício, que algumas horas depois realizaria na cruz pela salvação de todos.
«A Missa é, ao mesmo tempo e inseparavelmente, o memorial sacrificial em que se
perpetua o sacrifício da cruz e o banquete sagrado da comunhão do corpo e
sangue do Senhor». [xiii]
A
Igreja vive continuamente do sacrifício redentor, e tem acesso a ele não só
através duma lembrança cheia de fé, mas também com um contacto actual, porque
este sacrifício volta a estar presente, perpetuando-se, sacramentalmente, em
cada comunidade que o oferece pela mão do ministro consagrado. Deste modo, a
Eucaristia aplica aos homens de hoje a reconciliação obtida de uma vez para
sempre por Cristo para humanidade de todos os tempos. Com efeito, «o sacrifício
de Cristo e o sacrifício da Eucaristia são um único sacrifício».
[xiv] Já
o afirmava em palavras expressivas S. João Crisóstomo: «Nós oferecemos sempre o
mesmo Cordeiro, e não um hoje e amanhã outro, mas sempre o mesmo. Por este
motivo, o sacrifício é sempre um só. (...) Também agora estamos a oferecer a
mesma vítima que então foi oferecida e que jamais se exaurirá».
[xv]
A
Missa torna presente o sacrifício da cruz; não é mais um, nem o multiplica.
[xvi] O
que se repete é a celebração memorial, a «exposição memorial» (memorialis demonstratio),
[xvii] de
modo que o único e definitivo sacrifício redentor de Cristo se actualiza
incessantemente no tempo. Portanto, a natureza sacrificial do mistério eucarístico
não pode ser entendida como algo isolado, independente da cruz ou com uma
referência apenas indirecta ao sacrifício do Calvário.
Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
[ii] Conc. Ecum. Vat. II, Decr. sobre o
ministério e a vida dos sacerdotes Presbyterorum ordinis, 5.
[iii] Cf. João Paulo II, Carta ap. Rosarium
Virginis Mariæ (16 de Outubro de 2002), 21: AAS 95 (2003), 19.
[iv] Assim quis intitular um testemunho autobiográfico que
escrevi por ocasião das Bodas de Ouro do meu sacerdócio.
[v] Leonis XIII Acta, XXII (1903),
115-136.
[vi] AAS 39 (1947), 521-595.
[vii] AAS 57 (1965), 753-774.
[viii] AAS 72 (1980), 113-148.
[ix] Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Const. sobre
a sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, 47: « O nosso Salvador instituiu
[...] o sacrifício eucarístico do seu Corpo e do seu Sangue para perpetuar pelo
decorrer dos séculos, até Ele voltar, o sacrifício da cruz ».
[x] Catecismo da Igreja Católica, 1085.
[xi] Conc. Ecum. Vat. II, Const. dogm.
sobre a Igreja Lumen gentium, 3.
[xii] Cf. Paulo VI, Solene profissão de fé (30 de Junho de
1968), 24: AAS 60 (1968), 442; João Paulo II, Carta ap. Dominicæ Cenæ (24 de
Fevereiro de 1980), 12: AAS 72 (1980), 142.
[xiii] Catecismo da Igreja Católica, 1382.
[xiv] Ibid., 1367.
[xv] Homilias sobre a Carta aos Hebreus, 17, 3: PG 63, 131.
[xvi] «Trata-se realmente de uma única e
mesma vítima, que o próprio Jesus oferece pelo ministério dos sacerdotes, Ele
que um dia Se ofereceu a Si mesmo na cruz; somente o modo de oferecer-Se é que
é diverso»: Conc. Ecum. de Trento, Sess. XXII, Doctrina de ss. Missæ
sacrificio, cap. 2: DS 1743.
[xvii] Pio XII, Carta enc. Mediator Dei (20 de Novembro de
1947): AAS 39 (1947), 548.
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