Semana V da Páscoa
Evangelho:
Jo 15 1-8
1 «Eu sou a videira
verdadeira, e Meu Pai é o agricultor. 2 Todo o ramo que não dá fruto em Mim,
Ele o cortará; e todo o que der fruto, podá-lo-á, para que dê mais fruto. 3 Vós
já estais limpos em virtude da palavra que vos anunciei. 4 Permanecei em Mim e
Eu permanecerei em vós. Como o ramo não pode por si mesmo dar fruto se não
permanecer na videira, assim também vós, se não permanecerdes em Mim. 5 Eu sou
a videira, vós os ramos. Aquele que permanece em Mim e Eu nele, esse dá muito
fruto, porque sem Mim nada podeis fazer. 6 Se alguém não permanecer em Mim,
será lançado fora como o ramo, e secará; depois recolhê-lo-ão, lançá-lo-ão no
fogo e arderá. 7 Se permanecerdes em Mim, e as Minhas palavras permanecerem em
vós, pedireis tudo o que quiserdes e ser-vos-á concedido. 8 Nisto é glorificado
Meu Pai: Em que vós deis muito fruto e sejais Meus discípulos.
Comentário:
Com insistente
cuidado, o Senhor vai avisando sem tergiversações a absoluta necessidade de
estarmos unidos a Ele.
Formando um só
e bem estruturado conjunto como uma vide com os seus ramos.
Não é demais
nem despicienda a nossa necessidade de sermos avisados já que todos – mais ou menos
– sofremos dessa estranha forma de desejar caminhar por nós mesmos com uma
auto-suficiência facciosa que, se não corrigida a tempo, acabará por nos
perder.
(ama, comentário sobre Jo 15, 1-8, 2014.07.23)
Leitura espiritual
a beleza de
ser cristão
PRIMEIRA PARTE
XI. OS DONS DO ESPÍRITO SANTO
…/22
Ao falar do Baptismo assinalamos, que
entre os efeitos da Graça recebida «o viver e actuar sob a moção do Espírito
Santo mediante os dons do Espírito Santo”.[i]
O Senhor tinha prometido aos Apóstolos a
vinda do Espírito Santo e tinha-lhes indicado: «o Espírito de verdade
guiar-vos-á até à verdade completa”;[ii] e,
pouco antes, tinha anunciado a missão do Espírito com estas palavras:
«Convencerá o mundo no referente ao pecado, no referente à justiça e no
referente ao juízo; no referente ao pecado, porque não creem em mim; no
referente à justiça, porque vou para o Pai, e já não me vereis; no referente ao
juízo, porque o príncipe deste mundo está condenado”.[iii]
Com estas afirmações podemos dar-nos
conta do verdadeiro significado da acção da Graça na pessoa do crente e o que
comporta na pessoa do homem de fé a «participação na natureza divina”: Deus,
Uno e Trino, Pai, Filho e Espírito Santo vive no crente e com o crente.
E também nos daremos conta de que o crente, por sua
vez, não é apenas um membro passivo nesta relação com Deus.
O homem de fé vive em Deus e com Deus, como verdadeiro
«filho de Deus em Cristo Jesus”.
Para
explicar esta acção de Deus no e com o cristão e do cristão em e com Deus,
afirma-se: «A vida moral dos cristãos está sustentada pelos Dons do Espírito
Santo.
Estes são disposições permanentes que tornam o homem
dócil para seguir os impulsos do Espírito Santo”)[iv].
Vimos que a vida cristã, o novo viver do baptizado, se
enforma a través da Fé, da Esperança e da Caridade, que permitem ao homem
desenvolver no seu actuar a riqueza sobrenatural da vida de Deus enxertada em
nós, ao «participar da natureza divina”.
Com a Fé, a Esperança e a Caridade, o
homem realiza acções superiores às forças humanas da sua própria natureza.
Necessita,
portanto, do apoio constante da acção de Deus para se manter e não desfalecer
no seu actuar.
Daí a presença do Espírito Santo na alma, com uma
missão de algum modo semelhante à que teve na Encarnação de Jesus Cristo.
O Espírito Santo tornou possível que
Deus Filho nascesse de mulher, tornando-se carne no seio da Virgem Maria.
A acção do Espírito Santo na pessoa do baptizado torna
possível que o enxerto da Graça vá configurando o cristão em «outro Cristo”, no
«próprio Cristo”.
É o passo que abre as portas à conversão
do homem, de «criatura de Deus” em «filho de Deus em Cristo”, recebendo e
acolhendo a redenção de Cristo; e situa-o no umbral da sua santificação, tão
magistralmente descrita por São Paulo: «Com efeito, eu pela lei morri para a
lei, a fim de viver para Deus; estou crucificado e vivo com Cristo, mas não eu,
mas é Cristo que vive em mim; a vida que vivo no presente na carne, vivo-a na
fé do Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo por mim”.[v]
Resumindo brevemente podemos dizer que a Graça
santificante, ao infundir no espirito do homem a Fé, a Esperança e a Caridade,
prepara todas as potências do cristão para receber aluz de Deus e começar a
crescer pelos caminhos que essa luz lhe descobre.
Luz e caminhos que são os Dons do Espírito Santo.
A graça santificante também infunde na alma os dons do
Espírito Santo.
Pela sua acção, o homem, na sua condição de «filho de Deus
em Cristo”, move-se impulsionado pelo próprio Espírito Santo, para levara a
cabo no seu interior a sugestão que São Paulo faz aos Efésios para que se
despojem «do homem velho que se corrompe seguindo a sedução das
concupiscências, a renovar o espírito da vossa mente e a revestir-vos do homem
novo, criado segundo Deus, na justiça e santidade da verdade”.[vi]
O Espírito Santo, «Deus connosco”, está presente com os
seus dons na alma que recebeu a Graça santificante; portanto, já desde o
Baptismo actuam no interior do cristão.
