Leitura Espiritual Temas actuais do cristianismo |
São Josemaria Escrivá
31
pergunta:
Como
explica o imenso êxito do Opus Dei, e por que critérios mede V. Rev.ª esse
êxito?
resposta:
Quando
um empreendimento é sobrenatural, pouco importam o êxito ou o fracasso como
vulgarmente se consideram.
Já
dizia S. Paulo aos cristãos de Corinto que, na vida espiritual, o que interessa
não é o juízo dos outros, nem o nosso próprio juízo, mas o juízo de Deus.
É
certo que a Obra está hoje estendida a todo o mundo: pertencem a ela homens e
mulheres de cerca de 70 nacionalidades.
Ao
pensar neste facto, eu mesmo me surpreendo.
Não
lhe encontro explicação humana, mas sim a vontade de Deus, pois o Espírito
sopra onde quer, e serve-Se de quem quer para realizar a santificação dos
homens.
Tudo
isso é para mim ocasião de acção de graças, de humildade e de súplica a Deus
para saber sempre servi-Lo.
Pergunta-me
também qual o critério com que meço e ajuízo as coisas.
A
resposta é muito simples: santidade, frutos de santidade.
O
apostolado mais importante do Opus Dei é aquele que cada um dos seus sócios
realiza através do testemunho da sua vida e com a sua palavra, no convívio
diário com os amigos e companheiros de profissão.
Quem
poderá medir a eficácia sobrenatural deste apostolado silencioso e humilde?
É
incalculável a ajuda que representa o exemplo de um amigo leal e sincero, ou a
influência de uma boa mãe no seio da família.
Mas
talvez a sua pergunta se refira aos apostolados da Obra como tal, supondo que,
neste caso, se poderão medir os resultados sob um ponto de vista humano,
técnico: se uma escola de formação de operários consegue promover socialmente
os homens que a frequentam; se uma Universidade dá aos seus estudantes uma
formação profissional e cultural adequadas.
Se
admitirmos que é esse o sentido da sua pergunta, dir-lhe-ei que o resultado se
pode explicar em parte por se tratar de tarefas realizadas por pessoas que exercem
esse trabalho como uma actividade profissional específica, para a qual se
preparam como todo aquele que deseja executar um trabalho sério.
Quer
isto dizer, entre outras coisas, que essas obras não se lançam segundo esquemas
preconcebidos: caso por caso, estudam-se as necessidades particulares da
sociedade em que se vão inserir, para se adaptarem às exigências reais.
Repito-lhe
que ao Opus Dei não interessa primordialmente a eficácia humana.
O
êxito ou o fracasso real desses trabalhos depende de que, estando humanamente
bem feitos, sirvam ou não sirvam para que aqueles que os realizam, e também os
que deles beneficiam, amem a Deus, se sintam irmãos de todos os outros homens e
manifestem estes sentimentos num serviço desinteressado à humanidade.
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pergunta:
Quererá
V. Rev.a dizer como e porquê fundou o Opus Dei, e que acontecimentos considera
marcos mais importantes do seu desenvolvimento?
resposta:
Porquê?...
As
obras que nascem da vontade de Deus não têm outra razão de ser senão o desejo
divino de as utilizar como expressão da sua vontade salvífica universal.
Desde
o primeiro momento, a Obra foi universal, católica.
Não
nasceu para dar solução aos problemas concretos da Europa da década de 20, mas
sim para dizer aos homens e mulheres de todos os países, de qualquer condição,
raça, língua ou ambiente, e de qualquer estado - solteiros, casados, viúvos,
sacerdotes -, que podiam amar e servir a Deus sem deixar de viver no seu
trabalho habitual, com a sua família, nas suas variadas e normais relações
sociais.
Como
se fundou?
Sem
nenhum meio humano.
Eu
tinha apenas 26 anos, a graça de Deus e bom-humor.
A
Obra nasceu pequena: não era mais que o empenho dum jovem sacerdote, que se
esforçava por fazer o que Deus lhe pedia.
Pergunta-me
por marcos do nosso caminho...
Para
mim, é marco essencial na Obra qualquer momento, qualquer instante em que,
através do Opus Dei, alguém se aproxima de Deus, tornando-se assim mais irmão
dos homens seus irmãos.
Talvez
quisesse que lhe falasse dos pontos cruciais, na ordem do tempo...
Embora
não sejam estes os mais importantes, vou-lhe dar, de memória, umas datas, mais
ou menos aproximadas.
Já
nos primeiros meses de 1935, estava tudo preparado para começar a trabalhar em
França - concretamente em Paris.
Mas
vieram, primeiro, a guerra civil espanhola e, logo a seguir, a segunda guerra
mundial - e foi preciso adiar a expansão da Obra. Mas, como esse
desenvolvimento era necessário, o adiamento foi mínimo.
Já
em 1940 se iniciava o trabalho em Portugal.
Quase
coincidindo com o fim das hostilidades, embora tivesse havido já algumas
viagens em anos anteriores, começou-se na Inglaterra, em França, na Itália, nos
Estados Unidos, no México. Depois, a expansão tem um ritmo progressivo.
