Art.
2 — Se a referida luminosidade era gloriosa.
O segundo discute-se assim. — Parece que a
referida luminosidade não era gloriosa.
1. — Pois, diz uma Glosa de Beda ao
Evangelho — Transfigurou-se na presença
deles: No seu corpo mortal, diz, mostra, não a imortalidade, mas a luminosidade
semelhante à imortalidade futura. Ora, a luminosidade da glória é a
luminosidade da imortalidade. Logo, aquela luminosidade, que Cristo
manifestou aos discípulos, era a luminosidade da glória.
2. Demais. — Ainda do Evangelho — Não hão-de gostar a morte até não verem o
reino de Deus — diz a Glosa de Beda:
isto é, a glorificação do corpo, numa representação imaginária da beatitude
futura. Ora, a imagem de uma coisa não se confunde com esta. Logo, a
referida luminosidade o era a da beatitude.
3. Demais. — Só o corpo humano é
susceptível da luminosidade da glória. Ora, a luminosidade da transfiguração manifestou-se
não só no corpo de Cristo, mas também nas suas vestes e na nuvem luminosa que encobriu
os discípulos. Logo, parece que essa luminosidade não era a da glória.
Mas, em contrário, do escrito por
Mateus. — Transfigurou-se perante eles,
diz Jerónimo: Tal como há-de aparecer no
dia do juízo, assim apareceu aos Apóstolos. E àquele outro lugar do mesmo
evangelista — até que vejam o Filho do
homem vir na glória do seu reino — diz Crisóstomo: Querendo mostrar aquela glória, com a qual virá mais tarde,
manifestou-se-lhes na vida presente, como podiam eles suportar, de modo que não
viessem a condoer-se com a morte do Senhor.
SOLUÇÃO. — A luminosidade de que
Cristo se revestiu na transfiguração foi a da glória, quanto ao modo de ser. Pois, a luminosidade do corpo glorioso
deriva da luminosidade da alma, como diz Agostinho. E semelhantemente a claridade do corpo de Cristo na
transfiguração deriva da sua divindade, como diz Damasceno, e da glória da sua alma. E só por uma
dispensa divina é que a glória da alma, que Cristo teve desde o princípio da
sua concepção, não redundou no corpo, a fim de que consumasse num corpo passível
os mistérios dessa redenção, como dissemos. Mas isso não privou Cristo do poder
de derivar a glória da alma para o corpo. E isso o fez quanto à luminosidade,
na transfiguração. Mas de modo diferente que no corpo glorificado. Pois, no
corpo glorificado redunda a luminosidade da alma, como uma qualidade permanente
que afecta o corpo; por isso, o refulgir corporalmente o corpo glorioso não é
nenhum milagre. Mas, para o corpo de Cristo, na transfiguração, derivou-lhe a
luminosidade da sua divindade e da sua alma, não a modo de uma qualidade
imanente e afectante do corpo em si mesmo, mas antes a modo de paixão
transeunte, como quando o ar é iluminado pelo sol. Por isso, aquele fulgor de
que então se revestiu o corpo de Cristo, foi miraculoso, como também o foi o facto
de ter andado sobre as ondas do mar. Donde o dizer Dionísio: Cristo pratica, com um poder sobre humano,
actos que o homem pode praticar; como o demonstra o facto de a Virgem ter
concebido sobrenaturalmente e o de ter a mobilidade da água sustentado o peso
dos seus pés materiais e terrenos. — E por isso não devemos admitir, como o ensina Hugo de S. Vitor, que Cristo assumiu o dote da luminosidade,
na transfiguração; o da agilidade, quando andou sobre o mar; o da subtileza,
quando nasceu do Ventre Virginal de Maria. Porque um dote nomeia uma certa
qualidade imanente do corpo glorioso. Cristo, porém, teve milagrosamente tudo o
referente aos dotes. E o mesmo, se deu, quanto à alma, relativamente à visão
pela qual Paulo viu a Deus num rapto, como dissemos na Segunda Parte.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— Das palavras citadas não se conclui que a luminosidade de Cristo não fosse a
luminosidade da glória; mas, que foi a do Corpo glorioso, porque o corpo de
Cristo ainda não era imortal. Pois, como por permissão divina a glória da alma
de Cristo não lhe redundou para o corpo, assim, pela mesma dispensação, pode
redundar-lhe quanto ao dote da claridade, e não quanto ao da impassibilidade.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Diz-se que a
referida claridade era imaginária, não por não ser a verdadeira claridade da
glória, mas por ser uma imagem representativa da perfeição da glória, que
tornará glorioso o corpo.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Assim como a
claridade do corpo de Cristo, na transfiguração, representava a claridade
futura desse mesmo corpo, assim a claridade das suas vestes designava a futura
claridade dos santos, que será superada pela de Cristo, como o candor da neve o
é pelo do sol. Por isso diz Gregório, que as
vestes de Cristo se tornaram refulgentes, porque na culminância da claridade
superna, todos os santos unir-se-lhe-ão na refulgência da luz da justiça. E quanto às vestes, elas designam os justos
que ele unirá a si, segundo a Escritura. — Quanto à nuvem transparente, ela
significa a glória do Espírito Santo, ou a
virtude paterna, como diz Orígenes, pela
qual os santos serão garantidos na sua glória futura. — Embora também com
propriedade possa significar a claridade do mundo renovado, que será o
tabernáculo dos santos. Por isso, quando Pedro se dispõe a fazer os
tabernáculos, a nuvem transparente encobriu os discípulos.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.