Epifania
12
Tendo Jesus ouvido dizer que João fora preso, retirou-Se para a Galileia. 13
Depois, deixando Nazaré, foi habitar em Cafarnaum, situada junto do mar, nos
confins de Zabulon e Neftali, 14 cumprindo-se o que tinha sido
anunciado pelo profeta Isaías, quando disse: 15 “Terra de Zabulon e
terra de Neftali, terra que confina com o mar, país além do Jordão, Galileia
dos gentios! 16 Este povo, que jazia nas trevas, viu uma grande luz,
e uma luz levantou-se para os que jaziam na sombra da morte”. 17
Desde então, começou Jesus a pregar: «Fazei penitência porque está próximo o
Reino dos Céus».
23
Jesus percorria toda a Galileia, ensinando nas sinagogas e pregando o Evangelho
do reino de Deus, e curando todas as enfermidades entre o povo. 24 A
Sua fama espalhou-se por toda a Síria, e trouxeram-Lhe todos os que tinham
algum mal, possuídos de vários achaques e dores: possessos, lunáticos,
paralíticos. E Ele curava-os. 25 Seguiam-n'O grandes multidões de povo
da Galileia, da Decápole, de Jerusalém, da Judeia e de além do Jordão.
Comentário:
Jesus
abandona Nazaré a povoação onde passara trinta anos da Sua vida
Não o faz, com certeza, por conveniência mas sim, como de resto mais tarde se confirmará, o grandioso trabalho que vai iniciar, o anúncio da chegada do Reino de Deus, precisa de um ambiente onde não haja preconceitos por parte dos que com Ele conviveram.
Não o faz, com certeza, por conveniência mas sim, como de resto mais tarde se confirmará, o grandioso trabalho que vai iniciar, o anúncio da chegada do Reino de Deus, precisa de um ambiente onde não haja preconceitos por parte dos que com Ele conviveram.
Em Cafarnaum deverá encontrar os
corações bem-dispostos para receberem as Suas palavras, a Sua doutrina.
Ainda poderíamos opinar: onde
encontrar pescadores - a maioria dos futuros Apóstolos - senão à
beira-mar?
(ama, comentário sobre MT 4, 12-17;
23-25, 2014.01.26)
Leitura espiritual
São Josemaria Escrivá
Amigos de Deus 259 a 267
259
Fainas de pesca
Eis
que mandarei muitos pescadores, promete o Senhor, e pescarei esses peixes.
Assim nos indica Deus o nosso grande trabalho: pescar.
Falando
ou escrevendo, às vezes compara-se o mundo com o mar. E há muita verdade nessa
comparação. Na vida humana, tal como no mar, há períodos de calma e períodos de
borrasca, de tranquilidade e de forte ventania. Muitas vezes, os homens nadam
em águas amargas, no meio de grandes vagas; caminham no meio de tormentas;
viajam cheios de tristeza, mesmo quando parece que têm alegria, mesmo quando
falam ruidosamente: gargalhadas que pretendem encobrir o seu desalento, o seu
desgosto, a sua vida sem caridade nem compreensão. E devoram-se uns aos outros,
tanto os homens como os peixes...
É
missão dos filhos de Deus conseguir que todos os homens entrem - com liberdade
- dentro da rede divina, para que se amem. Se somos cristãos, temos de
converter-nos nos pescadores de que fala o profeta Jeremias. Jesus Cristo
também utilizou repetidamente essa metáfora: "Segui-me e Eu vos farei
pescadores de homens", diz a Pedro e a André.
260
Acompanhemos
Jesus nesta pesca divina. Jesus está junto do lago de Genesaré e as pessoas
comprimem-se à sua volta, ansiosas por ouvirem a palavra de Deus. Tal como hoje!
Não estais a ver? Estão desejando ouvir a mensagem de Deus, embora o dissimulem
exteriormente. Talvez alguns se tenham esquecido da doutrina de Cristo; talvez
outros, sem culpa sua, nunca a tenham aprendido e olhem para a religião como
coisa estranha... Mas convencei-vos de uma realidade sempre actual: chega
sempre um momento em que a alma não pode mais; em que não lhe bastam as
explicações vulgares; em que não a satisfazem as mentiras dos falsos profetas.
E, mesmo que nem então o admitam, essas pessoas sentem fome, desejam saciar a
sua inquietação com os ensinamentos do Senhor.
