Tempo comum XIII Semana
Evangelho:
Mt 8, 23-27
23 Subindo para uma barca, seguiram-n'O os Seus discípulos. 24
E eis que se levantou no mar uma grande tempestade, de modo que as ondas
alagavam a barca; Ele, entretanto, dormia. 25 Aproximaram-se d'Ele
os discípulos, e acordaram-n'O, dizendo: «Senhor, salva-nos, que perecemos!». 26
Jesus, porém, disse-lhes: «Porque temeis, homens de pouca fé?». Então,
levantando-Se, ordenou imperiosamente aos ventos e ao mar, e seguiu-se uma
grande bonança. 27 Eles admiraram-se, dizendo: «Quem é Este, a quem
até os ventos e o mar obedecem?».
Comentário:
De facto, as atitudes dos discípulos,
provam bem quão fraca era a sua Fé e o seu discernimento.
Primeiro, na aflição pedem-lhe que os
socorra, que lhes valha.
Depois, perante o milagre portentoso
ficam atónitos e interrogam-se: «Quem é
este…»
Nós, cristãos de hoje, sabemos muito
bem quem é Jesus Cristo e que todo o poder sobre o Universo lhe pertence.
Ele manda, ordena, impera!
Mas tantas vezes – talvez muitas vezes
– só nos lembramos de Lhe pedir auxílio quando a angústia que uma situação
grave provoca nos bate á porta.
(AMA, comentário sobre
Mt 8, 23-27, 2015.06.17)
Leitura espiritual
São Josemaria Escrivá
Amigos de Deus 30 a 36
30
Recordem a parábola dos talentos.
Aquele servo que só recebeu um podia - como
os companheiros - empregá-lo bem, procurar que rendesse, usando as suas qualidades.
E
que decide?
Tem
medo de o perder.
E
está certo.
Mas,
e depois?
Enterra-o!
E
acaba por não dar fruto.
Não esqueçamos este caso de temor doentio
de aproveitar honradamente a capacidade de trabalho, a inteligência, a vontade,
o homem todo.
Enterro-o
- parece afirmar esse desgraçado -, mas a minha liberdade fica a salvo!
Não.
A
liberdade inclinou-se para uma coisa muito concreta, para a mais pobre e árida
secura.
Optou,
porque não tinha outro remédio senão escolher; mas escolheu mal.
Nada mais falso do que opor a liberdade à
entrega, porque a entrega surge como consequência da liberdade.
Reparem
que, quando uma mãe se sacrifica por amor aos filhos, escolheu; e, segundo a
medida desse amor, assim se manifestará a sua liberdade.
Se
esse amor é grande, a liberdade será fecunda e o bem dos filhos nasce dessa
bendita liberdade, que pressupõe entrega, e nasce dessa bendita entrega, que é
precisamente liberdade.
31
Mas, perguntar-me-ão, quando conseguimos o
que amamos com toda a alma, já não continuamos a procurá-lo.
Desapareceu a liberdade?
Garanto-vos que então é mais activa do que
nunca, porque o amor não se contenta com um cumprimento rotineiro, nem se coaduna
com o fastio e a apatia.
Amar
significa recomeçar todos os dias a servir, com obras de carinho.
Insisto, e gostaria de gravá-lo a fogo em
cada um: a liberdade e a entrega não se contradizem; apoiam-se mutuamente.
A
liberdade só se pode entregar por amor; não concebo outra espécie de
desprendimento.
Não
é um jogo de palavras mais ou menos acertado.
Na
entrega voluntária, em cada instante dessa dedicação, a liberdade renova o amor
e renovar-se é ser continuamente jovem, generoso, capaz de grandes ideais e de
grandes sacrifícios.
Lembro-me
que tive uma grande alegria quando soube que em português chamam aos jovens os
novos.
E
são isso.
Conto-vos
isto, porque já tenho muitos anos, mas quando rezo junto do altar ao Deus que
enche de alegria a minha juventude, sinto-me muito jovem e sei que nunca me
hei-de considerar velho, porque, se permanecer fiel ao meu Deus.
O Amor vivificar-me-á continuamente.
A minha juventude renovar-se-á como a da
águia.
