25/04/2015

Evangelho, comentário L. Espiritual (A beleza de ser cristão)


Semana III da Páscoa


São Marcos – Evangelista

Evangelho: Mc 16 15-20

15 E disse-lhes: «Ide por todo o mundo, e pregai o Evangelho a toda a criatura. 16 Quem crer e for baptizado, será salvo; mas quem não crer, será condenado. 17 Eis os milagres que acompanharão os que crerem: Expulsarão os demónios em Meu nome, falarão novas línguas, 18 pegarão em serpentes e, se beberem alguma coisa mortífera, não lhes fará mal; imporão as mãos sobre os doentes, e serão curados». 19 O Senhor, depois de assim lhes ter falado, elevou-Se ao céu e foi sentar-Se à direita do Pai. 20 Eles, tendo partido, pregaram por toda a parte, cooperando com eles o Senhor e confirmando a palavra com os milagres que a acompanhavam.

Comentário:

Em muitas das chamadas “igrejas” que proliferam um pouco por toda a parte, uma das práticas correntes para atrair e fidelizar prosélitos é precisamente o recurso a esses “milagres” que o Senhor promete aos que O seguem e levam a Sua Palavra aos outros.
Como se sabe, tais “milagres” não passam de mistificações mais ou menos grosseiras porque ninguém tem esse poder senão aqueles a quem o Senhor o concede.

Os milagres são feitos por Jesus Cristo que se serve dos homens por Si escolhidos como instrumentos para os realizar.

Não é possível, pois, operar milagres sejam quais forem, em proveito próprio e, muito menos, se O Senhor está ausente ou é abusivamente evocado seja por 
quem for.

(ama, comentário sobre Mc 16, 15-18, 2013.04.25)

Leitura espiritual

a beleza de ser cristão

PRIMEIRA PARTE

O QUE É SER CRISTÃO?

I.            Relações que Deus estabelece com o homem.

…/11

No Baptismo somos libertados do pecado e convertidos em novas criaturas: filhos de Deus em Cristo, na Igreja.

Na Confirmação recebemos «uma infusão especial” do Espírito que desenvolve em nós o ser «imagem e semelhança de Deus” e o ser «filhos no Filho”.

Se este é o «ser” da «nova criatura” do cristão, temos de perguntar-nos como há-de actuar para saber que se converteu verdadeiramente em «nova criatura”.

Jesus Cristo manifesta no seu existir a nova realidade existencial humana do Filho de Deus.
O homem que se constitui em «nova criatura” e quer viver como tal; o que fará para alcançá-lo? Não se trata de levar a cabo uma imitação externa dos gestos, das palavras, das acções de Jesus Cristo.
O cristão há-de viver a mesma «realidade existencial” de Cristo; e isto tem lugar pela «sua participação na natureza divina”.

É a vida da Graça que estudaremos no próximo capítulo. Baste-nos agora sublinhar a profundidade da mudança que se opera no cristão, e que se pode compreender melhor meditando o «Por Cristo, com Cristo, em Cristo”, e pela acção do Espírito Santo no nosso «eu”.
Ao saber-se libertado e perdoado do pecado, partícipe da natureza divina e com capacidade para descobrir o Amor de Deus em Jesus Cristo, o homem, o cristão necessita também de descobrir o modo de viver a recomendação do mesmo Senhor: «Se me amais, guardareis os meus mandamentos”.[i]

Cristo, na sua realidade de Filho de Deus feito homem, nascido de mulher, é verdadeiramente o nosso modelo, e dá-nos o exemplo do caminhar para o Pai. A sua afirmação de «quem me vê a mim vê o Pai” [ii] é verídica em toda a plenitude.

