15/11/2015

Evangelho, comentário, L. espiritual




Tempo comum XXXIII Semana

Santo Alberto Magno – Doutor da Igreja

Evangelho: Mc 13, 24-32

13 Sereis odiados por todos, por causa do Meu nome. Mas o que perseverar até ao fim, esse será salvo. 14 «Quando, pois, virdes a abominação da desolação posta onde não devia estar -leitor, atende bem!- então os que estiverem na Judeia fujam para os montes, 15 quem estiver sobre o telhado, não desça nem entre para levar coisa alguma da sua casa; 16 e quem se encontrar no campo, não volte atrás a buscar o seu manto. 17 Ai das mulheres grávidas e das que tiverem crianças de peito naqueles dias!18 Rogai, pois, que não suceda isto no Inverno. 19 Porque, naqueles dias, haverá tribulações, como não houve desde o principio do mundo que Deus criou, até agora, nem haverá mais. 20 E se o Senhor não abreviasse aqueles dias, nenhuma pessoa se salvaria; mas Ele os abreviou, em atenção aos eleitos que escolheu. 21 «Então se alguém vos disser: “Eis aqui está o Cristo, ei-l'O acolá”, não deis crédito. 22 Porque se levantarão falsos cristos e falsos profetas, e farão milagres e prodígios para enganarem, se fosse possível, até os escolhidos.23 Estai, pois, de sobreaviso, eis que Eu vos predisse tudo.24 Naqueles dias, depois daquela tribulação, o sol escurecer-se-á e a lua não dará a sua claridade, 25 e as estrelas cairão do céu e as potestades que estão nos céus serão abaladas. 26 Então verão o Filho do Homem vir sobre as nuvens, com grande poder e glória. 27 E enviará logo os Seus anjos e juntará os Seus escolhidos dos quatro ventos, desde a extremidade da terra até à extremidade do céu. 28 Ouvi uma comparação tirada da figueira: Quando os seus ramos estão já tenros e as folhas brotam, sabeis que está perto o Verão; 29 assim também, quando virdes acontecer estas coisas, sabei que está perto, às portas. 30 Na verdade vos digo que não passará esta geração sem que se cumpram todas estas coisas. 31 Passarão o céu e a terra, mas as Minhas palavras não hão-de passar. 32 «A respeito, porém, desse dia ou dessa hora, ninguém sabe, nem os anjos do céu, nem o Filho, mas só o Pai.

Comentário:

Sem dúvida que o grande mistério da morte acompanha toda a vida do homem.
Parece um paradoxo – vida e morte – mas de facto não é porque a morte não existe de facto, a vida, sim.

O corpo nasce e morre; a alma, não!

Criada por Deus desde o primeiro instante da concepção, permanecerá para sempre sem conhecer a degradação porque não é física mas puramente espiritual.

Tendo os necessários cuidados com o corpo, com a saúde o que na verdade nos deve importar è cuidar da alma e do “bom estado” em que se encontra para, em qualquer momento, se encontrar face a face com Quem a criou.

(ama, comentário sobre Mc 13, 24-32, 2012.11.18)



Leitura espiritual



A PACIÊNCIA
…/7

O que nós, afinal, ficamos sabendo foi que no dia 27 de Abril, festa de Nossa Senhora de Montserrat, após receber a dose diária de insulina, o Padre se sentou à mesa com o P. Álvaro del Portillo.
De repente, o seu rosto ficou rubro, depois violáceo e, finalmente, invadido por uma palidez cadavérica. A custo, antes de ficar desacordado, tinha pedido ao P. Álvaro a absolvição.

Ele próprio nos relatava depois (só no-lo contou quando já estava bom e não podia causar-nos preocupação), que naquela hora teve a nítida sensação de que ia morrer.
Acrescentava, com o seu indelével bom humor, que, quando conseguira ver-se no espelho, após umas horas de cegueira, tinha comentado ao P. Álvaro:
‘Já sei que aspecto terei quando morrer...’

Deus, em sua bondade, não só o livrou da morte nessa hora de grave crise, como o presenteou com uma rápida recuperação e, o que é mais, com o inexplicável desaparecimento da diabete que, simplesmente, deixou de manifestar-se a partir daquele dia. Ficou curado.

Neste episódio todo, algo se nos revelou com absoluta nitidez, com inequívoca evidência: tínhamos vivido, dia após dia, com um Mons. Escrivá doente, afetado por forte mal-estar físico, muitas vezes cansado, esgotado, e nada disso tinha transparecido no seu porte, no seu rosto, no seu gesto, na sua conversação.