Por amor à liberdade nos prendemos.
Só
a soberba sente nesses laços o peso de uma cadeia.
A
verdadeira humildade, que nos é ensinada por Aquele que é manso e humilde de
coração, mostra-nos que o seu jugo é suave e a sua carga leve: o jugo é a
liberdade; o jugo é o amor; o jugo é a unidade; o jugo é a vida que Ele ganhou
para nós na Cruz.
32
A
liberdade das consciências
Quando, nos meus anos de sacerdócio, não
direi que prego mas que grito o meu amor à liberdade pessoal, noto nalguns um
gesto de desconfiança, como de quem suspeita que a defesa da liberdade implica
um perigo para a fé.
Que
se tranquilizem esses pusilânimes.
Só
atenta contra a fé uma errada interpretação da liberdade, uma liberdade sem
qualquer fim, sem norma objectiva, sem lei, sem responsabilidade, numa palavra,
a libertinagem.
Infelizmente,
é isso que alguns defendem; essa reivindicação é que constitui um atentado
contra a fé.
Por isso, não é exacto falar de liberdade
de consciência, que equivale a considerar de boa categoria moral o facto de o
homem rejeitar Deus.
Já
recordámos que nos podemos opor aos desígnios salvadores de Nosso Senhor;
podemos, mas não devemos fazê-lo.
E
se alguém tomasse essa atitude deliberadamente, pecaria ao transgredir o
primeiro e o fundamental dos mandamentos: amarás Yahvé com todo o teu coração.
Defendo com todas as minhas forças a
liberdade das consciências, que significa que não é lícito a ninguém impedir
que a criatura tribute culto a Deus.
Têm
de se respeitar os legítimos anseios de verdade: o homem tem obrigação grave de
procurar Nosso Senhor, de O conhecer e de O adorar, mas a ninguém na terra é
lícito impor ao próximo a prática de uma fé que este não tem, tal como ninguém
pode arrogar-se o direito de prejudicar quem a recebeu de Deus.
33
A Igreja, nossa Santa Mãe, sempre se
pronunciou pela liberdade e rejeitou todos os fatalismos, antigos ou menos
antigos.
Declarou
que cada alma é dona do seu destino para bem ou para mal.
E
os que não se afastaram do bem irão para a vida eterna; os que cometeram o mal,
para o fogo eterno.
Impressiona-nos
sempre esta terrível capacidade humana, tua e minha, de todos, que
simultaneamente é o sinal da nossa nobreza.
A
tal ponto o pecado é um mal voluntário, que de nenhum modo seria pecado, se não
tivesse o seu princípio na vontade; esta afirmação goza de tal evidência, que
estão de acordo os poucos sábios e os muitos ignorantes que habitam no mundo.
Volto a levantar o meu coração em acção de
graças ao meu Deus, ao meu Senhor, porque nada o impedia de nos criar impecáveis,
com um impulso irresistível para o bem; mas julgou que seriam melhores os seus
servidores se o servissem livremente.
Que grande é o amor, a misericórdia do
nosso Pai!
Perante esta realidade das suas loucuras
divinas pelos filhos, gostaria de ter mil bocas, mil corações mais, que me
permitissem viver num contínuo louvor a Deus Pai, a Deus Filho, a Deus Espírito
Santo.
Reparem
que o Todo-Poderoso, Aquele que governa o Universo com a sua Providência, não
deseja servos forçados, prefere filhos livres. Meteu na alma de cada um de nós
- embora nasçamos proni ad peccatum,
inclinados ao pecado pela queda dos nossos primeiros pais - uma chispa da sua
inteligência infinita, a atracção pelo bem, uma ânsia de paz perdurável.
E
leva-nos a compreender que a verdade, a felicidade e a liberdade se conseguem
quando procuramos que germine em nós essa semente de vida eterna.
34
Responder negativamente a Deus, rejeitar
esse princípio de felicidade nova e definitiva, ficou nas mãos da criatura.
Mas,
se agir assim, deixa de ser filho e torna-se escravo.
Cada
coisa é aquilo que segundo a sua natureza lhe convém; por isso, quando se move
à procura de algo que lhe é estranho, não actua segundo a sua própria maneira
de ser, mas por impulso alheio; e isto é servil.
