Páscoa
Evangelho:
Jo 13, 16-20
16 Em verdade, em verdade vos digo: o
servo não é maior do que o seu senhor, nem o enviado é maior do que aquele que
o enviou. 17 Já que compreendeis estas coisas, bem-aventurados sereis se as praticardes.
18 «Não falo de todos vós; sei os que escolhi; porém, é necessário que se
cumpra o que diz a Escritura: “O que come o pão comigo levantará o seu
calcanhar contra mim”. 19 Desde agora vo-lo digo, antes que suceda, para que,
quando suceder, acrediteis que “Eu sou”. 20 Em verdade, em verdade vos digo
que, quem recebe aquele que Eu enviar, a Mim recebe, e quem Me recebe, recebe
Aquele que Me enviou».
Comentário:
O cristão tem de ter bem presente
"o seu lugar" e os "limites" em que pode e deve actuar nas
tarefas de apostolado.
Não lhe convém agir por seu próprio
alvedrio por muito "capaz" que possa ser e, até, a experiência que
tenha acumulado.
Procurar conselho e guia na
Direcção Espiritual esse é o caminho certo, a decisão conveniente.
(ama,
comentário sobre Jo 13 16-20, 2015.04.30)
Leitura espiritual
SANTO
AGOSTINHO – CONFISSÕES
CAPÍTULO
XVI
A
medida do presente
E, contudo, Senhor,
percebemos os intervalos de tempos, os comparamos entre si, e dizemos que uns
são mais longos e outros mais breves. Medimos também o quanto uma duração é
maior ou menor que outra, e respondemos que esta é o dobro ou o triplo de
outra; que aquela é simples, ou que ambas são iguais. Mas é o tempo que passa
que medimos quando o percebemos passar. Quanto ao passado, que não existe mais,
e o futuro que não existe ainda, quem poderá medi-los, a menos que ouse afirmar
que o nada pode ser medido? Assim, quando o tempo passa, pode ser percebido e
medido. Porém quando já decorreu, ninguém o pode mentir ou sentir, porque já
não existe.
CAPÍTULO
XVII
O
passado e o presente
Pai, apenas pergunto, não
estou afirmando; meu Deus, ajuda-me, dirige-me. Quem ousaria afirmar que não
existem três tempos, como aprendemos na infância e como ensinamos às crianças, o
passado, o presente e o futuro? Será que só o presente existe, porque os
demais, o passado e o futuro, não existem? Ou será que eles também existem, e
então o presente provém de algum lugar oculto, quando de futuro se torna
presente, e também se retira para outro esconderijo, quando de presente se
torna passado? E os que predisseram o futuro, onde o viram, se ele ainda não
existe? É impossível ver-se o que não existe. E os que narram o passado diriam
mentiras se não vissem os acontecimentos com o espírito. Ora, se esse passado
não tivesse existência alguma, seria absolutamente impossível vê-lo. Por
conseguinte, o futuro e o passado também existem.
CAPÍTULO
XVIII
As
previsões
Permite-me, Senhor, que eu
leve adiante minhas investigações, tu que és a minha esperança; faz que a minha
tentativa não seja perturbada. Se o futuro e o passado existem, quero saber
onde estão. Se ainda não posso compreender, sei todavia que, onde quer que
estejam, não existem nem como futuro, nem como passado, mas apenas como
presente. Se também ali estiver enquanto futuro, então ainda não existirá; se o
passado aí estiver como passado, já não estará lá.
Portanto, no lugar e no
modo que estiverem, só podem existir como presentes. Quando relatamos acontecimentos
verídicos do passado, o que vêm à nossa memória não são os factos em si, que já
deixaram de existir, mas as palavras que exprimem as imagens dos factos, que,
através dos nossos sentidos, gravaram no nosso espírito as suas pegadas. A minha
infância, por exemplo, que não existe mais, pertence a um passado que também
desapareceu; mas quando eu a evoco e passo a relatá-la, vejo as suas imagens no
presente, imagens que ainda estão na minha memória. E a predição do futuro, meu
Deus, seguiria um processo análogo? Os factos que ainda não existem, serão
representados antecipadamente no nosso espírito como imagens já existentes? Eu
ignoro-o. O que sei é que habitualmente premeditamos as nossas acções futuras,
e que essa premeditação pertence ao presente, enquanto esta começará a existir,
pois então não será mais futura, mas presente.
Seja qual for a natureza
desse misterioso pressentimento do futuro, o certo é que apenas se pode ver
aquilo que existe. Ora, o que já existe não é futuro, mas presente. Quando se
diz que se vê o futuro, o que se vê não são os factos futuros em si, que ainda
não existem porque são futuros, mas as suas causas ou talvez sinais
prognósticos, causas e sinais que já existem. Estes não são pois futuros, mas
presentes para os que as vêem, e é graças aos vaticínios que o futuro é concebido
pelo espírito e profetizado. Esses conceitos já existem, e os que predizem o
futuro vêem-nos presentes em si mesmos.
