Natividade
A
VOZ DOS SANTOS
«Muitíssimo dano,
amadíssimos, nos causaram um homem e uma mulher; mas graças a Deus, igualmente
por um homem e uma mulher tudo foi restaurado. E com grandíssimo aumento de
graças. Porque o dom não foi como tinha sido o delito, mas a grandeza do
benefício excede o dano».
«Assim, o prudentíssimo e
clementíssimo Artífice não quebrou o que estava rachado, antes o refez mais
utilmente por todos os modos, formando um novo Adão a partir do velho e
trocando Eva por Maria».
«Certamente, podia bastar
Cristo, pois toda a nossa suficiência nos vem d’Ele; mas não era bom para nós
que o homem estivesse sozinho [1].
Muito mais conveniente era que ambos os sexos participassem na nossa reparação,
já que ambos contribuíram para a nossa corrupção. Jesus Cristo Homem, é fiel e
poderoso Mediador entre Deus e os homens, mas os homens veneram n’Ele a
majestade divina. N’Ele a humanidade pareceria absorvida na divindade, não por
a natureza humana já não ser tal, mas por estar divinizada. D’Ele se canta a
misericórdia, mas igualmente a justiça, porque embora, pelo que sofreu, tenha
aprendido a compaixão e a misericórdia [2],
tem simultaneamente o poder de juiz. Enfim, a exigência do nosso Deus é como um
fogo ardente, de modo que o pecador não temeria chegar-se a Ele, com medo de
morrer diante da sua presença, como se derrete a cera?»
«Assim pois, a mulher
bendita entre todas as mulheres não está a mais. Vê-se claramente o papel que
desempenha na obra da nossa reconciliação, porque precisávamos de um mediador
próximo deste Mediador e ninguém pode desempenhar este ofício melhor que Maria.
Eva tinha sido uma mediadora demasiado cruel, por quem a serpente antiga
infundiu no homem o veneno mortífero. Mas fiel é Maria, que ofereceu aos homens
e às mulheres o antídoto salvador. Eva foi instrumento da tentação, Maria do
perdão; aquela induziu a pecar, esta trouxe a redenção. Que receio teria a
fragilidade humana de se chegar a Maria? N’Ela nada é austero, nada é terrível;
tudo é suave, oferecendo a todos leite e lã».
«Estuda com cuidado toda a
história evangélica e se encontras em Maria algo de dureza, de repreensão
desabrida, ou algum sinal de indignação, ainda que leve, poderias desconfiar e
ter receio de te chegares a Ela. Mas se, pelo contrário, como acontece de
facto, descobres que tudo o que a Ela pertence está cheio de piedade e de
misericórdia, de mansidão e de graça, agradece-o ao Senhor que, com a sua
benigníssima misericórdia, providenciou para ti uma mediadora tão maravilhosa,
pois nada pode haver na Virgem que inspire temor. Ela fez-se toda para todos;
tornou-se devedora de sábios e de ignorantes, com imensíssimo amor. A todos
abre o regaço da misericórdia, para que todos recebam da sua plenitude: o
cativo redenção, o enfermo cura, o aflito consolo, o pecador perdão, o justo
graça, o anjo alegria; enfim, toda a Trindade recebe glória; e a própria Pessoa
do Filho recebe d’Ela a substância da carne humana, a fim de que não haja quem
se esconda da sua ternura».
São
Bernardo (século XII), Sermão no Domingo da oitava anterior à Assunção, 1-2.
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