As nossas impressões daqueles dias, expressou-as muito bem um dos que lá estavam em 1954, o português Hugo de Azevedo, na biografia que dedicou bastantes anos mais tarde ao Beato Josemaria, com o título de Uma luz no mundo. Devo dizer que as suas impressões pessoais coincidem, ao pé da letra, com as minhas e as dos outros que estávamos lá:
“O que é admirável para quem, como eu, conviveu com ele nessa época, é não nos termos dado conta de nada, é não recordarmos qualquer diferença de disposição, de vitalidade, de alegria.

Dera-nos dias antes duas meditações diárias durante um retiro, na Semana Santa, e com que vibração nos impulsionava à luta interior e ao apostolado!” [i]

TER A CRUZ É TER A ALEGRIA

Tudo isto é, certamente, admirável, e o foi para nós na época. Agora, com o conhecimento mais aprofundado da vida do Bem-aventurado Josemaria Escrivá, é preciso dizer que, embora seja muito admirável, não é surpreendente, pois na vida santa do Fundador do Opus Dei a paciência heróica, no meio de muitos padecimentos físicos e sobretudo morais, foi uma constante, uma santa “rotina”.

Referindo-se a alguns momentos da década de 1940, em que as dolorosas investidas – sobretudo as calúnias – recrudesciam, ele próprio confidenciaria anos mais tarde:
“Para nos tornar mais eficazes, Deus Nosso Senhor abençoou-nos com a Cruz [...]. Foram anos duros, porque faziam chegar essas calúnias até o mais alto da Igreja, semeando desconfianças e receios para com a Obra. Eu calava-me e rezava [...]. Chegou um momento em que tive de ir uma noite ao sacrário, a dizer: Senhor – e custava-me, custava-me... e me caíam umas lágrimas!... –, se Tu não precisas da minha honra, eu para que a quero?” [ii]
Paciência é isso!
Um grande amor que sabe sofrer e que, justamente por ser amor, sofre com generosidade, com grandeza, com desprendimento total de si mesmo e aceitação plena da Vontade de Deus, com abandono nas mãos do Pai e com alegria.
Que bem no-lo ensinava Mons. Escrivá!
É por isso que os textos que contêm a sua mensagem, para os que pudemos conhecê-lo de perto, são verdadeiros latejos da sua própria alma, sangue das suas veias. Passava para o papel o que vivia ardentemente. Daí que nos seja impossível ler com frieza, como se fossem apenas exortações piedosas ou exposições doutrinais, textos como os seguintes:
“Ter a Cruz é ter a alegria: é ter-te a Ti, Senhor!” “Quando se caminha por onde Cristo caminha; quando já não há resignação, mas a alma se conforma com a Cruz – se amolda à forma da Cruz –; quando se ama a Vontade de Deus; quando se quer a Cruz..., então, mas só então, é Ele quem a leva”.

“Sinais inequívocos da verdadeira Cruz de Cristo: a serenidade, um profundo sentimento de paz, um amor disposto a qualquer sacrifício [...], e sempre – de modo evidente – a alegria: uma alegria que procede de saber que, quem se entrega de verdade, está junto da Cruz e, por conseguinte, junto de Nosso Senhor”.

Ou ainda expansões como a desta confidência pessoal: “Quando vos falo de dor, não vos
falo apenas de teorias [...]. A doutrina cristã sobre a dor não é um programa de consolos fáceis. É, em primeiro lugar, uma doutrina de aceitação do sofrimento, que é de facto inseparável de toda a vida humana.
Não vos posso ocultar – com alegria, porque sempre preguei, e procurei viver, que onde está a Cruz está Cristo, o Amor – que a dor tem aparecido frequentemente na minha vida...” [iii]

A arte de sofrer sorrindo, de que foi exímio mestre o Fundador do Opus Dei, é uma arte contagiosa. É o que vamos ver na nossa segunda história de amor paciente.

UMA CURTA BIOGRAFIA

Mons. Escrivá esteve à beira da morte no dia de Nossa Senhora de Montserrat, 27 de Abril de 1954. A nossa segunda história focaliza uma moça, nascida em Barcelona no dia 10 de Julho de 1941, que havia recebido no Baptismo esse nome, Montserrat, em honra da Padroeira da sua terra.

Familiarmente, os pais, irmãos e amigos a chamávamos Montse, e digo “chamávamos”, porque me unia, e ainda me une, à distância de um oceano, uma entranhada amizade com seus pais, Manuel e Manolita Grases.

Montse foi também filha do Bem-aventurado Josemaria Escrivá, pois pediu a admissão no Opus Dei, entregando a sua vida inteira a Deus, no dia 24 de Dezembro, véspera do Natal de 1957.

