29/02/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Quaresma
Semana III

Evangelho: Lc 4, 24-30

24 Depois acrescentou: «Em verdade vos digo que nenhum profeta é bem recebido na sua terra. 25 Em verdade vos digo que muitas viúvas havia em Israel no tempo de Elias, quando foi fechado o céu durante três anos e seis meses e houve uma grande fome por toda a terra; 26 e a nenhuma delas foi mandado Elias, senão a uma mulher viúva de Sarepta, do território de Sidónia. 27 Muitos leprosos havia em Israel no tempo do profeta Eliseu; e nenhum deles foi curado, senão o sírio Naaman». 28 Todos os que estavam na sinagoga, ouvindo isto, encheram-se de ira. 29 Levantaram-se, lançaram-n'O fora da cidade, e conduziram-n'O até ao cume do monte sobre o qual estava edificada a cidade, para O precipitarem. 30 Mas, passando no meio deles, retirou-Se

Comentário:

Estas palavras de Jesus que para sempre ficaram gravadas 'dificilmente alguém é profeta na sua terra', sirvam de desculpa para fugir às obrigações apostólicas que todo o cristão tem?

Bem ao contrário: devem constituir um fortíssimo aviso para o comportamento, o exemplo que tem de se dar.
Sobretudo aqueles que nos conhecem melhor, os da “nossa terra” mais que pelas palavras têm de ser “seduzidos” pelo exemplo do que fazemos mais que pelo possamos dizer.

Que importa se somos “fáceis de palavra”, interessantes na exposição, atraentes pelo conteúdo se, o que praticamos diz o oposto, se nos conhecem por relapsos, frios, egoístas, desinteressados, soberbos, se não mostramos preocupação pelos outros, as suas vidas, dificuldades ou doenças, se não somos solidários ou participamos nas acções destinadas ao bem comum, se o “copo de água”, o “pedaço de pão”, ficam por partilhar.

Ah... sim!
Nestes casos bem podemos estafar-nos em “pregações” que ninguém nos dará ouvidos.

(ama, Comentário a Lc 4, 24-30, 2012.03.11

Leitura espiritual



PRIMEIRA PARTE



CAPÍTULO I

O DESÍGNIO DE AMOR DE DEUS
A TODA A HUMANIDADE



IV. DESÍGNIO DE DEUS E MISSÃO DA IGREJA


c) Novos céus e nova terra

56 A promessa de Deus e a ressurreição de Jesus Cristo suscitam nos cristãos a fundada esperança de que para todas as pessoas humanas é preparada uma nova e eterna morada, uma terra em que habita a justiça (cf. 2 Cor 5, 1-2; 2Pd 3, 13).

«Então, depois de vencida a morte, os filhos de Deus ressuscitarão em Cristo e aquilo que foi semeado na fraqueza e na corrupção revestir-se-á de incorruptibilidade; e permanecendo a caridade com as suas obras, todas as criaturas que Deus criou por causa do homem serão livres da servidão da vaidade» [68].

Esta esperança, longe de atenuar, deve antes impulsionar a solicitude pelo trabalho referente à realidade presente.

57 Os bens, quais a dignidade do homem, a fraternidade e a liberdade, todos os bons frutos da natureza e da nossa operosidade, esparsos pela terra no Espírito do Senhor e de acordo com o Seu preceito, limpos de toda a mancha, iluminados e transfigurados, pertencem ao Reino de verdade e de vida, de santidade e de graça, de justiça, de amor e de paz que Cristo entregará ao Pai e lá os encontraremos novamente.
Ressoarão então para todos, na sua solene verdade, as palavras de Cristo: «Vinde, benditos de meu Pai, tomai posse do Reino que vos está preparado desde a criação do mundo, porque tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; era peregrino e me acolhestes; nu e me vestistes; enfermo e me visitastes; estava na prisão e viestes a mim (...) todas as vezes que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, foi a mim mesmo que o fizestes» (Mt 25, 34-36.40).

58 A realização da pessoa humana, actuada em Cristo graças ao dom do Espírito, matura na história e é mediada pelas relações da pessoa com as outras pessoas, relações que, por sua vez, alcançam a sua perfeição graças ao empenho por melhorar o mundo, na justiça e na paz.
O agir humano na história é de per si significativo e eficaz para a instauração definitiva do Reino, ainda que este continue a ser dom de Deus, plenamente transcendente.
Tal agir, quando respeitoso da ordem objectiva da realidade temporal e iluminado pela verdade e pela caridade, torna-se instrumento para uma actuação sempre mais plena e integral da justiça e da paz e antecipa no presente o Reino prometido.