A
partir de 1949 e 50: na Alemanha, Holanda, Suíça, Argentina, Canadá, Venezuela
e nos restantes países europeus e americanos.
Ao
mesmo tempo, o trabalho ia-se alargando a outros continentes: o Norte de
África, o Japão, o Quénia e outros países da África oriental, a Austrália, as
Filipinas, a Nigéria, etc.
Também
sinto prazer em recordar especialmente, como datas capitais, as constantes
ocasiões em que de modo mais palpável se manifestou o carinho dos Sumos
Pontífices pela nossa Obra.
Resido
normalmente em Roma desde 1946, e assim tive ocasião de conhecer e tratar com
Pio XII, João XXIII e Paulo VI.
Em
todos encontrei sempre um carinho de pai.
33
pergunta:
Estaria
V. Rev. de acordo com a afirmação, alguma vez feita, de que o ambiente especial
de Espanha durante os últimos trinta anos facilitou o crescimento da Obra nesse
país?
Resposta:
Em
poucos lugares encontramos menos facilidades do que em Espanha.
É
o país - custa-me dizê-lo, pois amo profundamente a minha pátria - em que deu
mais trabalho e sofrimento fazer enraizar a Obra.
Mal
tinha nascido, logo encontrou a oposição dos inimigos da liberdade individual,
e de pessoas tão aferradas às ideias tradicionais que não podiam compreender a
vida dos sócios do Opus Dei: cidadãos vulgares, que se esforçam por viver
plenamente a sua vocação cristã sem deixar o mundo.
Também
as obras de apostolado da própria Obra não encontraram especiais facilidades em
Espanha.
Governos
de países onde a maioria dos cidadãos não é católica ajudaram, com muito maior
generosidade do que o Estado espanhol, as actividades docentes e beneficentes
promovidas por membros da Obra.
O
auxílio que esses governos concedem ou possam conceder às obras próprias do
Opus Dei, como é habitual com outras obras semelhantes, não significa
privilégio, mas simplesmente o reconhecimento da função social que desempenham,
poupando dinheiro ao Tesouro público.
Na
sua expansão internacional, o espírito do Opus Dei encontrou imediato eco e
profundo acolhimento em todos os países.
Se
encontrou obstáculos, foi exactamente por causa de falsidades vindas de Espanha
e inventadas por espanhóis, por alguns sectores bem concretos da sociedade
espanhola.
Em
primeiro lugar, a organização internacional de que há pouco lhe falei; mas isso
parece certo que é coisa do passado, e eu não guardo rancor a ninguém.
Depois,
algumas pessoas que não compreendem o pluralismo, que adoptam atitudes de
grupo, quando não caem em mentalidade estreita ou totalitária e que se servem
do nome católico para fazer política. Alguns desses, não percebo porquê -
talvez por falsos motivos humanos -, parecem achar um gosto especial em atacar
o Opus Dei, e, como dispõem de grandes meios económicos, - o dinheiro dos
contribuintes espanhóis -, os seus ataques podem ser publicados por certa
imprensa.
Vejo
bem que o meu amigo está à espera de me ouvir citar nomes concretos de pessoas
e instituições...
Não
lhos vou dar, e espero que compreenda a razão.
Nem
a minha missão nem a da Obra são políticas: o meu ofício é rezar.
E
não quero dizer nada que possa interpretar-se sequer como uma intervenção em
Política.
Mais
ainda, é-me doloroso falar destas coisas.
Estive
calado durante quase 40 anos, e, se agora digo alguma coisa, é porque tenho
obrigação de denunciar como absolutamente falsas as interpretações torcidas que
algumas pessoas pretendem dar de uma actividade que é exclusivamente
espiritual.
Por
isso, se bem que até agora me tenha calado, daqui em diante falarei, e, se for
necessário, cada vez com maior clareza.
Mas,
voltando ao tema central da sua pergunta: se, também em Espanha, muitas pessoas
de todas as classes sociais têm procurado seguir Cristo com a ajuda do Opus Dei
e de acordo com o seu espírito, a explicação para isso não se pode ir buscar ao
ambiente ou a outros motivos extrínsecos.
A
prova do que afirmo está em que aqueles que tão levianamente o pretendem vêem
diminuir os seus próprios grupos; e as causas exteriores são as mesmas para
todos. Humanamente falando, talvez seja também porque esses formam grupo, e nós
não tiramos a liberdade pessoal a ninguém.
Se
o Opus Dei está bem desenvolvido em Espanha - como também em algumas outras
nações -, pode ser condição disso o facto de a nossa tarefa espiritual aí se
haver iniciado há 40 anos, e, como lhe expliquei antes, a guerra civil
espanhola e, em seguida, a guerra mundial tornarem necessário o adiamento do
início da Obra noutros países.
Quero
declarar, no entanto, que desde há alguns anos, os espanhóis são uma minoria no
Opus Dei.
Não
pense, repito, que não amo a minha pátria, ou que não me alegro profundamente
com o trabalho que a Obra nela realiza; mas é triste que haja quem propague
equívocos acerca do Opus Dei e acerca de Espanha.
Fim da entrevista realizada por Peter
Forbarth, correspondente de Time (New York), em 15 de Abril de 1967.
(cont)
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