Navegando pela minha cidade
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A Rua do Padre Luís Cabral é uma das ruas mais compridas e mais típicas da Foz velha. É uma rua de que me orgulho especialmente porque o Padre Luís Gonzaga Cabral foi meu tio-bisavô.” Foi padre da Companhia de Jesus, tendo feito com grande brilho o seu doutoramento em Filosofia, pelo Colégio Máximo de Uclés (em Espanha) e a formatura em Teologia pelo de Vals, no Puy (França) ”[2]. Em 1910 foi forçado a exilar-se no Brasil no seguimento da implantação da República e da expulsão das ordens religiosas. Dedicou toda a sua vida ao ensino tendo sido “Reitor dos Colégios de Campolide, de Nun’Álvares (em Alsemberg) e de António Vieira (na Baía), bem como reformador do primeiro e fundador dos outros dois. Educador insigne e escritor notável, tem sido considerado como o maior orador sagrado da língua portuguesa do seu tempo. Morreu na Baía (Brasil) a 28 de Janeiro de 1939”[3]. E era este padre com este curriculum que era professor de português a alunos do correspondente ao sexto ano actual, no Colégio António Vieira na Baía. O Colégio não exigia menos do que isto. E foi a ensinar que este padre cumpriu a sua vocação até ao fim. Como um semeador de florestas, sabendo que nunca iria ver as suas árvores a terem ninhos de pássaros. Viveu da esperança como padre e como educador. Mas, e o menino grapiúna onde é que entra aqui? Ele vai dizer: No colégio dos jesuítas, pela mão do padre Cabral, encontrei nas “Viagens de Gulliver” os caminhos da libertação, os livros abriram-me as portas cadeia … em lugar de nos fazer analisar “Os Lusíadas”, tentando descobrir o sujeito oculto e dividir as orações, reduzindo o poema a complicado texto para as questões gramaticais, fazendo-nos odiar Camões, o padre Cabral, para seu deleite e nosso encantamento, declamava para os alunos episódios da epopeia…. As aulas de português adquiriram outra dimensão. O primeiro dever passado pelo novo professor de português foi uma descrição tendo o mar como tema. A classe se inspirou toda ela, nos encapelados mares de Camões, aqueles nunca dantes navegados, o episódio do Adamastor foi reescrito pela meninada. Prisioneiro no internato, eu vivia nas saudades das praias do Pontal onde conhecera a liberdade e o sonho. O mar de Ilhéus foi o tema da minha descrição.
Padre Cabral levara os deveres para corrigir em sua cela. Na aula seguinte, entre risonho e solene, anunciou a existência de uma vocação autêntica de escritor naquela sala de aula. Pediu que escutassem com atenção o dever que ia ler. Tinha a certeza, afirmou, que o autor daquela página seria no futuro um escritor conhecido. Não regateou elogios. Eu acabara de completar onze anos”[4]. Pois é, quem escreveu isto foi Jorge Amado.
Quantas vocações de escritores, de poetas, de filósofos e de padres o nosso sistema de ensino e o desinteresse e alheamento dos pais não matará à nascença?
É extraordinário o provincianismo ignorante e basbaque dos deslumbrados pela ciência e pela técnica que não vêem que uma sociedade sem humanidades transformar-se-á numa sociedade desumanizada.
Afonso Cabral
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