Gostaria de apelar para um
exemplo tomado entre os muitos possíveis. Vejo a aurora, e prognostico o
nascimento do sol. O que vejo é presente, o que anuncio é futuro. Não o sol,
que já existe, mas o seu surgimento, que ainda não ocorreu. Contudo, se eu não
tivesse uma imagem mental desse surgimento, como agora quando falo dele,
ser-me-ia impossível a previsão. Mas essa aurora que vejo não é o nascimento do
sol, embora o preceda; nem o é tampouco a imagem que trago no meu espírito. As
duas coisas estão presentes, eu vejo-as, e assim posso predizer o que vai
acontecer. O futuro, portanto, ainda não existe; se ainda não existe, não
existe no agora; e se não existe não pode ser visto de modo algum, mas pode ser
prognosticado pelos sinais presentes, que já existem e podem ser vistos.
CAPÍTULO
XIX
Oração
Mas tu, que és soberano
sobre as tuas criaturas, de que modo ensinas às almas os factos por vir, como
revelas aos teus profetas? De que modo ensinas o futuro, tu, para quem o futuro
não existe? Ou antes, como ensinas os sinais presentes dos factos futuros?
Pois, o que ainda não existe não pode ser ensinado. O teu modo misterioso de
agir está muito acima da minha inteligência, sobrepuja as minhas forças. Por
mim mesmo eu não o poderia alcançar, mas podê-lo-ei por ti, quando me
concederes, ó doce Luz dos olhos da minha alma!
CAPÍTULO
XX
Conclusão
O que agora parece claro e
evidente para mim é que nem o futuro, nem o passado existem, e é impróprio
dizer que há três tempos: passado, presente e futuro. Talvez fosse mais correcto
dizer: há três tempos: o presente do passado, o presente do presente e o
presente do futuro. E essas três espécies de tempos existem na nossa mente, e
não as vejo noutra parte. O presente do passado é a memória; o presente do
presente é a percepção directa; o presente do futuro é a esperança.
Se me é lícito falar
assim, vejo e confesso que há três tempos. Diga-se também que são três os
tempos: presente, passado e futuro, como abusivamente afirma o costume. Não me importo,
nem me oponho, nem critico o modo de falar, desde que fique bem entendido o que
se diz, e que não se acredite que o futuro já existe e que o passado ainda
existe. Uma linguagem que expresse com termos exactos é incomum: com muita
frequência falamos com impropriedade, mas entende-se o que queremos dizer.
CAPÍTULO
XXI
A
medida do tempo
Disse há pouco que medimos
o tempo que passa; de modo que podemos afirmar que um lapso de tempo é o dobro
de outro, ou igual, e apontar entre os intervalos de tempo outras relações,
mediante esse processo comparativo. Portanto, como eu dizia, medimos o tempo no
momento em que passa. E se me perguntarem: Como o sabes? – eu responderia: Sei
porque o medimos, e porque é impossível medir o que não existe; ora, o passado
e o futuro não existem.
Quanto ao presente, como
podemos medi-lo, se não tem duração? Portanto, só podemos medi-lo enquanto
passa; e quando passou, não o medimos mais, porque não há mais nada a medir.
Mas de onde se origina,
por onde passa, para onde vai o tempo quando o medimos? De onde vem senão do
futuro? Por onde passa, senão pelo presente? Para onde vai senão para o passado?
Nasce pois do que ainda não existe, atravessa o que não tem duração, e corre
para o que não existe mais. No entanto, o que é que medimos, senão o tempo
relacionado ao espaço?
Quando dizemos de um tempo
que é simples, duplo, ou triplo, ou igual, ou quando formulamos qualquer outra
relação dessa espécie, nada mais fazemos do que medir espaços de tempo. Em que
espaço medimos então o tempo no momento em que passa? No futuro, talvez, donde procede?
Mas o que ainda não existe não pode ser medido. Será no presente, por onde ele passa?
Mas, como medir o que não tem extensão? Será no passado, para onde caminha? Mas
o que não existe mais escapa a qualquer medida.
CAPÍTULO
XXII
O
enigma
A minha alma inflama-se no
desejo de deslindar este enigma tão complicado! Senhor, meu Deus, meu bom Pai,
eu to suplico por Cristo; não queiras tolher o meu desejo a solução de tais problemas,
tão familiares mas tão obscuros; permite que eu os penetre, e faz com que a luz
da tua misericórdia os ilumine, Senhor! A quem poderia eu consultar sobre isso?
A quem confessaria a minha ignorância com mais proveito do que a ti, que não se
despraz com o forte zelo que me inflama pelas tuas Escrituras? Concede-me o que
amo, pois este amor é um dom teu. Dá-me, ó Pai, esta graça, tu que sabes presentear
com boas dádivas os teus filhos. Concede-me essa luz, porque determinei
conhecê-las, e o meu esforço será rude até que me reveles esses mistérios. Eu to
suplico, por Cristo, em nome do Santo dos Santos, que ninguém perturbe a minha
investigação.
Acreditei, e por isso falo.
A minha esperança, a esperança pela qual vivo, é contemplar as delícias do
Senhor. Eis que tornaste velhos os meus dias, e eles passam, não sei como.
Nós só falamos de tempo, e
de tempo, e de tempos e de tempos. Esse homem falou quanto tempo? Quanto tempo
demorou para fazê-lo? Há quanto tempo não vejo isto! A duração desta sílaba é o
dobro daquela, que é breve. Assim nos expressamos e assim ouvimos, e todos nos
compreendem, e nós compreendemos. São palavras claras e de uso corrente, mas
encerram mistérios, e compreendê-las requer melhor análise.
(Revisão de versão portuguesa por ama)
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