Em
seguida devemos tratar da virgindade da Mãe de Deus.
E
nesta questão discutem-se quatro artigos:
Art. 1 — Se a Mãe de Deus foi virgem
quando concebeu a Cristo.
Art. 2 — Se a mãe de Cristo foi virgem
no parto.
Art. 3 — Se a mãe de Cristo permaneceu
Virgem depois do parto.
Art. 4 — Se a Mãe de Deus fez voto de
virgindade.
Art. 1 — Se a Mãe de Deus foi virgem
quando concebeu a Cristo.
O
primeiro discute-se assim. — Parece que a Mãe de Deus não foi virgem quando
concebeu a Cristo.
1.
— Pois, nenhum filho de pai e mãe é concebido de mãe virgem. Ora, o Evangelho
não somente diz que Cristo teve mãe, mas também pai. Assim, no lugar: Seu pai e sua mãe estavam admirados daquelas
coisas que dele se diziam. E mais adiante: Sabe que teu pai e eu te andávamos buscando cheios de aflição.
Logo, Cristo não foi concebido de mãe virgem.
2.
Demais. — O Evangelho prova que Cristo foi filho de Abraão e de Davi, pelo fato
de ser José descendente de David; prova essa que seria nula se José não fosse o
pai de Cristo. Donde se conclui que a mãe de Cristo concebeu-o do sémen de
José. E portanto, não foi virgem na sua concepção.
3.
Demais. — O Apóstolo diz: Enviou Deus a
seu filho, feito de mulher. Ora, no modo habitual de falar, chama-se mulher
a que tem marido. Logo, Cristo não foi concebido de mãe virgem.
4.
Demais. — Seres da mesma espécie são gerados do mesmo modo; pois, a geração,
como todo movimento, se específica pelo seu termo. Ora, Cristo era da mesma
espécie que os outros homens, segundo o Apóstolo: Fazendo-se semelhante aos homens e sendo reconhecido na condição, como
homem. E, como os outros homens nasceu da união do homem com a mulher,
resulte que Cristo foi também gerado do mesmo homem. Portanto, não foi
concebido de mãe virgem.
5.
Demais. — Toda a forma natural corresponde a uma determinada matéria, separada
da qual não pode existir. Ora, a matéria da forma humana é o sémen do homem e o
da mulher. Se, pois, o corpo de Cristo não foi concebido do sémen do homem e da
mulher, não foi verdadeiramente um corpo humano, o que é admissível. Logo,
parece que não foi concebido de mãe virgem.
Mas,
em contrário, a Escritura: Eis que uma virgem conceberá.

DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Diz Beda: O
pai do Salvador foi chamado José, não por ter este sido, realmente, o seu pai,
como ensinam os Focinianos; mas, para conservar-se a pureza de Maria, os homens
o consideraram como pai. Por isso o Evangelho diz: Filho, como se julgava,
de José. — Ou, como diz Agostinho, José é
chamado pai de Cristo, do mesmo modo porque é considerado esposo de Maria: sem
conjunção carnal, só por uma união conjugal espiritual; o que o une mais
estreitamente a Cristo do que o faria uma simples adoção. Mas nem por isso,
pelo não ter gerado carnalmente, José devia ser menos considerado pai de
Cristo; pois, poderá ser pai mesmo se tivesse adoptado quem não tivesse sido
nascido de sua esposa.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Como diz Jerónimo, embora José não seja o pai do Salvador e
Senhor, contudo a ordem da sua geração se estende até José, primeiro, por não
ser costume das Escrituras incluir as mulheres na ordem das gerações. —
Segundo, porque José e Maria eram da mesma tribo. E por isso está obrigado pela
lei a recebê-la, como parenta. — E, como diz Agostinho, a ordem das gerações devia ser conduzida até José, para que não
houvesse, nesse casamento, injúria ao sexo, em definitivo, mais nobre; sem
nenhum detrimento para a verdade, porque tanto José como Maria eram da raça de
Deus.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — Como diz a Glosa, o Apóstolo usou da palavra mulher, em vez de
feminina, ao modo de falar dos Hebreus. Pois, no uso comum da língua hebraica,
mulher significa toda pessoa do sexo feminino, e não a que perdeu a virgindade.
RESPOSTA
À QUARTA. — O facto aduzido na objecção não se dá senão com os seres
procedentes por via da natureza; porque a natureza, assim como é determinada a
um só efeito, assim também o é a um só modo de produzi-lo. Mas o poder
sobrenatural divino, sendo infinito, assim como não é determinado a um só
efeito, assim também não o é ao modo de produzir qualquer efeito. Donde, assim
como o poder divino foi capaz de formar o primeiro homem do limo da terra,
assim também o foi, de formar o corpo de Cristo, de uma virgem, sem cooperação
masculina.
RESPOSTA
À QUINTA. — Segundo o Filósofo, o sémen masculino não exerce a função de
matéria na concepção carnal, mas só a de agente; pois, é a fêmea que
subministra a matéria para a concepção. Donde, não tendo havido o sémen
masculino na concepção do corpo de Cristo, daí não se segue que lhe tivesse
faltado a matéria devida. — Se porém o sémen masculino fosse a matéria do feto
animal concebido, é manifesto que não é matéria sempre dotada da mesma forma,
mas, transmutada. E como a virtude natural não transmuda para uma alguma forma
senão uma determinada matéria, contudo o poder divino, que é infinito, pode dar
a toda matéria qualquer forma. Donde, assim como transformou o limo da terra no
corpo de Adão, assim também pode transmutar no corpo de Cristo a matéria
ministrada pela mãe, mesmo se essa não fosse matéria suficiente para a concepção
natural.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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