Configurando-se a Cristo Redentor, o homem apercebe-se como criatura querida por Deus e por Ele eternamente escolhida, chamada à graça e à glória, na plenitude do mistério de que se tornou partícipe em Jesus Cristo [69].

A configuração a Cristo e a contemplação do Seu Rosto [70] infundem no cristão um anelo indelével por antecipar neste mundo, no âmbito das relações humanas, o que será realidade no mundo definitivo, empenhando-se em dar de comer, de beber, de vestir, uma casa, a cura, o acolhimento e a companhia ao Senhor que bate à porta (cf. Mt 25, 35-37).

d) Maria e o Seu «fiat» ao desígnio de amor de Deus

59 Herdeira da esperança dos justos de Israel e primeira dentre os discípulos de Jesus Cristo é Maria, Sua Mãe.
Ela, com o Seu «fiat» ao desígnio de amor de Deus (cf. Lc 1, 38), em nome de toda a humanidade, acolhe na história o enviado do Pai, o Salvador dos homens.
No canto do «Magnificat» proclama o advento do Mistério da Salvação, a vinda do «Messias dos pobres» (cf. Is 11, 4; 61, 1).
O Deus da Aliança, cantado pela Virgem de Nazaré na exultação do Seu espírito, é Aquele que derruba os poderosos de seus tronos e exalta os humildes, sacia de bens os famintos e despede os ricos de mãos vazias, dispersa os soberbos e conserva a Sua misericórdia para aqueles que O temem (cf. Lc 1, 50-53).

Haurindo no coração de Maria, da profundidade da Sua fé expressa nas palavras do «Magnificat», os discípulos de Cristo são chamados a renovar cada vez melhor em si mesmos «a certeza de que não se pode separar a verdade a respeito de Deus que salva, de Deus que é fonte de toda a dádiva, da manifestação do seu amor preferencial pelos pobres e pelos humildes, amor que, depois de cantado no Magnificat, se encontra expresso nas palavras e nas obras de Jesus» [71].

Maria, totalmente dependente de Deus e toda orientada para Ele, com o impulso da sua fé «é o ícone mais perfeito da liberdade e da libertação da humanidade e do cosmos» [72].


CAPÍTULO II

MISSÃO DA IGREJA E DOUTRINA SOCIAL

I. EVANGELIZAÇÃO E DOUTRINA SOCIAL

a) A Igreja, morada de Deus com os homens

60 A Igreja, partícipe das alegrias e esperanças, das angústias e das tristezas dos homens, é solidária com todo homem e a toda a mulher, de todo lugar e de todo tempo, e leva-lhes a Boa Nova do Reino de Deus, que com Jesus Cristo veio e vem em meio a eles [73].

A Igreja é, na humanidade e no mundo, o sacramento do amor de Deus e, por isso mesmo, da esperança maior, que ativa e sustém todo autêntico projecto e empenho de libertação e promoção humana. É, no meio aos homens, a tenda da companhia de Deus ― «o tabernáculo de Deus com os homens» (Ap 21, 3) ― de modo que o homem não se encontra só, perdido ou transtornado no seu empenho de humanizar o mundo, mas encontra amparo no amor redentor de Cristo.
Ela é ministra de salvação, não em abstracto ou em sentido meramente espiritual, mas no contexto da história e do mundo em que o homem vive [74], onde o alcançam o amor de Deus e a vocação a corresponder ao projecto divino.

61 Único e irrepetível na sua individualidade, todo o homem é um ser aberto à relação com os outros na sociedade.
O conviver social na rede de relações que interliga indivíduos, famílias, grupos intermédios em relações de encontro, de comunicação e de reciprocidade, assegura ao viver uma qualidade melhor.
O bem comum que eles buscam e conseguem formando a comunidade social é garantia do bem pessoal, familiar e associativo [75].

Por estas razões, se origina e toma forma a sociedade, com os seus componentes estruturais, ou seja, políticos, económicos, jurídicos, culturais.
Ao homem «enquanto inserido na complexa rede de relações das sociedades modernas» [76], a Igreja dirige-se com a sua doutrina social.

