19/07/2016

Leitura espiritual

Leitura Espiritual

Temas actuais do cristianismo 



São Josemaria Escrivá
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pergunta:

A que atribui a crescente importância que se dá ao Opus Dei?
É devida só ao atractivo da sua doutrina ou é também um reflexo das ansiedades da idade moderna?

resposta:

O Senhor suscitou o Opus Dei em 1928 para ajudar a recordar aos cristãos que, como conta o livro do Génesis, Deus criou o homem para trabalhar.
Viemos chamar de novo a atenção para o exemplo de Jesus, que durante trinta anos permaneceu em Nazaré trabalhando, desempenhando um ofício.
Nas mãos de Jesus, o trabalho - e um trabalho profissional, semelhante ao que milhões de homens realizam, em todo o mundo - converte-se em tarefa divina, em actividade redentora, em caminho de salvação.

O espírito do Opus Dei recolhe a formosíssima verdade, esquecida durante séculos por muitos cristãos, de que qualquer trabalho, humanamente digno e nobre, se pode converter numa tarefa divina. No serviço de Deus não há ofícios de menos categoria: todos são de muita importância.

Para amar a Deus e servi-Lo, não é preciso fazer coisas extravagantes.
A todos os homens, sem excepção, Cristo pede que sejam perfeitos como o seu Pai celeste é perfeito [i].
Na sua grande maioria, os homens, para serem santos, devem santificar o seu trabalho, santificar-se no seu trabalho e santificar os outros com o seu trabalho, encontrando assim Deus no caminho das suas vidas.

As condições da sociedade contemporânea, que valoriza cada vez mais o trabalho, facilitam evidentemente que os homens do nosso tempo possam compreender este aspecto da mensagem cristã que o espírito do Opus Dei veio sublinhar.
Mas mais importante ainda é o influxo do Espírito Santo, que na sua acção vivificadora quis que o nosso tempo fosse testemunha de um grande movimento de renovação em todo o Cristianismo.
Lendo os documentos do Concílio Vaticano II vê-se claramente que parte importante dessa renovação foi precisamente a revalorização do trabalho quotidiano e da dignidade da vocação do cristão que vive e trabalha no mundo.

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pergunta:

Como se vai desenvolvendo o Opus Dei noutros países, fora de Espanha?
Qual é a sua influência nos Estados Unidos, Inglaterra, Itália, etc.?

resposta:

Pertencem actualmente ao Opus Dei pessoas de sessenta e oito nacionalidades, que trabalham em todos os países da América e da Europa Ocidental e em alguns da África, Ásia e Oceania.

A influência do Opus Dei em todos esses países é uma influência espiritual.
Consiste essencialmente em ajudar as pessoas que se aproximam do nosso trabalho a viver mais plenamente o espírito evangélico na sua vida corrente.
Estas pessoas trabalham nos sítios mais variados, desde camponeses, que cultivam a terra em longínquas aldeias da serra andina, até banqueiros de Wall Street.
A todos o Opus Dei ensina que o seu trabalho quotidiano, seja humanamente humilde ou brilhante, é de grande valor e pode ser um meio eficacíssimo para amar e servir a Deus e aos outros homens.
Ensina-lhes a amar todos os homens, a respeitar a sua liberdade, a trabalhar - com plena autonomia, do modo que lhes parecer melhor - para apagar as incompreensões e as intolerâncias entre os homens e para que a sociedade seja mais justa.
Esta é a única influência do Opus Dei em qualquer dos lugares onde trabalha.

Referindo-me às actividades sociais e educativas que a Obra como tal costuma promover, dir-lhe-ei que correspondem, em cada lugar, às condições concretas e às necessidades da sociedade.
Não disponho de dados pormenorizados sobre todas essas actividades, porque, como comentava antes, a nossa organização está muito descentralizada.
Poderia mencionar, como um exemplo entre muitos outros possíveis, o Midtown Sports and Cultural Center, no Near West Side de Chicago, que proporciona programas educativos e desportivos aos habitantes do bairro.
Parte importante do seu trabalho consiste em promover a convivência e a amizade entre os diversos grupos étnicos que o compõem.
Outro trabalho interessante, nos Estados Unidos, é o que se realiza em The Heights, em Washington, onde funcionam cursos de orientação profissional, programas especiais para estudantes particularmente dotados, etc.

