1.ª Tessalonicenses 2
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Comportamento dos missionários –
Acolhimento da Palavra –
13
Por isso, damos continuamente graças a Deus, porque, tendo recebido a palavra
de Deus, que nós vos anunciámos, vós a acolhestes não como palavra de homens,
mas como ela é verdadeiramente, palavra de Deus, a qual também actua em vós que
acreditais. 14 De facto, irmãos, vós tornastes-vos imitadores das igrejas de Deus,
que estão na Judeia, em Cristo Jesus, pois também sofrestes, da parte dos
vossos compatriotas, o mesmo que elas sofreram da parte dos Judeus; 15 eles mataram o Senhor Jesus e os profetas e
agora perseguem-nos: não agradam a Deus e são mal vistos por todos os homens;
16 impedem-nos de pregar aos gentios para que se salvem e, assim, enchem cada
vez mais a medida dos seus pecados. Mas, finalmente, a ira de Deus caiu sobre
eles.
Missão de Timóteo –
17
Mas nós, irmãos, órfãos de vós por breve tempo, longe da vista mas perto de
coração, redobrámos esforços para rever o vosso rosto, porque tínhamos um
ardente desejo. 18 Por isso, tínhamos decidido ir ter convosco - eu, Paulo,
mais que uma vez - mas Satanás no-lo impediu. 19 De facto, quem é a nossa
esperança, a nossa alegria e a nossa coroa de glória diante de Nosso Senhor
Jesus Cristo, aquando da sua vinda, senão vós? 20 Sim, vós é que sois a nossa
glória e a nossa alegria!
Cristo
que passa
4
A Epístola da Missa
lembra-nos que temos que assumir esta responsabilidade de apóstolos com um
espírito novo, cheios de animo, despertos. Já é hora de despertarmos do sono,
pois estamos mais perto da nossa salvação do que quando recebemos a fé. A noite
avança e o dia aproxima-se. Deixemos, pois, as obras das trevas, e
revistamo-nos das armas da luz.
Dir-me-eis que não é fácil,
e não vos faltará razão. Os inimigos do homem, que são os inimigos da sua
santidade, tentam impedir essa vida nova, esse revestir-nos do espírito de
Cristo. Não encontro melhor enumeração dos obstáculos à fidelidade cristã do
que a que estabelece São João: concupiscentia carnis, concupiscentia
oculorum et superbia vitae; tudo o que há no mundo é concupiscência da
carne, concupiscência dos olhos e soberba da vida.
5
A concupiscência da carne
não é apenas o impulso desordenado dos sentidos em geral, nem o apetite sexual,
que deve ser ordenado e em si não é mau, porque é uma nobre realidade humana
santificável. Por isso, nunca falo de impureza, mas de pureza, já que a todos
se dirigem as palavras de Cristo: «Bem-aventurados os limpos de coração,
porque verão a Deus». Por vocação divina, uns terão que viver essa pureza
no matrimónio; outros, renunciando aos amores humanos, para corresponderem
única e apaixonadamente ao amor de Deus. Mas nem uns nem outros escravos da
sensualidade, porém senhores do seu corpo e do seu coração, para poderem dá-los
sacrificadamente aos outros.
Ao tratar da virtude da
pureza, costumo acrescentar o qualificativo de santa. A pureza cristã, a santa
pureza, não é o orgulho de nos sentirmos puros, não contaminados. É saber que
temos os pés de barro, ainda que a graça de Deus nos livre dia a dia das
ciladas do inimigo. Considero uma deformação do cristianismo a insistência com
que certas pessoas escrevem ou pregam quase exclusivamente sobre esta matéria,
esquecendo outras virtudes que são capitais para o cristão e, em geral, para a
convivência entre os homens.
A santa pureza não é a única
nem a principal virtude cristã: é, entretanto, indispensável para perseverarmos
no esforço diário da nossa santificação; e sem ela não é possível qualquer
dedicação ao apostolado. A pureza é consequência do amor com que entregamos ao
Senhor a alma e o corpo, as potências e os sentidos. Não é negação, é afirmação
jubilosa.
Dizia que a concupiscência
da carne não se reduz exclusivamente à desordem da sensualidade: estende-se ao
comodismo e à falta de vibração, que impelem a procurar o mais fácil, o mais
agradável, o caminho aparentemente mais curto, mesmo à custa de concessões no
caminho da fidelidade a Deus.
