Art.
3 — Se o anjo anunciante devia aparecer à Virgem em forma corpórea.
O terceiro discute-se assim. — Parece
que o anjo anunciante não devia aparecer à Virgem em forma corpórea.
1. — Pois, ver em espírito é mais nobre que ver materialmente, como diz
Agostinho; e sobretudo é mais conveniente ao anjo, porque pela visão do
espírito o anjo é visto na sua substância e, pela material, é visto na figura
corpórea que assumiu. Ora, assim como o anunciar da concepção divina era
conveniente fosse feito por um núncio supremo, assim também parece que lhe
competia o sumo género de visão. Logo, parece que o anjo anunciante apareceu à
Virgem em visão espiritual.
2. Demais. — Parece que a visão
imaginária também é mais nobre que a visão corpórea, tanto quanto a imaginação
é mais elevada potência que os sentidos. Ora, o anjo apareceu a José durante o
sono, em visão imaginária, como se lê no Evangelho. Logo, parece que também
devia aparecer à Santa Virgem em visão imaginária e não em visão material.
3. Demais. — A visão corpórea de uma
substância espiritual perturba quem a vê; por isso a Igreja canta, da Virgem — e a Virgem pasmou à vista da luz. Ora,
melhor teria sido que a sua alma tivesse sido preservada de tal perturbação.
Logo, não foi conveniente que a referida anunciação se fizesse por uma visão
corpórea.
Mas, em contrário, Agostinho põe na
boca da Santa Virgem as palavras seguintes: Veio
a mim o Arcanjo Gabriel com as faces rútilas, com vestes coruscantes, de
aspecto admirável. Ora, isso só pode pertencer a uma visão corpórea. Logo,
o anjo que anunciou à Santa Virgem apareceu-lhe em forma corpórea.
O anjo anunciante apareceu
à Mãe de Deus em forma corpórea. E isto era conveniente. — Primeiro, quanto ao
anunciado. Pois, o anjo vinha anunciar a Encarnação do Deus invisível.
Portanto, era conveniente que, para anunciar esse acontecimento, uma criatura
invisível assumisse uma forma que lhe permitisse aparecer visivelmente. Porque,
além disso, todas as aparições do Antigo Testamento se ordenem à aparição pela
qual o Filho de Deus se manifestou encarnado. — Segundo, era conveniente à
dignidade da Mãe de Deus, que havia de receber o Filho de Deus não somente na
sua alma, mas também corporalmente, no seu ventre. Por isso, não somente a sua
alma, mas também os sentidos do seu corpo deviam ser favorecidos com a visão
angélica: — Terceiro, era isso conveniente à certeza do que foi anunciado.
Pois, o que é visto com os olhos nós o apreendemos mais certamente do que
aquilo que imaginamos. Donde o dizer Crisóstomo, que o Anjo se apresentou real e visivelmente à Virgem e não em sonhos.
Pois, devendo receber do anjo uma comunicação de tão alta importância, ela
tinha necessidade de uma aparição solene, núncia de um acontecimento tão
relevante.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— A visão intelectual é superior à visão imaginária ou corporal, se for só.
Mas, o próprio Agostinho diz ser mais
excelente a profecia acompanhada simultaneamente da visão intelectual e da
imaginária, que a que o é só de uma delas. Ora, a Santa Virgem não somente
percebeu uma manifestação espiritual. Por isso, essa aparição foi mais nobre.
Mas teria sido ainda mais, se tivesse visto o próprio anjo, na sua substância,
por uma visão Intelectual. Mas o estado de um mortal não se compadecia com ver
um anjo em essência.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A imaginação é
certamente uma potência mais alta que os sentidos exteriores. Como porém a base
do conhecimento humano são os sentidos, o conhecimento sensível é o dotado da
máxima certeza, pois, os princípios do conhecimento hão-de sempre ter maior
certeza. Por isso José, a quem o anjo apareceu durante o sono, não viu uma
aparição tão excelente com o que viu a Santa Virgem.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Como diz
Ambrósio, ficamos perturbados e alheados
dos sentidos quando surpreendidos pela acção inesperada de uma força superior.
E isto se dá não só em se tratando de uma visão real como também imaginária.
Donde o dizer a Escritura, que ao pôr-do-sol veio um profundo sono sobre Abraão
e um horror grande e temeroso o acometeu. Mas, essa perturbação não pode ser
nociva ao homem ao ponto de dever ficar ele privado de uma aparição angélica. —
Primeiro, porque o próprio facto de ser o homem elevado acima de si mesmo, como
o requer a sua dignidade, enfraquece a parte inferior da sua natureza, donde
procede a perturbação referida, assim como a concentração do calor natural no
interior do corpo faz tremerem os membros exteriores. — Segundo porque, como
diz Orígenes, o anjo que apareceu,
conhecedor da natureza humana, começou por acalmar a perturbação. Por isso,
tanto a Zacarias como a Maria, vendo-os: perturbados,
disse-lhes: Não temas. Razão pela qual, como se lê na vida de Antão, não é
difícil discernirmos os espíritos bem-aventurados, dos maus. Se, pois, ao temor
suceder a alegria, saibamos que o auxílio vem de Deus, porque a segurança da
alma é sinal da presença da majestade. Se, ao contrário, o temor incutido
permanecer, é inimigo o que vemos. — E, além disso, a própria perturbação da
Virgem era própria do pudor virginal. Pois, como diz Ambrósio, tremer é próprio
dos virgens, bem como o temerem com a aproximação de qualquer homem e se
amedrontarem quando algum lhes dirige a palavra. — Mas alguns dizem, que como a
Santa Virgem estava acostumada a ver os anjos, não ficou perturbada com a
aparição angélica; mas, tomada de espanto com o que o anjo lhe dizia por não se
julgar digna de coisas tão sublimes. Por isso o Evangelista não diz que ficou perturbada
com a visão, mas sim, com as palavras do anjo.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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