Art.
3 — Se o corpo de Cristo ressuscitou glorioso.
O terceiro discute-se assim. — Parece
que o corpo de Cristo não ressuscitou glorioso.
1. — Pois, os corpos gloriosos são
refulgentes, segundo o Evangelho: Resplandecerão
os justos, como o sol, no reino de seu Pai. Ora o que torna os corpos
resplandecentes é a luz e não a cor. Mas, tendo o corpo de Cristo sido visto
sob a espécie de cor, como antes era visto, parece que não foi glorioso.
2. Demais. — O corpo glorioso é
incorruptível. Ora, parece que o corpo de Cristo não foi incorruptível. Pois,
podia ser apalpado, como ele próprio o disse: Apalpai e vede. E Gregório diz que necessariamente o que pode corromper-se pode ser apalpado, e apalpado
não pode ser o que não se corrompe. Logo, o corpo de Cristo não foi glorioso.
3. Demais. — O corpo glorioso não é animal, mas espiritual, como está claro no
Apóstolo. Ora, parece que o corpo de Cristo, depois da ressurreição, era
animal, pois comeu e bebeu com os discípulos, como se lê no Evangelho. Logo,
parece que o corpo de Cristo não era glorioso.
Mas, em contrário, o Apóstolo: Reformará o nosso corpo abatido, para o
fazer conforme ao seu corpo glorioso.
O corpo de Cristo ressuscitou
glorioso e três razões o demonstram. - Primeiro, porque a ressurreição de Cristo foi o exemplar e a causa da nossa,
como se lê no Apóstolo. Ora, os santos, ressuscitados, terão corpos gloriosos,
como diz ainda o Apóstolo: Semeia-se em
vileza, ressuscitará em glória. Ora, sem a causa mais digna que o causado,
e o exemplar, que o exemplado, com muito maior razão o corpo de Cristo ressuscitou
glorioso. — Segundo, porque pelas humilhações da Paixão mereceu a
glória da ressurreição. Por isso ele próprio o dizia: Agora presentemente está turbada a minha alma, o que concernia à
Paixão. E no que acrescenta - Pai,
glorifica o teu nome, pede a glória da ressurreição. — Terceiro,
porque, como dissemos a alma de Cristo, desde o princípio da sua concepção, era
gloriosa pela fruição perfeita da divindade. E só por excepção se deu, como
dissemos, que a glória da alma não redundasse para o corpo, a fim de
cumprir-se, pela sua Paixão, o mistério da nossa redenção. Donde, consumado o
mistério da Paixão e da morte de Cristo, imediatamente a alma derivou a sua
glória para o corpo reassumido na ressurreição; e assim o seu corpo se tornou
glorioso.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. —
Tudo o que é recebido por outro ser é recebido ao modo do recipiente. Ora, derivando a glória do corpo, da alma,
como diz Agostinho, a refulgência ou a
claridade do corpo glorificado se funda na cor natural ao corpo humano;
assim como o vidro diversamente colorido se torna resplendente pela iluminação
do sol, em dependência da sua cor. Ora, assim como está no poder do homem
glorificado tornar o seu corpo sensível ou não, conforme dissemos, assim no seu
poder está o ser ou não vista a sua resplandecência. Por isso pode ser visto na
sua cor, sem ter nenhuma claridade. E foi desse modo que Cristo apareceu aos
discípulos depois da ressurreição.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Um corpo é
susceptível de ser tocado não só em razão da sua resistência como também em
razão da sua espessura. Ora, da rarefação e da espessura resultam o peso e a
levidão, a calidez e a frieza e outras qualidades contrárias, que são os
princípios da corrupção dos corpos elementares. Por onde, o corpo susceptível
de ser apalpado pelo tacto humano é naturalmente corruptível. E não podemos
considerar como capaz de ser tocado um corpo, como o celeste, resistente ao tacto,
mas cuja disposição não implica as referidas qualidades, que os objectos
próprios do tacto humano. Ora, o corpo de Cristo, depois da ressurreição foi
realmente composto de elementos, tendo em si qualidades tangíveis como o requer
a natureza do corpo humano. Por isso era naturalmente susceptível de ser
tocado; e se nada mais tivesse, além da natureza do corpo humano, também teria
sido corruptível. Mas tinha um atributo que o tornava incorruptível; e esse não
era, certamente, a natureza de corpo celeste, como alguns dizem, de cuja
opinião mais adiante trataremos; mas, a glória redundante da alma
bem-aventurada. Pois, como diz Agostinho, Deus
dotou a alma de uma tão poderosa natureza, que redundasse, da sua pleníssima
beatitude, para o corpo, a plenitude da saúde, isto é, o vigor da incorrupção.
Donde, como diz Gregório se demonstra
que o corpo de Cristo, depois da
ressurreição, não mudou de natureza, mas teve uma glória diferente.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como diz
Agostinho, o nosso Salvador, depois da
ressurreição, revestido de uma carne espiritual, mas verdadeira, tomou comida e
bebida com os discípulos; não que precisasse de alimentos, mas para manifestar
que tinha o poder de fazê-lo. Pois, como diz Beda, de um modo a terra seca
absorve a água e de outro, o raio candente do sol; aquela por indigência, este
pela intensidade. Assim, Cristo comeu, depois da ressurreição, não que
precisasse de alimento, mas para, desse modo, manifestar a natureza do corpo
ressuscitado. Mas daqui não se segue que tivesse um corpo de natureza animal,
necessitado de alimentar-se.
Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.
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