Deixemos
S. Lucas continuar a sua narrativa: E viu duas barcas à beira do lago; e os
pescadores tinham saído e lavavam as redes. Entrando numa das barcas, que era a
de Simão Pedro, pediu-lhe que se afastasse um pouco da terra. E sentando-se
dentro, ensinava o povo. Quando acabou a sua catequese, ordenou a Simão: Faz-te
mais ao largo e lançai as vossas redes para pescar; é Cristo o dono da barca; é
Ele quem prepara a faina. Para isso é que veio ao mundo: para tratar de que os
seus irmãos descubram o caminho da glória e do amor ao Pai. Não fomos nós,
portanto, quem inventou o apostolado cristão. Nós, os homens, só o
dificultamos, com a nossa rudeza, com a nossa falta de fé.
261
Replicou-lhe
Simão: Mestre, trabalhámos durante toda a noite e não apanhámos nada. A
resposta de Simão parece razoável. Costumavam pescar de noite, e precisamente
aquela noite tinha sido infrutífera. Para que haviam de pescar de dia? Mas
Pedro tem fé: Porém, sobre a tua palavra, lançarei a rede. Resolve proceder
como Cristo lhe sugeriu; compromete-se a trabalhar, fiado na Palavra do Senhor.
E que acontece? Tendo feito isto, apanharam tão grande quantidade de peixes,
que a sua rede se rompia. Então fizeram sinal aos companheiros que estavam na
outra barca, para que os viessem ajudar. Vieram e encheram tanto ambas as
barcas, que quase se afundavam.
Ao
sair para o mar com os discípulos, Jesus não pensava só nesta pesca. E por
isso, quando Pedro se lança aos seus pés e confessa com humildade: Afasta-te de
mim, Senhor, porque sou um homem pecador, Nosso Senhor respondeu-lhe: Não
temas. De hoje em diante serás pescador de homens. E nessa nova pesca também
não faltará a eficácia divina, pois, apesar das suas misérias pessoais, os
Apóstolos serão instrumentos de grandes prodígios
262
Os milagres repetem-se
Atrevo-me
a assegurar que também o Senhor fará de nós instrumentos capazes de realizar
milagres e até, se for preciso, dos mais extraordinários, se lutarmos
diariamente por alcançar a santidade, cada um dentro do seu estado, no meio do
mundo, no exercício da sua profissão, na vida normal e corrente. Daremos luz
aos cegos... Quem não poderia contar mil casos de cegos, quase de nascença, que
recobraram a vista, recebendo todo o esplendor da luz de Cristo? E de outros
que eram surdos, e outros mudos, que não podiam ouvir ou articular uma palavra
como filhos de Deus... E que purificaram os seus sentidos, e já ouvem, e já se
exprimem como homens, não como animais!... In nomine Iesu!, em nome de Jesus,
os seus Apóstolos dão agilidade àquele aleijado, que era incapaz de uma acção
útil... E àquele outro, um poltrão, que conhecia as suas obrigações mas não as
cumpria... - Em nome do Senhor, surge et ambula!; levanta-te e caminha! E um
outro, já morto, apodrecido, que tresandava a cadáver, também ouviu a voz de
Deus, como no milagre do filho da viúva de Naim - Rapaz, eu te ordeno:
levanta-te! Faremos milagres como os de Cristo, milagres como os dos primeiros
Apóstolos... Talvez esses prodígios se tenham dado contigo mesmo, ou comigo...
Talvez fôssemos cegos, ou surdos, ou estropiados, ou cheirássemos a cadáver, e
a palavra do Senhor nos tivesse levantado da nossa prostração... Pois bem: se
amamos Cristo, se o seguimos com sinceridade, se não nos procuramos a nós
mesmos mas tão só a Ele, em seu nome poderemos transmitir a outros de graça, o
que de graça nos foi concedido.
263
Tenho
pregado constantemente sobre esta possibilidade sobrenatural e humana que Deus,
nosso Pai, pôs nas mãos dos seus filhos: a de participar na Redenção operada
por Cristo. E enche-me de alegria encontrar esta mesma doutrina nos textos dos
Padres da Igreja. S. Gregório Magno explica: Os cristãos tiram as serpentes,
quando arrancam o mal do coração dos outros com a exortação ao bem... A
imposição das mãos sobre os enfermos ocorre quando se vê que o próximo
enfraquece na prática do bem e se lhe oferece ajuda de mil maneiras,
robustecendo-o com a força do exemplo. Estes milagres são tanto maiores quanto
se passam no campo espiritual, dando vida, não aos corpos, mas às almas. Também
vós, se não vos desleixardes, podereis operar estes prodígios com a ajuda de
Deus.