Cristo não é um espelho no qual o Pai se reflecte; nem a sombra da realidade de Deus, Cristo, sendo o Filho de Deus, é a «imagem de Deus invisível” [iii] feito homem, e portanto, perfeito Deus e perfeito homem, e só sendo Deus pode afirmar de si próprio que é «o Caminho, a Verdade e a Vida”.[iv]

Jesus Cristo sublinhou de modo muito particular que é o nosso exemplo em três recomendações aos seus discípulos e, neles, a todos o crentes, a todos os homens: «Este é o meu preceito: que vos ameis uns aos outros como eu vos amei”;[v] e «Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração, e achareis descanso para as vossas almas, poi o meu jugo é suave e a minha carga é leve”,[vi] e o esclarecimento que faz sobre a sua vinda à terra, que manifesta a disposição radical da «nova criatura” ante Deus e ante o mundo: «Não vim para ser servido, mas para servir; e dar a minha vida em redenção de muitos”.[vii]

A Cristo, «nova criatura”, descobrimo-lo também com matizes novos no quarto motivo da Encarnação:

4) O Verbo encarnou-se para que assim nós conhecêssemos o amor de Deus: «Nisto se manifestou o amor que Deus nos tem: em que Deus enviou ao mundo o seu Filho único para que vivamos por meio dele”.[viii]

O pecado de Adão teve a sua origem na desconfiança de Adão para com Deus. E Adão perseverou na desconfiança, querendo ocultar-se ao olhar de Deus, depois do pecado.
Com a Encarnação, e no modo em que teve lugar, Deus manifesta que essa desconfiança do homem em nada modificou os seus planos sobre a única criatura a quem Deus «ama por si mesma”, o homem.

A Encarnação de Cristo anula a desconfiança na sua própria raiz e, com a desconfiança, o falso temor de Deus que leva o homem a desobedecer.
É a prova que o homem melhor pode entender do amor de Deus Pai, Filho e Espírito Santo para com ele.
E, com a Encarnação, a vida inteira, morte e ressurreição de Cristo é a expressão mais misteriosa, e inesgotável de significado, do amor de Deus às suas criaturas os homens.

Todo o viver de Cristo na terra, o seu nascimento e a sua morte; as tentações no deserto e a agonia no Horto das oliveiras; as curas de doentes e endemoninhados; os diálogos com fariseus, publicanos, sacerdotes, pecadores, etc., escondem a manifestação plena de Amor que Deus Pai expressa ao mundo, ao homem: «Porque tanto amou Deus o homem, que deu o seu Filho único, para que todo o que acredite nele não pereça, mas tenha a vida eterna”.[ix]

Jesus Cristo morreu na Cruz, não porque a Crucifixão fosse necessária para a Redenção; mas para nos manifestar o Amor do Pai:

 «Ninguém tem amor maior que este de dar a vida pelos seus amigos”.[x]

Ao dar-nos desta forma a conhecer todo o seu Amor, Deus anseia que o homem recupere plenamente a confiança nele e volte de novo a viver a alegria de «obedecer” a Deus Pai, que só deseja sustentar a nossa alegria, o nosso gozo, em lhe «obedecer”.
Porque só assim será possível que o homem aceite livremente a realidade da «nova criatura” que nasce nele pela graça, «participação da natureza divina”, e se decida a seguir os passos de Cristo.

Também agora é importante sublinhar que qualquer tentativa de «reduzir existencialmente Cristo” e negar-lhe a sua condição de «Filho de Deus feito homem” tornaria impossível a manifestação tão clara e plena do amor divino: como poderia Jesus Cristo ter-nos dado a conhecer o Amor de Deus Pai, dando a sua vida por nós, se não estivesse em condições de afirmar a com plenitude de verdade ao anunciar a vinda do Espírito Santo: «Naquele dia conhecereis que eu estou no meu Pai e, vós em mim e eu em vós…; o que me ama a mim será amado por meu Pai e eu o amarei e me manifestarei a ele”?[xi] Tampouco poderia ter-nos convidado a acreditar nele, dizendo-nos que «o Pai está em mim e eu no Pai”.[xii]

VII. a graça

Vimos como Deus Pai, depois do pecado de Adão e Eva, que levava consigo a rejeição por parte do homem da sua condição de criatura, a «imagem e semelhança de Deus”, estabelece e enriquece a ordem da criação com a obra de Jesus Cristo, Filho de Deus feito homem.

