Art.
5 — Se no baptismo de Cristo os céus deviam abrir-se.
O quinto discute-se assim. — Parece que no baptismo
de Cristo os céus não deviam abrir-se.
1. — Pois, deve abrir-se o céu a quem
estando de fora, precisa de entrar nele. Ora, Cristo sempre esteve no céu, como
o diz o Evangelho. Logo, parece que os céus não deviam abrir-se-lhe.
2. Demais. — A abertura dos céus entende-se
em sentido espiritual ou material. Ora, não se pode entender em sentido
material, pois que os corpos celestes são impassíveis e infrangíveis, conforme
o dito da Escritura: Talvez formaste tu
com ele os céus, que são tão sólidos como se fossem de metal. Nem em
sentido espiritual, porque ante os olhos de Deus os céus nunca estiveram
fechados. Logo, parece inconveniente dizer que no baptismo de Cristo se lhe
abriram os céus.
3. Demais. — Aos fiéis o céu se abriu
pela paixão de Cristo, segundo o Apóstolo: Temos
confiança de entrar no santuário pelo sangue de Cristo. Por isso, os que
não receberam o baptismo de Cristo e que morreram antes da sua paixão, também
não puderam entrar no céu. Logo, os céus deviam ter-se aberto antes na paixão
que no baptismo de Cristo.
Mas, em contrário: o Evangelho: Depois de baptizado Jesus e estando em
oração, abriu-se o céu.
Como se disse, Cristo quis baptizar-se
para consagrar, com o seu baptismo o que nós devíamos receber. Por isso o baptismo
de Cristo devia manifestar o que constitui a eficácia do nosso. No que se
apresentam três pontos à nossa consideração. Primeiro, a virtude principal
donde o baptismo tira a sua eficácia, que é uma virtude celeste. Por isso, no baptismo
de Cristo, o céu se abriu para mostrar como, no futuro, a virtude celeste
santificaria o baptismo. Segundo, a fé da Igreja e a do baptizado cooperam para
a eficácia do baptismo; por isso, os baptizados fazem profissão da sua fé e o baptismo
se chama o sacramento da fé. Ora, pela fé nós nos alçamos à contemplação das
coisas celestes, excedentes ao sentido e à razão humana. E para o significar,
os céus abriram-se no baptismo de Cristo. Terceiro, porque pelo baptismo de
Cristo nos é especialmente franqueada a entrada do reino celeste, que fora fechada
ao primeiro homem pelo pecado. Por isso, no baptismo de Cristo, abriram-se os
céus para mostrar que aos baptizados está patente o caminho para o céu. – Porém,
depois do baptismo o homem necessita de uma oração contínua, para entrar no
céu. Embora, pois, pelo baptismo se perdoem os pecados, permanece contudo a
concupiscência como seu efeito, que nos impugna interiormente, bem como o mundo
e os demónios, nossos inimigos externos. Por isso, diz assinaladamente o
Evangelho: Depois de baptizado Jesus e estando
em oração, abriu-se o céu; porque aos fiéis é necessária a oração depois do
baptismo. - Ou para compreendermos que o facto de se abrirem os céus aos
crentes, pelo baptismo, foi em virtude da oração de Cristo. Donde o dizer o
Evangelho assinaladamente, que se lhe abriu o céu, isto é, a todos por causa de
Cristo, assim como um imperador diria a quem lhe suplicasse por um terceiro – eis que não lhe dou esse benefício a ele,
mas a ti, isto é, por tua causa é que lho dou, como diz Crisóstomo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— Como diz Crisóstomo, assim como Cristo
foi baptizado em razão da sua natureza humana, embora em si mesmo não
precisasse de baptismo, assim os céus se lhe abriram à sua natureza humana,
embora pela sua natureza divina sempre estivesse no céu.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz Jerónimo,
os céus abriram-se a Cristo baptizado,
não pela divisão dos elementos, mas aos olhos do espírito; assim como
Ezequiel diz, no começo das suas profecias, que
os céus se lhe abriram. E isso prova-o Crisóstomo quando diz, que se fosse a própria criatura dos céus, que se
rompesse, não diria o evangelista - abriu-se-lhe; pois o que materialmente se
abre a todos, está aberto. Por isso, Marcos expressamente diz que logo que saiu da água, viu Jesus os céus
abertos, como referindo a própria abertura dos céus à visão de Cristo. O
que alguns referem à visão corpórea, dizendo ter sido tamanho o esplendor com que refulgiu Cristo no seu baptismo,
que parecia terem-se rasgado os céus. Mas também podemos referi-lo à visão
imaginária, modo pelo qual Ezequiel viu os céus abertos; assim por acção da
virtude divina e da vontade racional, formou-se uma tal visão na imaginação de
Cristo, para exprimir que o baptismo abriu aos homens a entrada do céu. Enfim,
podemos entendê-lo da visão intelectual, isto é, Cristo viu, depois de
santificado pelo baptismo, o céu aberto aos homens; o que já antes via como
devendo realizar-se.
RESPOSTA À TERCEIRA. — A paixão de
Cristo foi uma causa comum de os céus se abrirem aos homens. Mas essa causa há-de
aplicar-se a cada um para lhe tornar possível a entrada no céu. E isso dá-se pelo
baptismo, o Apóstolo: Todos os que fomos
baptizados em Jesus Cristo, fomos baptizados na sua morte. Por isso se faz
menção da abertura dos céus, antes no baptismo, que na paixão. - Ou, como diz Crisóstomo, os céus só se abriram depois de Cristo
baptizado, mas depois que venceu o tirano, não sendo mais necessárias as
portas, pois que o céu não devia mais fechar-se, os anjos não disseram - Abri
as portas (pois já estavam abertas), mas - tirai as portas. Pelo que
Crisóstomo dá a entender, que os obstáculos, que antes impediam as almas dos
defuntos de entrar no céu, foram totalmente arredados pela paixão de Cristo;
mas pelo baptismo foram abertas, como para nos mostrar a via pela qual os
homens haviam de entrar no céu.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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