Art. 2 — Se nos
anjos há dileção eletiva.
(Ia
IIae, q. 10, a. 1; De Verit., q. 22, a. 2.)
O segundo discute-se assim. — Parece que nos anjos não
há dileção eletiva.
1. — Pois a dileção eletiva é o amor racional
resultando do conselho, que consiste numa inquisição, como diz Aristóteles 1. Ora, o amor racional se opõe ao
intelectual, próprio dos anjos, como diz Dionísio 2.
Logo, nos anjos não há dileção eletiva.
2. Demais. — Além do conhecimento infuso, só há nos
anjos o natural, pois eles não partem de princípios para chegar a conclusões. E
assim comportam-se para com tudo o que naturalmente podem conhecer como o nosso
intelecto para com os primeiros princípios naturalmente cognoscíveis, conforme
já se disse 3. Logo, nos anjos,
além da dileção gratuita só há a dileção natural, não havendo, portanto, a electiva.
Mas, em contrário — Pelo que nos é natural, nem
merecemos nem desmerecemos. Ora, os anjos, pela sua dileção, merecem ou desmerecem.
Logo, há neles dileção eletiva.
Há nos anjos uma dileção natural e outra
eletiva, sendo aquela o princípio desta, pois sempre o que tem prioridade de
existência exerce a função de princípio. Por onde, sendo a natureza o que é
primário em qualquer ser, é necessário que o atinente a ela seja nesse ser o
princípio. E isto bem se vê no homem, quanto ao intelecto e quanto à vontade.
Pois, o intelecto conhece os princípios naturalmente e desse conhecimento
resulta para a ciência das conclusões, não conhecidas naturalmente, mas por
invenção ou por doutrina. E semelhantemente, o fim é na vontade o que o princípio
é no intelecto, conforme diz Aristóteles 4.
Donde, a vontade tende naturalmente para o seu fim último, pois todo homem quer
naturalmente a felicidade. E dessa vontade natural resultam todas as demais
vontades, porque o homem quer, por causa de um fim, tudo o que quer. Portanto,
a dileção do bem, que o homem naturalmente quer como fim, é uma dileção
natural; porém, a dileção do bem, amado por causa do fim, é derivada da
primeira e é a dileção eletiva
Mas as coisas passam-se diferentemente em relação ao
intelecto e à vontade. Pois, como já ficou dito 5,
pelo conhecimento intelectual as coisas conhecidas estão no ser que conhece.
Sendo por imperfeição da natureza intelectual que o intelecto humano não
apreende imediata e naturalmente todos os inteligíveis, mas só alguns, pelos
quais, de certo modo, alcança os outros. — Ao passo que, inversamente, o acto
da virtude apetitiva parte do apetente para as coisas, das quais, umas são por
si boas e apetecíveis, e outras o são dependentemente de outra. Por isso, não é
imperfeição apetecer naturalmente uma coisa, como fim e outra, por eleição,
como ordenada ao fim. Ora, sendo a natureza intelectual dos anjos perfeita,
neles há só o conhecimento natural; não o racional; havendo porém a dileção
natural e a eletiva. — Tudo porém o que acaba de dizer-se é com exclusão do
sobrenatural, do qual não é a natureza o princípio suficiente, e disso se
tratará em seguida 6
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — Dividindo-se por
oposição o amor racional do intelectual, nem toda dileção eletiva é amor
racional. Pois, chama-se amor racional ao que resulta do conhecimento racional.
Ora, nem toda eleição resulta do discurso da razão, mas só a eleição humana,
como já se disse 7 quando se
tratou do livre arbítrio. Logo, a objeção não colhe.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Resulta a resposta do que ficou
dito.
S. tomás de aquino, Suma Teológica.
(Nota:
Revisão da tradução para português por ama)
__________________________________________
Notas:
1.
III Ethic. (lect. VI).
2.
De div. nom., cap. IV (lect. XII).
3.
q. 60, a. 1.
4.
II Physic. (lect. XV).
5.
Q. 59, a. 2.
6.
Q. 62.
7.
Q. 59, a. 3, ad 1.
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