18/10/2018

Leitura espiritual

Resultado de imagem para são francisco de assis
LEGENDA MAIOR

(Vida de São Francisco de Assis)

CAPÍTULO 3

Fundação da Ordem e aprovação da Regra


4. Pouco tempo depois, o mesmo Espírito chamou outros cinco homens e o número dos irmãos subiu a seis.
O terceiro foi o nosso santo pai Egídio, homem realmente cheio de Deus e digno de ser solenemente recordado.
Pois, tendo chegado às mais sublimes virtudes, ao fim da sua vida, como Francisco havia predito, e embora iletrado e simples, alcançou os mais altos cumes da contemplação.
Pois, efectivamente, ocupado continuamente e por espaço de muito tempo na contemplação das coisas celestiais, de tal modo era arrebatado até Deus em êxtase, como eu mesmo fui testemunha ocular, que parecia levar entre os homens uma vida mais angélica do que humana.

5. Manifestou Deus igualmente por esse tempo a um certo sacerdote da cidade de Assis, chamado Silvestre, homem de costumes ilibados, uma visão que não podemos deixar de referir.
Julgando as coisas de modo meramente humano, admirava-se Silvestre muito do modo de vida que haviam adoptado Francisco e os seus seguidores, e para não permanecer nos seus falsos juízos, visitou-o a graça do Senhor.
Viu então em sonhos medonho dragão rondando a cidade de Assis.
A sua extrema corpulência parecia ameaçar com um completo extermínio toda aquela comarca.
Viu depois sair da boca de Francisco uma cruz preciosíssima de ouro, cuja parte superior chegava até ao céu, e os braços pareciam estender-se até os confins da terra.
À vista dessa cruz esplendorosa, fugiu aquele horrendo e espantoso dragão.
Repetindo-se este sonho pela terceira vez, julgou ser um oráculo divino, e referiu a visão com todos os detalhes ao servo de Deus Francisco e aos seus companheiros. E abandonando pouco depois o mundo seguiu com tanta perfeição as pegadas traçadas por Cristo, que a sua vida na Ordem confirmou o carácter celestial da visão que tivera no mundo.

6. Quando Francisco ouviu esta visão, não se deixou seduzir pelos astutos enganos da vanglória; mas reconhecendo a bondade de Deus nos seus benefícios, animou-se a pelejar com maior coragem contra a perversidade e malícia do inimigo infernal e a pregar por toda parte as glórias da cruz.

Estando um dia na solidão, viu desfilar diante dos seus olhos os anos passados e chorava-os amargamente.
A alegria do Espírito Santo, porém, derramou-se sobre ele e garantiu-lhe que os seus pecados estavam plenamente perdoados.
Foi então arrebatado em êxtase e absorvido completamente numa luz maravilhosa, de modo que se iluminaram as profundezas da sua alma e viu o que o futuro lhes reservava para ele e os seus filhos.
A seguir voltou aos irmãos, outra vez, e disse-lhes:
“Tende coragem, amados filhos, alegrai-vos no Senhor; não vos entristeçais por serdes um pequeno número nem por causa de minha simplicidade ou da vossa, pois o Senhor fez-me ver com toda clareza que Deus fará de nós uma imensa multidão e, pela graça de sua bênção, nos multiplicará sempre mais”.


7. Nesse mesmo período, entrou na religião um outro varão santo, chegando então o número dos filhos benditos do homem de Deus a sete.
O bom Pai reuniu em torno de si todos os seus filhos e falou-lhes longamente do reino de Deus, do desprezo do mundo, da necessidade de renunciar à própria vontade e mortificar o próprio corpo e revelou-lhes sua intenção de enviá-los às quatro partes do mundo.
Aquela simplicidade que parecia estéril no seráfico Pai havia gerado sete filhos; mas o seu amor ardente desejava gerar a todos os homens para os rigores da penitência.

“Ide, dizia o bem-aventurado Pai a seus filhos, anunciar a paz a todos os homens; pregai-lhes a penitência para a remissão dos pecados; sede pacientes na tribulação, solícitos na oração, sofridos na adversidade, activos e constantes no trabalho; modestos nas palavras, sérios nos vossos costumes e agradecidos ao receber benefícios. Sabei que, em recompensa de tudo isso, vos está prometido um reino que não terá fim”.

