05/01/2015

Tratado do verbo encarnado 81

Questão 11: Da ciência inata ou infusa da alma de Cristo

Art. 6 — Se a alma de Cristo só tinha um hábito de ciência.

O sexto discute-se assim. — Parece que a alma de Cristo tinha só um hábito de ciência.

1. — Pois, quanto mais a ciência é perfeita tanto mais una é, por isso os anjos superiores conhecem mediante formas mais universais, como se disse na Primeira Parte. Ora, a ciência de Cristo era perfeitíssima. Logo, una por excelência. Portanto não se distinguia por muitos hábitos.

2. Demais. — A nossa fé deriva da ciência de Cristo, como diz o Apóstolo: Pondo os olhos no autor e consumador da fé, Jesus. Ora, há um só hábito da fé para todas as coisas que ela faz crer, como se disse na Segunda Parte. Logo, com maior razão, Cristo só tinha um hábito da ciência.

3. Demais. — As ciências distinguem-se pela diversidade formal dos seus objectos, Ora, a alma de Cristo sabia tudo por uma só razão formal - o lume infuso por Deus. Logo, em Cristo só havia um hábito de ciência.

Mas, em contrário, a Escritura diz que, sobre uma pedra única, isto é, Cristo, estão sete olhos. E por olhos se entende a ciência. Logo em Cristo havia muitos hábitos de ciência.

Como se disse, a ciência infusa na alma de Cristo assumia um modo conatural à alma humana. Ora, é conatural à alma humana receber as espécies em menor universalidade que o anjo, de modo que conheça diversas naturezas específicas mediante diversas espécies inteligíveis. Donde vem que há em nós diversos hábitos de ciência, por haver diversos géneros de cognoscíveis, isto é, enquanto tudo o que está compreendido num mesmo género é conhecido pelo mesmo hábito de ciência, assim, como diz Aristóteles, a ciência é una quando pertence ao mesmo género do sujeito. Logo, a ciência infusa da alma de Cristo distinguia-se conforme a diversidade dos hábitos

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Como se disse, a ciência da alma de Cristo é perfeitíssima e excede a ciência dos anjos, se considerarmos nele o que procede da influência de Deus, mas é inferior à ciência angélica quanto ao modo do sujeito recipiente. E é fundada nesse modo que a sua ciência se distingue por muitos hábitos, como existindo por espécies mais particulares.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A nossa fé baseia-se na Verdade primeira. Donde, Cristo é o autor da nossa fé, pela sua ciência divina, una, absolutamente falando.

RESPOSTA À TERCEIRA. — O lume infuso da divindade é a razão comum de inteligir o que é revelado por Deus, assim como o lume do intelecto, o de inteligir o que conhecemos naturalmente. Donde, é necessário atribuir à alma de Cristo espécies próprias das coisas particulares, para que conhecesse cada uma delas por um conhecimento próprio. E, assim sendo, era necessário que a alma de Cristo tivesse diversos hábitos de ciência, como se disse.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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