Em seguida devemos tratar da morte de
Cristo. E nesta questão discutem-se seis artigos:
Art. 1 — Se foi conveniente que Cristo
morresse.
Art. 2 — Se na morte de Cristo a
divindade se separou da carne.
Art. 3 — Se na morte de Cristo houve
separação entre a divindade e a alma.
Art. 5 — Se o corpo de Cristo foi
identicamente o mesmo quando vivo e quando morto.
Art. 6 — Se a morte de Cristo produziu
algum efeito para a nossa salvação.
Art.
1 — Se foi conveniente que Cristo morresse.
O
primeiro discute-se assim. — Parece que não foi conveniente que Cristo
morresse.
1. — Pois, o primeiro princípio, num género,
não pode ser subordinado ao que é contrário a esse género; assim o fogo,
princípio do calor, nunca pode ser frio. Ora, o Filho de Deus é a fonte e o
princípio de toda a vida, segundo a Escritura: Em ti está a fonte da vida. Logo, parece que não foi conveniente
que Cristo morresse.
2. Demais. — Maior miséria é a morte que
a doença, por que por esta se chega àquela. Ora, não era conveniente que Cristo sofresse nenhuma doença, como diz
Crisóstomo. Logo, também não o era que morresse.
3. O Senhor diz: Eu vim para terem vida e para a terem em maior abundância. Ora, um
contrário não conduz a outro. Logo, parece que não era conveniente que Cristo
morresse.
Mas, em contrário, o Evangelho: Convém-vos que morra um homem pelo povo e
que não pereça toda a nação.
Foi conveniente que Cristo
morresse. — Primeiro, para satisfazer pelo género humano, que tinha sido
condenado à morte por causa do pecado, segundo a Escritura: Em qualquer dia que comeres dele, morrerás
de morte. Ora, o modo conveniente de satisfazermos por outrem é nos
sujeitarmos à pena que ele merecia. Por isso Cristo quis morrer a fim de
morrendo, satisfazer por nós, segundo a Escritura: Cristo uma vez morreu pelos nossos pecados. — Segundo, para mostrar
que assumiu verdadeiramente a natureza humana. Pois, como diz Eusébio, se Cristo, depois de ter vivido no meio dos
homens, houvesse, para evitar a morte, desaparecido inopinadamente,
ocultando-se-lhes aos olhos, todos os teriam julgado um fantasma. —
Terceiro, a fim de morrendo, livrar-nos do temor da morte. Donde o dizer o
Apóstolo: Ele participou igualmente da
carne e do sangue, para destruir pela sua morte ao que tinha o império da
morte, isto é, ao diabo; e para livrar aqueles que pelo temor da morte estavam
em escravidão toda a vida. — Quarto, a fim de que, morrendo corporalmente,
à semelhança do pecado, isto é, da pena, nos desse exemplo de morrer
espiritualmente para o pecado. Donde o dizer o Apóstolo: Porque, enquanto a ele morrer pelo pecado, morreu uma só vez; mas,
quanto a viver, vive para Deus. Assim também vós considerai-vos como estando
mortos para o pecado, mas vivos para Deus, em Nosso Senhor Jesus Cristo. —
Quinto, a fim de, ressurgindo dos mortos, mostrasse ao mesmo tempo o seu poder,
pelo qual venceu a morte, e nos desse a esperança de ressurgir dos mortos.
Donde o dizer o Apóstolo: Se se prega que
Cristo ressuscitou dentre os mortos, como dizem alguns dentre vós outros que
não há ressurreição de mortos?
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. —
Cristo é a fonte da vida, como Deus, mas não como homem. Ora, morreu como homem
e não como Deus. Donde o dizer Agostinho: Longe
de nós pensar que Cristo, sendo ele próprio a vida, morreu perdendo-a; pois, se
tal tivesse acontecido, a fonte da vida teria secado. Mas, padeceu a morte
enquanto participante da fraqueza humana, que assumira espontaneamente, sem
contudo perder o poder da sua natureza, pelo qual tudo vivifica.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Cristo não sofreu
a morte originada por nenhuma doença, para que não se pensasse que morreu por
enfermidade imposta pela natureza. Mas sim, a morte que lhe foi infligida
exteriormente, a que espontaneamente se submeteu para mostrar que era morte
voluntária.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Um contrário não
conduz a outro, essencialmente falando; mas tal pode dar-se por acidente, como
quando, por exemplo, o frio aquece acidentalmente. E deste modo Cristo, pela
sua morte, nos conduziu à vida, destruindo a nossa morte como a sua, assim como
quem sofre uma pena por outrem, torna-o livre dela.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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