Pouco depois, uma leve e persistente dor na perna esquerda deu o primeiro sinal do que viria a diagnosticar-se como um câncer incurável, sarcoma de Ewing, que – após meses de intensas dores – veio a causar a morte daquela menina de 17 anos, no dia 26 de Março de 1959, Quinta-feira Santa.

Resumida assim, em pouquíssimas linhas, essa biografia tão curta, tão cedo truncada, parece muito triste. Parece, mas não é.

Diga-se, já de começo, que Montse, a segunda de uma família de nove irmãos – profundamente católica e unidíssima –, foi sempre uma moça direita e pura, bonita, simpática, esportiva, divertida, religiosa sem beatice e absolutamente normal. E como faz parte da normalidade ter, ao lado de belas virtudes, alguns defeitos, Montse também os tinha – não nasceu com auréola de santa –, e é muito importante ter isso presente ao ler o que vem a seguir.

Montse, que era prestativa e sacrificada, de coração sensível, generoso e bom, era também voluntariosa e geniosa. Ai de quem a contradissesse ou pretendesse fazer-lhe uma desfeita! Sem grosserias nem violências – que não eram do seu feitio –, reagia desde muito menina como pessoa que não leva desaforo para o seu cantinho nem tem um braço fácil de torcer. Por outras palavras, em uma porção de coisas, era “insofrida”, ou seja, era impaciente. Sabendo disso, as pinceladas que se dão a seguir ganham um sentido maior.

UM PROCESSO ACELERADO

Quando se lêem os depoimentos e testemunhos dos que estiveram mais perto dela desde o início das dores (Dezembro de 1957) até a morte (Março de 1959), observa-se um denominador comum. Todos eles salientam que, naqueles quinze meses, houve, não uma mudança instantânea – lampejo de um dia –, mas um processo assombroso, contínuo, crescente, de amadurecimento no amor e nas virtudes, que transformou profundamente Montserrat.
Um crescimento interior tão espantoso, que todos os que a conheceram encararam como algo natural que se iniciasse o seu Processo de Beatificação e Canonização em Dezembro de 1962.

Ao longo de toda a evolução da doença, Montse esforçou-se por levar, até o limite das suas forças, uma vida normal. Queria ser fiel ao que a sua vocação para o Opus Dei lhe pedia: a santificação pessoal e o apostolado no meio do mundo, dentro da normalidade da vida diária, no cumprimento amoroso e acabado dos deveres quotidianos.

Viver assim – com alegre simplicidade, sem chamar a atenção – representava um esforço que conseguiu praticar rezando muito e lutando muito por corresponder à graça de Deus.

Até os últimos dias, quando, já imóvel na cama, mal podia falar, fez um esforço heroicamente fiel para cumprir os propósitos espirituais a que se tinha comprometido livremente com Deus: duas meias horas de oração mental diária, terço, leitura do Evangelho e de algum livro espiritual (só ouvindo ler, já no final), exame de consciência noturno, que jamais desleixou, etc.

Morreu acompanhando o segundo mistério do terço do dia, que a sua mãe e um grupo de amigas rezavam ao pé da sua cama.

O SEGREDO DE UMA IMENSA PAZ
Dessa vida de oração, dessa luta denodada por procurar uma união cada dia maior com Deus, vinham-lhe as forças para abraçar a Vontade divina – a doença, a dor e a morte – e para, não digo aceitar, mas amar de todo o coração a Cruz que Cristo lhe oferecia, para estar junto d’Ele no sofrimento salvador.
Daí a alegria.
Que bem entendeu, vivendo-as, as palavras mil vezes repetidas pelo Bem-aventurado Josemaria Escrivá: A alegria do cristão tem as suas raízes em forma de Cruz!

Com palavras do Fundador, que meditava sobretudo no livro Caminho, Montse repetia: “Jesus, o que tu quiseres, eu o amo!” [iv]

Daí vinham a serenidade, a paz profunda e o constante sorriso que deixavam desnorteadas as pessoas. Uma grande amiga de Montse, Rosa Pantaleoni, lembra que, entre 2 de Julho e 13 de Agosto de 1958, acompanhou-a em várias das trinta sessões de radioterapia a que foi submetida.

“Quando íamos a essas sessões, todas as enfermeiras perguntavam-lhe o que tinha; mas ela mudava logo de conversa e acabava perguntando pelas coisas delas.
Fez-se muito amiga de uma enfermeira: soube que aquela moça gostava de desenhar, e ficaram falando dos desenhos e dos problemas da outra... Às vezes, quando terminávamos, a enfermeira dizia-me: – «Como é simpática, alegre e carinhosa esta menina! Mas nunca fico sabendo se a perna lhe dói ou não. Você sabe?» E eu respondia-lhe: – «Eu também não sei»“.

