O rei de Espanha, estando para morrer, mandou chamar o
filho e, entreabrindo as vestes reais, mostrou-lhe o peito roído de vermes,
dizendo:
– Príncipe, vê como se morre, e onde vêm a parar as
grandezas do mundo.
Depois exclamou:
– Quem me dera ter sido simples frade de qualquer ordem e
não monarca!
Ao mesmo tempo, mandou lançar ao pescoço uma corda da
qual pendia uma cruz de madeira, e, tendo disposto tudo para a morte,
acrescentou:
– Meu filho, quis que estivesses presente a este acto
para veres bem como na morte o mundo trata os próprios reis. Quem tiver vivido
melhor, achará lugar melhor junto de Deus.
Esse filho, depois Felipe II, quando, por sua vez, estava
para morrer na idade de 23 anos, disse:
– Meus vassalos, não faleis no meu elogio fúnebre senão
no que estais vendo agora. Dizei que na morte de nada serve ser rei, senão para
sentir maior tormento de o haver sido.
Em seguida, exclamou:
– Prouvera a Deus que nunca tivesse sido rei e tivesse
vivido num deserto no serviço de Deus! Poderia apresentar-me agora com mais
confiança ao seu tribunal e não correria tamanho risco de me condenar.
De que servem, porém, tais desejos na hora da morte senão
para maior mágoa e desespero do que não amou a Deus durante a vida?
Com razão dizia Santa Teresa:
‘Não se deve fazer caso das coisas que acabam com a vida;
a verdadeira vida consiste em viver de tal modo que não se tenha de recear a
morte. Se desejamos ver o que valem os bens da terra, consideremo-los com os
olhos fitos na morte e digamos: as honras, as dignidades, os prazeres, as
riquezas acabarão um dia: assim atendamos em nos fazer santos e ricos daqueles
bens que nos acompanharão para a eternidade e nos tornarão contentes para
sempre.’
Ah, meu Redentor, padecestes tantos sofrimentos e
ignomínias por meu amor, e eu amei tanto os prazeres e bens passageiros deste
mundo que, por causa deles, cheguei a calcar aos pés a vossa graça. Mas se Vós,
quando eu Vos desprezava, não deixastes de me procurar, não posso temer, ó meu
Jesus, que me rejeiteis agora que Vos procuro e Vos amo de todo o coração e me
arrependo mais de Vos ter ofendido que se tivesse sofrido qualquer outra
desgraça.
santo afonso maria de ligório – Extraído de Meditações, Para todos os Dias e Festas do
Ano, Tomo II
(Revisão da versão portuguesa por ama)
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