Na Inglaterra, poder-se-ia destacar o trabalho de residências universitárias, que oferecem aos estudantes alojamento e diversos programas para completar a sua formação cultural, humana e espiritual. Netherhall House, em Londres, é talvez especialmente interessante pelo seu carácter internacional.
Têm convivido nessa residência universitários de mais de cinquenta países.
Muitos deles não são cristãos, porque as casas do Opus Dei estão abertas a todas as pessoas, sem discriminação de raça ou religião.

Para não me alongar demasiado, apenas mencionarei ainda o Centro Internazionale della Gioventú Lavoratríce, em Roma.
Este centro, destinado à formação profissional de operários jovens, foi confiado ao Opus Dei pelo Papa João XXIII e inaugurado por Paulo VI há menos de um ano.

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pergunta:

Como vê V. Rev.ª o futuro do Opus Dei nos anos que se seguirão?

resposta:

O Opus Dei é ainda muito novo.
Trinta e nove anos para uma instituição é apenas o começo.
A nossa tarefa é colaborar com todos os outros cristãos na grande missão de ser testemunha do Evangelho de Cristo; é recordar que essa boa nova pode vivificar qualquer situação humana. A tarefa que nos espera é ingente.
É um mar sem limites, porque, enquanto houver homens na Terra, por muito que se alterem as formas técnicas da produção, terão um TRABALHO que podem oferecer a Deus, que podem santificar.
Com a graça de Deus, a Obra quer ensinar-lhes a fazer desse trabalho um serviço a todos os homens de qualquer condição, raça ou religião.
E servindo assim os homens, servirão a Deus.

Fim da entrevista realizada por Tad Szulc, correspondente do New York Times, em 7 de Outubro de 1966.

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pergunta:

O Opus Dei ocupa um papel de primeiro plano no processo moderno de evolução do laicado; por isso gostaríamos de lhe perguntar, antes de mais nada, quais são, na sua opinião, as características mais notáveis deste processo.

resposta:

Sempre pensei que a característica fundamental do processo de evolução do laicado é a consciencialização da dignidade da vocação cristã.
A chamada de Deus, o carácter baptismal e a graça, fazem com que cada cristão possa e deva encarnar plenamente a fé.
Cada cristão deve ser alter Christus, ipse Christus, presente entre os homens.
O Santo Padre disse-o de maneira inequívoca: “É necessário voltar a dar toda a importância ao facto de ter recebido o sagrado baptismo, quer dizer, de ter sido enxertado, mediante esse sacramento, no Corpo Místico de Cristo, que é a Igreja. (...) Ser cristão, ter recebido o baptismo, não deve ser considerado como coisa indiferente e sem valor, antes deve marcar profunda e ditosamente a consciência de todos os baptizados” [ii].

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Isto traz consigo uma visão mais profunda da Igreja, como comunidade formada por todos os fiéis, de modo que todos somos solidários duma mesma missão, que cada um deve realizar segundo as suas circunstâncias pessoais.
Os leigos, graças aos impulsos do Espírito Santo, são cada vez mais conscientes de serem Igreja, de possuírem uma missão específica, sublime e necessária, uma vez que foi querida por Deus.
E sabem que essa missão depende da sua própria condição de cristãos, não necessariamente de um mandato da Hierarquia, embora seja evidente que deverão realizá-la em união com a Hierarquia eclesiástica e segundo os ensinamentos do Magistério: sem união com o Corpo episcopal e com a sua cabeça, o Romano Pontífice, não pode haver, para um católico, união com Cristo.

O modo de os leigos contribuírem para a santidade e para o apostolado da Igreja consiste na acção livre e responsável no seio das estruturas temporais, aí levando o fermento da mensagem cristã.
O testemunho de vida cristã, a palavra que ilumina em nome de Deus e a acção responsável, para servir os outros, contribuindo para a resolução de problemas comuns, são outras tantas manifestações dessa presença através da qual o cristão corrente cumpre a sua missão divina.

Há muitos anos, desde a própria data da fundação do Opus Dei, que medito e tenho feito meditar umas palavras de Cristo que nos relata S. João: et ego, si exaltatus fuero a terra, omnia traham ad meipsum [iii]. Cristo, morrendo na Cruz, atrai a Si a criação inteira, e, em seu nome, os cristãos, trabalhando no meio do mundo, hão-de reconciliar todas as coisas com Deus, colocando Cristo no cume de todas as actividades humanas.

Entrevista realizada por Enrico Zuppi e António Fugardi, publicada em L'Osservatore della Domenica (Cidade do Vaticano) nos dias 19 e 26 de Maio e 2 de Junho de 1968

(cont)




[i] (Mat. 5, 48)
[ii] (Encíclica Ecclesiam Suam, parte 1)
[iii] (Jn. 12, 32)

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