«Perita em humanidade» [77], a Igreja é apta a compreendê-lo na sua vocação e nas suas aspirações, nos seus limites e nos seus apuros, nos seus direitos e nas suas tarefas, e a ter para ele uma palavra de vida que ressoe nas vicissitudes históricas e sociais da existência humana.

b) Fecundar e fermentar com o Evangelho a sociedade

62 Com o seu ensinamento social a Igreja entende anunciar e actualizar o Evangelho na complexa rede de relações sociais. Não se trata simplesmente de alcançar o homem na sociedade ― o homem qual destinatário do anúncio evangélico, - mas de fecundar e fermentar com o Evangelho a mesma sociedade [78].

Cuidar do homem significa, para a Igreja, envolver também a sociedade na sua solicitude missionária e salvífica.
A convivência social, com efeito, não raro determina a qualidade da vida e, por conseguinte, as condições em que cada homem e cada mulher se compreendem a si próprios e decidem de si mesmos e da própria vocação.
Por esta razão, a Igreja não é indiferente a tudo o que na sociedade se decide, se produz e se vive, numa palavra, à qualidade moral, autenticamente humana e humanizadora, da vida social.
A sociedade e, com ela, a política, a economia, o trabalho, o direito, a cultura não constituem um âmbito meramente secular e mundano e portanto marginal e alheio à mensagem e à economia da salvação. Efectivamente, a sociedade ― com tudo o que nela se realiza ― diz respeito ao homem. É a sociedade dos homens, que são «a primeira e fundamental via da Igreja» [79].

63 Com a sua doutrina social a Igreja assume a tarefa de anúncio que o Senhor lhe confiou.
Ela actualiza no curso da história a mensagem de libertação e de redenção de Cristo, o Evangelho do Reino.
A Igreja, anunciando o Evangelho, «testemunha ao homem, em nome de Cristo, sua dignidade própria e sua vocação à comunhão de pessoas; ensina-lhe as exigências da justiça e da paz, de acordo com a sabedoria divina» [80].

Evangelho que, mediante a Igreja, ressoa no hoje do homem [81], a doutrina social é palavra que liberta.
Isso significa que tem a eficácia de verdade e de graça do Espírito Santo, que penetra os corações, dispondo-os a cultivar pensamentos e projectos de amor, de justiça, de liberdade e de paz.
Evangelizar o social é, pois, infundir no coração dos homens a carga de sentido e de libertação do Evangelho, de modo a promover uma sociedade à medida do homem porque à medida de Cristo: é construir uma cidade do homem mais humana porque mais conforme com o Reino de Deus.

(cont)

Notas:
__________________
[68] CONCÍLIO VATICANO II, const. past. Gaudium et Spes, n.º 39, AAS 58, 1966, p. 1057.
[69] Cf. JOÃO PAULO II, carta encícl. Redemptor Hominis, n.º 13, AAS 71, 1979, p. 283-284.
[70] Cf. JOÃO PAULO II, carta apost. Novo Millennio Ineunte, n.º 16-28, AAS 93, 2001, p. 276-285.
[71] JOÃO PAULO II, carta encícl. Redemptoris Mater, n.º 37, AAS 79, 1987, p. 410.
[72] CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ, instr. Libertatis Conscientia, n.º 97, AAS 79, 1987, p. 597.
[73] Cf. CONCÍLIO VATICANO II, const. past. Gaudium et Spes, n.º l, AAS 58, 1966, p. 1025-1026.
[74] Cf. CONCÍLIO VATICANO II, const. past. Gaudium et Spes, n.º 40, AAS 58, 1966, p. 1057-1059; JOÃO PAULO II, carta encícl. Centesimus Annus, n.os 53-54, AAS 83, 1991, p. 959-960; ID., carta encícl. Sollicitudo Rei Socialis, n.º 1, AAS 80, 1988, p. 513-514.
[75] Cf. CONCÍLIO VATICANO II, const. past. Gaudium et Spes, n.º 32, AAS 58, 1966, p. 1051.
[76] JOÃO PAULO II, carta encícl. Centesimus Annus, n.º 54, AAS 83, 1991, p. 859.
[77] PAULO VI, carta encícl. Populorum Progressio, n.º 13, AAS 59, 1967, p. 263.
[78] Cf. CONCÍLIO VATICANO II, const. past. Gaudium et Spes, n.º 40, AAS 58, 1966, p. 1057-1059.
[79] JOÃO PAULO II, carta encícl. Redemptor Hominis, n.º 14, AAS 71, 1979, p. 284.
[80] Catecismo da Igreja Católica, n.º 2419.
[81] Cf. JOÃO PAULO II, Homilia da Missa de Pentecostes no Centenário da Rerum Novarum (19 de Maio de 1991), L’Osservatore Romano, ed. em português, 26 de Maio de 1991, p. 1.7.


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