O
oitavo discute-se assim. — Parece que o pecado do primeiro anjo não foi causa
de os outros pecarem.
1.
— Pois, a causa é anterior ao efeito. Ora, todos pecaram simultaneamente, como
diz Damasceno. Logo, o pecado de um não foi causa de os outros pecarem.
2.
Demais. — O primeiro pecado do anjo só pode ser a soberba, como antes se disse.
Ora, a soberba busca a excelência, e mais repugna a esta que alguém se submeta
a um inferior do que a um superior. E, assim, não parece que os demónios tivessem
pecado por terem querido antes submeterm-se a algum dos anjos superiores, do
que a Deus. O pecado de um anjo teria sido, sim, a causa de os outros pecarem
se esse tivesse induzido os outros a se lhe submeterem. Logo, resulta que o
pecado do primeiro anjo não foi a causa de os outros pecarem.
3.
Demais. — É maior pecado querer submeter-se a outrem, contra Deus, do que
querer, contra Deus, governar outrem, porque, neste último caso, é menor o
motivo de pecar. Se, pois, o pecado do primeiro anjo foi causa de os outros
pecarem por os ter induzido a se lhe submeterem, mais gravemente pecaram os
anjos inferiores que o superior; o que vai contra a Escritura: Este dragão que
formaste; ao que diz a Glossa: O que era mais excelente do que todos os outros,
pelo ser, tornou-se maior pela malícia. Logo, o pecado do primeiro anjo não foi
causa de os outros pecarem.
Mas,
em contrário, diz a Escritura que o dragão arrastou consigo a terceira parte
das estrelas.
O pecado do primeiro anjo foi causa de os outros pecarem, não os obrigando,
mas induzindo-os por uma quase exortação. E a prova disto resulta de todos os demónios
se submeterem ao demónio supremo, como se vê manifestamente do que diz o
Senhor, na Escritura: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, que foi
preparado para o diabo e para os seus anjos. Pois, a ordem da divina justiça
determina que quem consentiu na culpa, sugestionado por outrem, a este deve
submeter-se, na pena, segundo a Escritura: Aquele que é vencido, é escravo
daquele que o venceu.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Embora os demónios tivessem pecado
simultaneamente, contudo o pecado de um podia ser a causa de os outros pecarem.
Pois, o anjo não precisa de nenhum lapso de tempo para escolher, exortar ou
consentir, como o homem, que precisa deliberar para eleger e consentir, e
carece da locução vocal para exortar; coisas que se realizam todas no tempo.
Ora, como é claro, também no mesmo instante concebemos algo na mente e
começamos a falar; e no último instante da locução, quem compreendeu o
pensamento já pode assentir no que dissemos; e isso dá-se sobretudo com os primeiros
princípios, simultaneamente ouvidos e admitidos. Portanto, eliminado o tempo da
locução e da deliberação, necessário para nós, no mesmo instante em que o
primeiro anjo exprimiu o seu desejo por meio duma locução inteligível, foi
possível aos outros consentir nele.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — O soberbo, prefere em igualdade de situação, submeter-se antes ao
superior que ao inferior. Mas, se conseguir, sob o inferior, alguma excelência
maior que sob o superior, antes prefere obedecer àquele do que a este.
Portanto, não era contra a soberba dos demónios o terem querido obedecer ao
inferior, consentindo-lhe no principado e querendo tê-lo como príncipe e chefe,
para conseguirem, pela virtude natural, a beatitude última; sobretudo porque,
por então, estavam também sujeitos ao anjo supremo na ordem da natureza.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — Como já ficou dito antes, nada há no anjo que lhe retarde as
tendências; antes, é movido para o seu objecto, bom ou mau, em toda a sua
virtude. Assim, pois, tendo o anjo supremo virtude natural maior que os
inferiores, resvalou no pecado com mais intenso movimento. Por onde, também
veio a ser maior na malícia.
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