Restabelece e eleva a criação, abrindo o segundo vínculo, a segunda relação de Deus com os homens: a Redenção.
Primeiro perdoa-nos o pecado, porque o perdoar o pecado na alma do homem é também um passo prévio da vinda de Deus, Pai, Filho e Espírito Santo, a cada ser humano, a dada pessoa, meta e cume da Redenção.

A afirmação de Cristo: «viremos a ele e faremos nele morada”[xiii]) supõe, por sua vez, o cumprimento das palavras de Cristo: «Vim para que tenham vida e a tenham em abundância”.[xiv]

Esta transmissão da vida divina no ser humano é a «segunda criação” do homem, que considerámos ao falar do segundo motivo da Encarnação do Filho de Deus: «fazer-nos partícipes da natureza divina” [xv]

A «participação” comporta a introdução do ser humano na vida eterna de Deus, convertendo a sua realidade de criatura a «imagem e semelhança” na nova realidade de «filho de Deus”, para a qual foi criado; e, ao mesmo tempo, é o cumprimento da espera de Deus para voltar a tomar posse do que, desde a origem, lhe pertence.

Essa «certa participação na natureza divina” é a inefável e misteriosa realidade a que chamamos «Graça”, que recebemos nos sacramentos, «sinais sensíveis e eficazes da graça, instituídos por Jesus Cristo para santificar as nossas almas”.

Para uma melhor compreensão do que se segue, recolhemos algumas definições do Catecismo:

«A graça de Cristo é o dom gratuito que Deus nos faz da sua vida infundida pelo Espírito Santo na nossa alma para a curar do pecado e santificá-la: é a graça santificante ou divinizadora, recebida no Baptismo. É em nós a fonte da obra da santificação: ‘Portanto, o que está em Cristo é uma nova criação: passou o velho, tudo é novo’”)[xvi].

«A graça santificante é um dom habitual, uma disposição estável e sobrenatural que aperfeiçoa a alma para a tornar capaz de viver com Deus, de actuar por seu amor: Deve distinguir-se entre a graça habitual, disposição permanente para viver e actuar segundo a vocação divina e as graças actuais, que designam as intervenções divinas que estão na origem da conversão ou no curso da obra da santificação”.[xvii]

Graças sacramentais: entre elas estão os «carismas” [xviii] que estão ordenados ao serviço da caridade, que edifica a Igreja; e as graças de estado, que acompanham o exercício das responsabilidades da vida cristã.[xix]

Como podemos apreciar, os diferentes adjectivos da Graça, mais que reflectir realidades diferentes – a Graça é sempre «certa participação na natureza divina” -, ajudam-nos a compreender os diferentes modos de tronar-se eficaz essa «participação”, nas variadas circunstâncias da nossa vida; e o modo de incidir na acção do cristão, sempre com a perspectiva do sentido total da sua vida: a união como «filho de Deus em Cristo”“, de ser «outro Cristo”, de ser o «próprio Cristo”.

Com estas premissas, sempre que fizermos referência à «graça de Cristo”, a «graça divinizadora”, empregaremos a palavra Graça, com maiúscula.

(cont)

ernesto juliá, La belleza de ser cristiano, trad. ama)






[i] Jo 14, 15
[ii] Jo 14, 9
[iii] Col 1, 15
[iv] Jo 14, 6
[v] Jo 15, 12
[vi] Mt 11, 29-30
[vii] Mc 10, 45
[viii] 1 Jo 4, 9
[ix] Jo 3, 16
[x] Jo 15, 13
[xi] Jo 14, 20-21
[xii] Jo 10, 38
[xiii] Jo 14, 23
[xiv] Jo 10, 10
[xv] Cfr. Págs, 48-49.
[xvi] Catecismo n. 1999
[xvii] Catecismo n. 2000
[xviii] Catecismo n. 2003
[xix] Catecismo n. 2004

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