É conveniente assinalar, e sublinhar de novo, que essa
actuação divina não impede que o homem actue livremente e em modo estrictamente
humano por meio da inteligência, da memória e da vontade, potências a que
também os dons se referem.
Se podemos resumir numa imagem esta acção do Espírito
Santo, diríamos que torna possível que o enxerto divino na alma do cristão dê
frutos de Fé, de Esperança e de Caridade nas suas actuações exteriores.
Como a água de um rio que faz surgir nas margens, e segundo
as terras que encontra no seu caminho, plantas, diferentes árvores, assim a
Graça, ao enxertar-se do núcleo essencial do ser humano, torna possível que o
homem fique «enxertado” em Cristo.
E, ao mesmo tempo, ilumina a inteligência com a Fé, a
memória, com a Esperança, e a vontade, coma Caridade, e origina que as
faculdades do homem sejam movidas pela acção da Sabedoria, da Ciência, de todos
os Dons do Espírito Santo.
De facto, quando considerámos os sacramentos do
Baptismo, da Confirmação, da Eucaristia, incluímo-los sob a denominação comum
de «sacramentos de iniciação cristã”, já assinalámos que, desde esse momento,
toda a «vida de Cristo” actua no cristão; e a vida d Cristo é a vida da
Santíssima Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo.
No momento de explicar o desenvolvimento da vida cristã
no homem, costuma-se distinguir entre Virtudes e Dons, sublinhando a maior
importância da acção humana – esforço, perseverança, vontade, numa palavra –
nas Virtudes como hábitos no actuar; e a gratuidade dos Dons, infundidos
directamente por Deus na alma e, sob cuja acção, o homem é levado a actuar.
Na realidade, e ao ser a Graça «participação da
natureza divina”, ou seja, «uma nova vida” que torna possível ao homem ser
«nova criatura em Cristo”, o ser humano cristão vive já desde o princípio com a
ajuda dos Dons do Espírito Santo.
O Pai, o Filho e o Espírito Santo actuam na sua pessoa,
e com a pessoa, do crente.
É teoria comum dos autores que essas virtudes infusas
da Fé, da Esperança e da Caridade capacitam o ser humano para os actos
ordinários da ascese e da luta cristã, que estudarmos na segunda parte, e que
os Dons facilitam forças ao cristão para levara cabo actos extraordinários e
heroicos.
Depois de tudo que já vimos, sem em absoluto negar a
validade que possa ter essa arreigada visão, parece-me mais acertado não fazer
esse tipo de distinções; também para facilitar a compreensão do engendrar-se no
homem e o desenvolver-se da «única vida cristã”.
Por esse motivo, pode dizer-se que não está longe da
realidade considerar que o trabalho da Graça santificante na conversão do homem
e no desenvolvimento da «nova criatura” tem uma única origem, um mesmo
princípio e nunca se dá actuações do cristão que se possa aplicar
exclusivamente à acção das virtudes ou ao impulso dos Dons.
Na realidade, repetimo-lo, é a «vida divina no homem”,
na totalidade da participação pessoal do baptizado, o que torna possível a
existência da «nova criatura”.
Dons e Virtudes actuam com juntamente e na pessoa do
crente. As Virtudes não são possíveis sem os Dons; e também são fruto da acção
do Espírito Santo na natureza humana.
Dons e Virtudes enxertam-se na alma em graça, e no
enxertar-se originam a acção, em união com o esforço e a liberdade do crente.
Esta concomitância não constitui obstáculo para que, em
muitas ocasiões, seja possível e até lógico sublinhar a maior influência de um
dom ou de uma virtude determinada, numa acção do cristão.
A vida cristã, logo, é «a vida da carne, vivida na fé
do Filho de Deus”, e esta fé só é possível desenvolvê-la nos Dons do Espírito
Santo.
Num acto de fé, por exemplo, além da virtude da fé pode
apreciar-se a luz dos dons de sabedoria e de inteligência.
Num acto de martírio, a acção da virtude da esperança
está impregnada, entre outros, pela seiva dos dons de fortaleza e piedade.
Deus ao criar Adão e doar-lhe o espírito, a vida do
espírito, deu consistência ao actuar do homem, fazendo correr a vida por e em
todas as suas faculdades.
Em certa analogia com essa primeira criação, ao
doar-lhe a Graça, leva o homem a actuar enxertado em Cristo, na unicidade da
sua pessoa, e a sua acção manifesta-se na sua inteligência com a Fé, na memória
com a Esperança, na vontade com a Caridade, que dão sentido humano ao seu
actuar como criatura.
A pessoa humana, enxertada na Graça, actua com
capacidades, objectivos, dimensões e horizontes humanos e divinos.
Ou melhor, com um horizonte que, sendo humano, é
divino; e é divino sem nunca deixar de ser humano.
Para
desenvolver brevemente estas afirmações, consideramos agora sucintamente os
Dons, a missão particular de cada um na constituição da «nova criatura em
Cristo”, segundo a tradição espiritual da Igreja.
Esclarecemos,
todavia, que a acção da Graça no espírito humano, os canais pelos quais se
encaminha e a unidade que tende a configurar entre Deus e o homem, e o homem e
Deus, jamais chegam a ser plenamente compreensíveis para o entendimento humano,
que não tem capacidade para elaborar conceitos de todas essas realidades.
O
mistério iniciado por Deus na criação, e continuado na santificação do homem, é
tão insondável para o homem como o é o mistério do amor de Deus.
(cont)
ernesto juliá, La belleza de ser cristiano, trad. ama)
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