Em seguida deve se considerar o acto da vontade, que é
o amor ou dileção, pois, todo ato da virtude apetitiva deriva do amor ou
dileção.
E, sobre este ponto, cinco artigos se discutem:
Art. 1 — Se nos anjos há amor ou dileção natural.
Art. 2 — Se nos anjos há dileção eletiva.
Art. 3 — Se o anjo se ama a si mesmo por dileção
natural e eletiva.
Art. 4 — Se um anjo, pela dileção natural, ama a outro
como a si mesmo.
Art. 5 — Se o anjo, pela dileção natural, mais ama a
Deus que a si mesmo.
Art. 1 — Se nos
anjos há amor ou dileção natural.
(III
Sent., dist. XXVII, q. 1, a. 2.)
O primeiro discute-se assim. – Parece que nos anjos não
há amor ou dileção natural.
1. — Pois, o amor natural se opõe ao intelectual, como
se vê em Dionísio1. Ora, o amor do anjo é intelectual. Logo, não é natural.
2. Demais. — Os seres que amam por amor natural mais
são conduzidos do que agem por si; pois nenhum tem o domínio da sua natureza.
Ora, os anjos não são conduzidos, mas agem por si, dotados que são de livre arbítrio,
como já se demonstrou 2. Logo,
neles não há amor ou dileção natural.
3. Demais. — Toda dileção ou é recta ou não;
respeitando aquela à caridade, esta, à iniquidade. Ora, a caridade não respeita
à natureza, por ser superior a esta; nem a iniquidade, por ser contrária à
mesma. Logo, não há nos anjos dileção natural.
Mas, em contrário, a dileção se segue ao conhecimento,
pois só se ama o que se conhece, como diz Agostinho 3. Ora, nos anjos há conhecimento natural.
Logo, também há a dileção natural.
É necessário admitir-se nos anjos a dileção
natural; o que se evidencia considerando-se que o anterior deve existir no posterior.
Ora, sendo a natureza, essência do ser, anterior ao intelecto, o que pertence à
natureza deve existir também nos seres inteligentes. Mas, é comum a toda
natureza uma certa inclinação, que é o apetite natural ou o amor; e essa
inclinação existe diversamente nas diversas naturezas; em cada uma ao modo
dessa. Donde, na natureza intelectual, a inclinação natural funda-se na
vontade; na sensitiva, no apetite sensitivo; enfim, na desprovida de
conhecimento, na só tendência da natureza. Por isso, o anjo, sendo de natureza
intelectual, necessário é tenha na sua vontade a dileção natural.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. — O amor
intelectual se opõe ao natural, que é somente natural; pois, como tal lhe não
acrescenta a natureza, além da essência da mesma, a perfeição do sentido ou do
intelecto.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Todos os seres da totalidade do
universo são conduzidos por outro; salvo o agente primeiro, o qual, identificando-se
nele a natureza e a vontade, age de modo que por nenhum outro é conduzido. Por
onde, não é inconveniente que o anjo seja conduzido, pois a sua inclinação
natural lhe foi infundida pelo autor da sua natureza. Contudo, ele não é
conduzido de modo tal que não tenha atividade própria, dotado que é de vontade
livre.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Assim como o conhecimento
natural sempre é verdadeiro, a dileção natural sempre é recta, pois, o amor natural
nada mais é do que a inclinação da natureza, nela infundida pelo seu autor.
Dizer, portanto, que não seja recta a inclinação da natureza é ir contra o
autor desta. Contudo, uma é a retidão da dileção natural, outra a da caridade e
da virtude; pois, esta é perfectiva daquela. Do mesmo modo que uma é a verdade
do conhecimento natural, e outra, a do conhecimento infuso ou adquirido.
S. tomás de aquino, Suma Teológica.
(Nota:
Revisão da tradução para português por ama)
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Notas:
1.
De div. nom., cap. IV (lect. XII).
2.
Q. 59, a. 3.
3.
De Trin., lib. X (cap. I).
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