Doía, porém, e doía muito. A própria Rosa contará que, “no momento de lhe fazerem os curativos, sofria uma barbaridade. Pelos outros. Ela sempre sofria pelos outros”.
Tudo oferecia pela felicidade dos outros, a felicidade que – ela bem o sabia – só se encontra junto de Deus.

Nesse contexto, pode-se avaliar o carácter significativo do seguinte detalhe. Em Dezembro de 1958, conseguiu ser levada de carro, a duras penas, ao Centro do Opus Dei que frequentava em Barcelona, um Centro cultural chamado Llar. Eram os primeiros dias desse mês, e as estudantes praticavam o delicado costume cristão da Novena à Imaculada Conceição.

“Montse – lembra ainda Rosa – queria ir à Novena para rezar a Nossa Senhora. Terminada a Novena, ficava em Llar falando com as estudantes que tinham comparecido e fazendo apostolado, ainda que teria estado muito mais confortável em sua casa, na cama [...]. Mas achava que não tinha o direito de pensar em si mesma quando havia tantas pessoas a quem podia aproximar de Deus”.

Num desses dias da Novena, em que o oratório estava repleto, com umas sessenta moças, “lembro-me – é sempre Rosa quem conta – de que Montse estava sentada, com a perna apoiada em cima do assento de uma cadeira, porque já não a podia flexionar e nessa posição se sentia melhor. Como sempre, procurava não chamar a atenção. Naquele momento, entrou uma estudante que, na penumbra, não percebeu que Montse tinha a perna apoiada na cadeira e lhe perguntou: – «Está livre?» Ela sorriu e respondeu: – «Sim, sim, por favor, sente-se»..., e foi retirando a perna sem que a outra percebesse, cedendo-lhe o lugar”.

A moça voluntariosa e um tanto caprichosa, agora sorria à contrariedade e a amava, como consequência do seu amor a Deus; e ainda, no meio de tantos gestos de singelo heroísmo, desculpava-se às vezes: – “Que pouco sofrida eu sou, não é verdade? Olhe que vergonha”...

UMA LUTA ENAMORADA NO MEIO DA DOR

Amadureceu amando muito, e por isso aprendeu a arte de sofrer com alegria, que é uma arte essencialmente cristã e que se designa – como sabemos – pela palavra paciência.

Montse agonizou numa dura “forja de dor” – como diria Mons. Escrivá – e morreu consumida pela doença. Mas agonizou alegre e morreu feliz. Na véspera da morte, abrindo os olhos, viu as suas amigas perto dela: – “Eu lhes quero muito a todas – disse-lhes –, mas a Jesus muito mais!”. Passou as últimas horas daquela Quinta-feira Santa apertando estreitamente o seu crucifixo, dizendo com voz quase inaudível a Nossa Senhora: “Mãezinha, quanto te amo! Quando virás buscar-me?”, e invocando uma e outra vez o nome de Jesus.

Anos depois da sua morte, Enrique, o irmão mais velho, que é sacerdote da diocese de Barcelona, comentava: “A sua Cruz foi muito dolorosa. Às vezes comentam-me, quando a recordam tão alegre e tão feliz, que ela sentia até gosto no meio da dor... Não, isso não é verdade.

(cont.)

FRANCISCO FAUS, [v] A PACIÊNCIA, 2ª edição, QUADRANTE, São Paulo 1998

(Revisão da versão portuguesa por ama)





[i] Prumo-Rei dos Livros, Lisboa, 1988, pág. 256. 
[ii] salvador bernal, Perfil do Fundador do Opus Dei, Quadrante, São Paulo, 1978, págs. 333, 334 e 371 
[iii] Cf. Forja, Quadrante, São Paulo, 1987, ns. 766, 770, 772; e vázquez de prada, obra citada, pág. 269. 
[iv] Caminho, n. 691
[v] Francisco Faus é licenciado em Direito pela Universidade de Barcelona e Doutor em Direito Canónico pela Universidade de São Tomás de Aquino de Roma. Ordenado sacerdote em 1955, reside em São Paulo, onde exerce uma intensa atividade de atenção espiritual entre estudantes universitários e profissionais. Autor de diversas obras literárias, algumas delas premiadas, já publicou na colecção Temas Cristãos, entre outros, os títulos O valor das dificuldades, O homem bom, Lágrimas de Cristo, lágrimas dos homens, Maria, a mãe de Jesus, A voz da consciência e A paz na família.

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