O
homem é racional por natureza.
Quando
se comporta segundo a razão, procede, pelo seu próprio movimento, como quem é;
e isto é próprio da liberdade.
Quando
peca, age fora da razão, e então deixa-se conduzir pelo impulso de outro,
submetido a domínio alheio; e por isso quem aceita o pecado é servo do pecado
(Jo 8, 34).
Permitam-me que insista sobre este ponto; é
muito claro e podemos comprová-lo com frequência à nossa volta ou no nosso próprio
eu: nenhum homem escapa a algum tipo de servidão.
Uns
prostram-se diante do dinheiro; outros adoram o poder; outros a tranquilidade
relativa do cepticismo; outros descobrem na sensualidade o seu bezerro de ouro.
E
acontece o mesmo com as coisas nobres.
Empenhamo-nos
num trabalho, numa actividade de maiores ou menores proporções, na realização
de um trabalho científico, artístico, literário, espiritual.
Se
há empenho, se existe verdadeira paixão, quem a isso se entrega vive como
escravo, dedica-se com prazer ao serviço da finalidade da sua tarefa.
35
Escravidão por escravidão - já que de
qualquer modo temos de servir, pois, quer queiramos quer não, essa é a condição
humana - não há nada melhor do que saber que somos, por Amor, escravos de Deus.
Porque
nesse momento perdemos a situação de escravos para nos tornarmos, amigos,
filhos.
E
aqui surge a diferença: enfrentamos as ocupações honestas do mundo com a mesma
paixão, com o mesmo empenho que os outros, mas com paz no íntimo da alma; com
alegria e serenidade, mesmo nas contradições: pois não depositamos a nossa
confiança naquilo que é passageiro, mas no que permanece para sempre, não somos
filhos da escrava, mas da mulher livre.
Donde nos vem esta liberdade?
De Cristo, Nosso Senhor.
Esta é a liberdade com que Ele nos redimiu.
Por
isso ensina: se o Filho vos libertar, sereis verdadeiramente livres. Nós,
cristãos, não temos de pedir emprestado a ninguém o verdadeiro sentido deste
dom, porque a única liberdade que salva o homem é cristã.
Gosto de falar da aventura da liberdade,
porque é essa realmente a aventura da vossa vida e da minha. Livremente - como
filhos, insisto, não como escravos - seguimos o caminho que Nosso Senhor
assinalou para cada um de nós.
E
saboreamos esta facilidade de movimentos como um presente de Deus.
Livremente, sem qualquer coacção, porque me
apetece, decido-me por Deus.
E
comprometo-me a servir, a converter a minha existência numa entrega aos outros,
por amor ao meu Senhor Jesus.
Esta
liberdade incita-me a clamar que nada na terra me separará da caridade de
Cristo.
36
Responsáveis
perante Deus
Deus fez o homem desde o princípio e
deixou-o nas mãos do seu livre arbítrio (Ecli 15, 14).
Isto
não sucederia se não tivesse capacidade de fazer uma escolha livre.
Somos
responsáveis perante Deus por todas as acções que realizamos livremente.
Não
há anonimatos; o homem encontra-se perante o seu Senhor e está na sua vontade
decidir-se a viver como amigo ou como inimigo. Assim começa o caminho da luta
interior, que é empresa para toda a vida, porque enquanto dura a nossa passagem
pela terra ninguém alcança a plenitude da sua liberdade.
Além disso, a nossa fé cristã leva-nos a
garantir a todos um clima de liberdade, começando por afastar qualquer tipo de
enganosas coacções na apresentação da fé.
Se
somos arrastados para Cristo, cremos sem querer; então usa-se a violência, não
a liberdade.
Sem
querer podemos entrar na Igreja; sem querer podemos aproximar-nos do altar;
podemos, sem querer, receber o Sacramento.
Mas
só pode crer aquele que o quer.
E
é evidente que, tendo chegado à idade da razão, se requer a liberdade pessoal
para entrar na Igreja e para corresponder aos contínuos chamamentos que Nosso
Senhor nos dirige.
(cont)
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