Comportar-se assim
equivaleria a abandonar-se incondicionalmente ao império de uma dessas leis, a
do pecado, contra a qual nos previne São Paulo: “Encontro, pois, esta lei em
mim: quando quero fazer o bem, o mal está junto de mim. Porque me deleito na
lei de Deus segundo o homem interior, mas vejo nos meus membros outra lei que
se opõe à lei do meu espírito e me subjuga à lei do pecado... Infelix ego
homo!, infeliz de mim! Quem me livrará deste corpo de morte?” Ouçamos o que
responde o próprio Apóstolo: “a graça de Deus, por Jesus Cristo Nosso Senhor”.
Podemos e devemos lutar contra a concupiscência da carne, porque, se formos
humildes, ser-nos-á concedida sempre a graça do Senhor.
6
O outro inimigo, escreve São
João, é a concupiscência dos olhos, uma avareza de fundo que leva a apreciar
apenas o que se pode tocar: os olhos que ficam como que colados ás coisas
terrenas, mas também os olhos que, por isso mesmo, não sabem descobrir as
realidades sobrenaturais. Portanto, podemos entender a expressão da Sagrada
Escritura como uma referência à avareza dos bens materiais e, além disso, a
essa deformação que nos leva a observar o que nos rodeia - os outros, as
circunstâncias da nossa vida e do nosso tempo - com visão exclusivamente
humana.
Os olhos da alma embotam-se;
a razão julga-se auto-suficiente e capaz de entender todas as coisas
prescindindo de Deus. É uma tentação subtil, que se escuda na dignidade da
inteligência; da inteligência que nosso Pai-Deus outorgou ao homem para que O
conheça e O ame livremente. Arrastada por essa tentação, a inteligência humana
considera-se o centro do universo, entusiasma-se novamente com o sereis como
deuses e, enchendo-se de amor por si mesma, vira as costas ao amor de Deus.
Deste modo, a nossa
existência pode entregar-se sem condições às mãos do terceiro inimigo, a superbia
vitae. Não se trata simplesmente de pensamentos efêmeros de vaidade ou de
amor próprio: é um endurecimento generalizado. Não nos enganemos, porque
tocamos o pior dos males, a raiz de todos os extravios. A luta contra a soberba
deve ser constante, porque, como já se disse graficamente, essa paixão morre um
dia depois de a pessoa morrer. É a altivez do fariseu, a quem Deus reluta em
justificar por encontrar nele uma barreira de auto-suficiência. É a arrogância
que leva a desprezar os demais homens, a dominá-los, a maltratá-los: porque
onde houver soberba, aí haverá também ofensa e desonra.
7
Vai chegar o tempo do
Advento e é bom que tenhamos considerado as insídias destes inimigos da alma: a
desordem da sensualidade e da fácil leviandade; o desatino da razão que se opõe
ao Senhor; a presunção altaneira, que esteriliza o amor a Deus e às criaturas.
Todos estes estados de ânimo são obstáculos certos, e seu poder perturbador é
grande. Por isso a liturgia nos faz implorar a misericórdia divina: A Ti,
Senhor, elevo minha alma; em Ti espero; não seja eu confundido, nem se riam de
mim os meus adversários, rezamos no Intróito. E na antífona do Ofertório
repetiremos: Espero em Ti, não seja eu confundido!
Agora que se aproxima o
tempo da salvação, é consolador ouvir dos lábios de São Paulo: “Depois que
Deus Nosso Salvador manifestou sua benignidade e amor aos homens, livrou-nos
não pelas obras de justiça que tivéssemos feito, mas por sua misericórdia”.
Se percorrermos as Santas
Escrituras, descobriremos constantemente a presença da misericórdia de Deus:
enche a terra, estende-se a todos os seus filhos, super omnem carnem;
rodeia-nos, antecede-nos, multiplica-se para nos ajudar, e foi continuamente
confirmada. Ao ocupar-se de nós como Pai amoroso, Deus tem-nos presentes na Sua
misericórdia: uma misericórdia suave, agradável como a nuvem que se desfaz em
tempo de seca.
