Art.
3 — Se na morte de Cristo houve separação entre a divindade e a alma.
O
terceiro discute-se assim. — Parece que na morte de Cristo houve separação
entre a divindade e a alma.
1. — Pois, diz o Senhor: Ninguém tira a
minha alma de mim, mas eu de mim mesmo a ponho e de novo a reassumo. Logo,
parece que corpo não pode depor a alma, separando-se dela; porque não está a
alma sujeita ao poder do corpo, mas antes o contrário. Donde resulta que
Cristo, enquanto Verbo de Deus podia dispor da sua alma; isto é, separá-la.
Logo, depois da morte de Cristo a alma separou-se-lhe da divindade.
2. Demais. — Atanásio diz: Maldito seja quem não confessar que a
natureza humana, na sua totalidade, assumida pelo Filho de Deus, não ressurgiu
dos mortos, de novo assumida ou liberada no terceiro dia. Ora, a natureza
humana em sua totalidade não podia ser de novo assumida, se não tivesse algum
tempo sido separada do Verbo de Deus. Mas, o homem total é composto de alma e
de corpo. Logo, houve durante algum tempo separação da divindade, tanto do
corpo como da alma.
3. Demais. — Por causa da união com a
natureza humana total, o Filho de Deus é verdadeiramente considerado homem. Se,
pois, desaparecida a união entre a alma e o corpo pela morte, o Verbo de Deus
permanecesse unido à alma, resultaria podermos dizer que o Filho de Deus era
verdadeiramente a alma. Ora, isso é falso, porque, sendo a alma a forma do
corpo, resultaria que o Verbo de Deus seria a forma do corpo - o que é
impossível. Logo, na morte de Cristo a alma ficou separada do Verbo de Deus.
4. Demais. — A alma e o corpo, separados
um do outro, não constituem uma só hipótese, mas duas. Se, portanto, o Verbo de
Deus permaneceu unido tanto ao corpo como à alma de Cristo, separada esta
daquele pela morte de Cristo, resulta que o Verbo de Deus, durante a morte de
Cristo, constituía duas hipóteses. O que é inadmissível. Logo, depois da morte
de Cristo, a alma não permaneceu unida ao Verbo.
Mas, em contrário, diz Damasceno: Embora Cristo morresse como homem e a sua
alma santa se lhe ficasse separada do corpo imaculado, contudo a divindade
continuava inseparável de uma e de outra, isto é, da alma e do corpo.
A alma está unida ao Verbo de
Deus mais imediatamente que ao corpo, e anteriormente a essa segunda união;
pois, o corpo está unido ao Verbo de Deus mediante a alma, como dissemos. Ora,
como o Verbo de Deus não se separou, na morte, do corpo, com muito maior razão
não se separou da alma. Donde, assim como predicamos do Filho de Deus o que
convém ao corpo separado da alma, isto é, que foi sepultado, assim também dele
dizemos no símbolo. que desceu aos infernos, porque a sua alma, separada do
corpo, desceu aos infernos.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. —
Agostinho, expondo as referidas palavras de João, pergunta se, sendo Cristo o Verbo, separou-se da alma,
enquanto era alma ou, de novo, enquanto era carne. E afirma que, se dissermos que depôs a alma enquanto o
Verbo de Deus, resulta que algum tempo essa alma esteve separada do Verbo. Ora, isso é falso. Pois, a morte separou o
corpo, da alma; mas não afirmo com isso que a alma ficou separada do Verbo. Se,
porém dissermos que a própria alma se separou a si mesma, resulta que a alma
mesma se separou de si própria. O que é absurdissimo. Resta, pois, que a
própria carne depôs a alma e de novo a assumiu, não por poder próprio, mas por
poder do Verbo que nela habitava; porque, como dissemos, depois da morte a
divindade do Verbo não se separou da carne.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Com as palavras
aduzidas, Atanásio não quis dizer que a natureza humana na sua totalidade foi
de novo assumida, isto é, todas as suas partes, como se o Verbo de Deus
deparasse, pela morte, as partes da natureza humana. Mas que a totalidade da
natureza humana, de novo assumida na ressurreição, foi reintegrada pela renovada
união da alma e do corpo.
RESPOSTA À TERCEIRA. — O Verbo de Deus,
por causa da união da natureza humana, não é considerado por isso como a
natureza humana; mas é chamado homem, isto é, o que tem a natureza humana.
Pois, a alma e o corpo são partes essenciais da natureza humana. Donde, da
união do Verbo com elas ambas não resulta que o Verbo de Deus seja alma ou
corpo, mas, sim, que tem alma ou corpo.
RESPOSTA À QUARTA. — Como diz Damasceno,
na morte de Cristo separou-se a alma, da
carne, mas não se dividiu uma mesma hipóstase em duas. Pois, tanto o corpo como
a alma de Cristo, à mesma luz, tiraram a sua existência, desde o principio, da
hipóstase do Verbo. E na morte, separadas entre si, cada qual continuou tendo a
mesma hipóstase do Verbo. Porque a mesma hipóstase do Verbo permaneceu a
hipóstase do Verbo, da alma e do corpo. Pois, nunca nem a alma nem o corpo
tiveram nenhuma hipóstase própria, além da hipóstase do Verbo; porque sempre é
uma hipóstase do Verbo e nunca duas.
Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.
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