Prostrados humildemente em terra os filhos em presença de tão bom Pai, receberam com alegria de espírito o mandamento da santa obediência. E disse a cada um em particular:
“Lança no Senhor os teus cuidados e ele cuidará de ti” (Sl 54,23).
Era a sua frase costumeira ao enviar um irmão às missões.
” Ele, porém, consciente de sua vocação de modelo e querendo agir antes de falar, tomou um dos seus companheiros e dirigiu-se a um dos quatro pontos cardeais, deixando para os outros irmãos os três outros pontos cardeais, como se quisesse traçar um imenso sinal-da-cruz.
Quando mais tarde quis rever os filhos bem-amados e não sabendo como fazer chegar até eles a sua voz, pediu ao Senhor que os reunisse, ele “que reúne os filhos disperses de Israel” (Sl 146,2).
E sucedeu que, sem terem sido convocados por quem quer que fosse, mas por um favor da bondade de Deus, todos, para grande admiração comum, se encontraram como Francisco havia desejado.
Outros quatro homens de bem vieram associar-se a eles, elevando-se agora o número dos irmãos a doze.

8. Vendo que o número dos irmãos aumentava gradativamente, Francisco escreveu uma regra de vida breve e simples para si e seus companheiros.
O seu fundamento inabalável era a observância dos Evangelhos, ao que ele acrescentou um número reduzido de outras prescrições, que lhe pareciam necessárias para a vida em comum.
Estava ansioso em ver aprovado pelo papa o que escrevera.
Pondo toda s sua confiança no Senhor, resolveu apresentar-se com os seus companheiros diante da Sé Apostólica.
Deus olhou propício para o seu desejo e confortou os irmãos que estavam apavorados de se verem tão simples e inexperientes, mostrando a Francisco a seguinte visão:
Parecia-lhe estar percorrendo um caminho, à beira do qual se erguia uma árvore que ele dobrou com facilidade até ao chão.
Homem cheio de Deus que era, compreendeu imediatamente que a visão era uma profecia do modo como o papa haveria de aprovar os seus planos e ficou extremamente alegre.
Falou aos irmãos e encorajou-os.
Em seguida pôs-se a caminho com eles.

9. Chegado à Cúria Romana, conduziram-no à presença do Sumo Pontífice.
O Vigário de Cristo, que se encontrava no palácio lateranense e caminhava no lugar chamado Speculum, imerso em profundos pensamentos, mandou embora com desprezo, como um importuno, o servo de Cristo.
Este humildemente retirou-se.
Na noite seguinte, porém, o Pontífice teve uma revelação de Deus.
A seus pés via uma palmeira que ia crescendo pouco a pouco até se tornar uma belíssima árvore.
Enquanto o Vigário de Cristo se perguntava, maravilhado, que poderia significar aquela visão, a luz divina gravou-lhe na mente que a palmeira representava aquele pobre que ele havia repelido na véspera.
Na manhã seguinte, o papa mandou os seus servos procurar aquele pobre em toda a cidade.
Encontraram-no na hospedaria de S. António junto ao Latrão. E fizeram-no comparecer à sua presença.
Introduzido Francisco à presença do Sumo Pontífice, manifestou-lhe os seus propósitos, pedindo-lhe com humildade e constância que se dignasse aprovar a referida Regra e forma de vida.
Ao ver o Vigário de Cristo, Inocêncio III, homem de grande sabedoria, a admirável pureza de alma do servo de Deus, a firmeza dos seus propósitos e o ardente amor que votava aos seus ideais, inclinou-se benignamente a ouvir as petições do santo.
Mas não quis aprovar logo a regra de vida proposta pelo pobrezinho, porque parecia estranha e por demais penosa às forças humanas no parecer de alguns cardeais.
Mas entre estes encontrava-se um homem venerável, o cardeal João de São Paulo, bispo de Sabina, amante das pessoas de virtude e santidade e decidido protector dos pobres de Cristo.
Tomou a palavra e inflamado do Espírito de Deus, disse ao Sumo Pontífice e a seus irmãos cardeais:
“Este pobre pede apenas que lhe seja aprovada uma forma de vida evangélica. Se portanto rejeitarmos o seu pedido como difícil em demasia e estranho, tenhamos cuidado em não ofender dessa forma o Evangelho.
De facto se alguém dissesse que na observância da perfeição evangélica e no voto de praticá-la existe algo de estranho ou de irracional, ou impossível, é réu de blasfémia contra Cristo,autor do Evangelho”.
Diante dessas razões, o sucessor de Pedro voltou-se para o pobre de Cristo e lhe disse:
“Meu filho, faz uma oração fervorosa a Cristo para que por teu intermédio nos mostre a sua vontade.
Assim que a tivermos conhecido com maior clareza, poderemos aceder com mais segurança aos teus pedidos”.

São Boaventura

(cont)

(revisão da versão portuguesa por AMA)

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.