Jesus Cristo resume e
compendia toda a história da misericórdia divina: «Bem-aventurados os
misericordiosos, porque alcançarão misericórdia.» E em outra ocasião: «Sede
misericordiosos, como vosso Pai celestial é misericordioso». Ficaram também
muito gravadas em nós, entre tantas outras cenas do Evangelho, a clemência com
a mulher adúltera, as parábolas do filho pródigo, da ovelha perdida e do
devedor perdoado, a ressurreição do filho da viúva de Naim. Quantas razões de
justiça para explicar este grande prodígio! Morreu o filho único daquela pobre
viúva, aquele que dava sentido à sua vida e podia ajudá-la na sua velhice. Mas
Cristo não faz o milagre por justiça; Ele o faz por compaixão, porque Se comove
interiormente perante a dor humana.
Que segurança nos deve
produzir a comiseração do Senhor! «Clamará por mim e eu o ouvirei, porque
sou misericordioso». É um convite, uma promessa que não deixará de cumprir.
Aproximemo-nos, pois, confiadamente do trono da graça, a fim de alcançarmos
misericórdia e auxílio da graça no tempo oportuno. Os inimigos da nossa santificação
nada conseguirão, porque essa misericórdia de Deus nos protege por antecipação;
e se por nossa culpa e fraqueza caímos, o Senhor socorre-nos e levanta-nos.
Tinhas aprendido a evitar a negligência, a afastar de ti a arrogância, a
adquirir piedade, a não ser prisioneiro das questões mundanas, a não preferir o
caduco ao eterno. Mas, como a debilidade humana não pode manter um passo
decidido num mundo resvaladiço, o bom Médico indicou-te também remédios contra
a desorientação, e o Juiz misericordioso não te negou a esperança do perdão.
8
A existência do cristão
desenvolve-se neste clima da misericórdia divina. Esse é o âmbito do esforço
com que procura comportar-se como filho do Pai. E quais os principais meios
para conseguirmos que a vocação se fortaleça? Hoje indicar-te-ei dois, que são
quais eixos vivos da conduta cristã: a vida interior e a formação doutrinal, o
conhecimento profundo da nossa fé.
Vida interior, em primeiro
lugar. Como são poucos ainda os que a entendem! Ao ouvirem,falar de vida
interior, pensam na escuridão do templo, quando não no ambiente rarefeito de
certas sacristias. Há mais de um quarto de século venho dizendo que não é isso.
O que descrevo é a vida interior de um simples cristão, que habitualmente se
encontra em plena rua, ao ar livre; e que na rua, no trabalho, na família e nos
momentos de lazer permanece atento a Jesus o dia todo. E o que é isso senão
vida de oração contínua? Não é verdade que compreendeste a necessidade de ser
alma de oração, com uma relação de amizade com Deus que te leve a endeusar-te?
Essa é a fé cristã e assim o compreenderam sempre as almas de oração. Escreve
Clemente de Alexandria: “Torna-se Deus o homem que quer o mesmo que Deus quer”.
A princípio custa; é preciso
esforçar-se por dirigir o olhar para o Senhor, por agradecer a Sua piedade
paternal e concreta para connosco. Pouco a pouco, o amor de Deus - embora não
seja coisa de sentimentos - torna-se tão palpável como uma flechada na alma. É
Cristo que nos persegue amorosamente: Eis que estou à tua porta e chamo. Como
vai a tua vida de oração? Não sentes às vezes, durante o dia, desejos de
conversar mais com Ele? Não Lhe dizes: mais tarde contar-te-ei isto, mais tarde
conversarei contigo sobre isto?
Nos momentos expressamente
dedicados a esse colóquio com o Senhor, o coração se expande, a vontade se
fortalece, a inteligência - ajudada pela graça - embebe em realidades
sobrenaturais as realidades humanas. E, como fruto, surgem sempre propósitos
claros, práticos, de melhorar a conduta, de tratar delicadamente, com caridade,
todos os homens, de nos empenharmos a fundo - com o empenho dos bons
esportistas - nesta luta cristã de amor e de paz.
A oração torna-se contínua,
como o palpitar do coração, como o pulso. Sem essa presença de Deus, não há
vida contemplativa; e, sem vida contemplativa, de pouco vale trabalhar por
Cristo, porque, se Deus não edifica a casa, em vão trabalham os que a
constroem.
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