Deus
quer que todos se salvem. Isto é um convite e uma responsabilidade que pesam
sobre cada um de nós. A Igreja não é um reduto de privilegiados. A grande
Igreja será porventura uma exígua parte da Terra? A grande Igreja é o mundo
inteiro. Assim escrevia Santo Agostinho, acrescentando: Aonde quer que te
dirijas, aí está Cristo. Tens por herança os confins da Terra. Vem! Toma posse
dela toda comigo.
Recordais
como estavam as redes? Carregadas, a transbordar. Não cabiam mais peixes. Deus
espera ardentemente que se encha a sua casa. É Pai e gosta de viver com todos
os filhos à sua volta.
264
Apostolado na vida
corrente
Vejamos
agora aquela outra pesca que se deu depois da Paixão e Morte de Jesus Cristo.
Pedro negou três vezes o Mestre e chorou de pena humildemente. O galo, com o
seu canto, recordou-lhe as advertências do Senhor e ele pediu perdão do fundo
da alma. Enquanto espera, contrito, na promessa da Ressurreição, exerce o seu
ofício e vai pescar. A propósito desta pesca, pergunta-se com frequência por
que é que Pedro e os filhos de Zebedeu voltaram à ocupação que tinham antes de
o Senhor os chamar. Efectivamente eram pescadores quando o Senhor lhes disse:
Segui-me e Eu vos farei pescadores de homens. Aos que se surpreendem com esta
conduta deve-se responder que não estava proibido aos Apóstolos exercer a sua
profissão, visto que se tratava de coisa legítima e honesta.
O
apostolado, essa ânsia que vibra no íntimo do cristão, não é coisa separada da
vida de todos os dias; confunde-se com o próprio trabalho, convertido em
ocasião de encontro pessoal com Cristo. Nesse trabalho, ombro a ombro com os
nossos colegas, com os nossos amigos, com os nossos parentes, lutando pelos
mesmos interesses, podemos ajudá-los a chegar a Cristo, que nos espera na
margem do lago... Antes de ser apóstolo, pescador. Também, pescador depois de
ser apóstolo. Antes e depois, a mesma profissão.
265
Que
mudança há então? Há mudança na alma, porque nela entrou Cristo, tal como
entrou na barca de Pedro. Abrem-se amplos horizontes, maior ambição de servir e
um desejo irreprimível de anunciar a todas as criaturas as magnalia Dei, as
coisas maravilhosas que o Senhor faz, se lho permitimos. Aqui não posso deixar
de recordar que o trabalho, digamos profissional dos sacerdotes é um ministério
divino e público, que abarca exigentemente toda a sua vida. Pode-se dizer até,
de um modo geral, que se a um sacerdote lhe sobra tempo para trabalhos que não
sejam propriamente sacerdotais, é certo que não cumpre os deveres do seu
ministério.
Estavam
juntos Simão Pedro, Tomé, chamado Dídimo, Natanael, que era de Caná da
Galileia, os filhos de Zebedeu, e outros dois dos seus discípulos. Disse-lhes
Simão Pedro: Vou pescar. Responderam-lhe: Também nós vamos contigo. Foram,
pois, e entraram numa barca. Naquela noite nada apanharam. Chegada a manhã,
Jesus apresentou-se na praia.
Passa
ao lado dos seus Apóstolos, junto daquelas almas que se lhe entregaram... E
eles não se dão conta disso! Quantas vezes está Cristo, não perto de nós, mas
dentro de nós, e temos uma vida tão humana! Cristo está ao nosso lado e não recebe
um olhar de carinho, uma palavra de amor, uma obra de serviço por parte dos
seus filhos!
266
Os
discípulos, todavia - escreve S. João - não sabiam que era Jesus. Disse-lhes,
pois, Jesus: Moços, tendes alguma coisa de comer? Esta cena tão familiar de
Cristo, a mim, enche-me de alegria. Que diga isto Jesus Cristo, Deus! Ele, que
já tem corpo glorioso! Lançai a rede para o lado direito da barca e
encontrareis. Lançaram a rede e já não a podiam tirar por causa da grande
quantidade de peixes. Agora compreendem. Recordam o que tinham ouvido tantas
vezes dos lábios do Mestre: pescadores de homens, apóstolos!... E compreendem
que tudo é possível, porque é Ele quem dirige a pesca.
Então
aquele discípulo que Jesus amava disse a Pedro: É o Senhor! O amor vê. E de
longe. O amor é o primeiro a captar aquela delicadeza. O Apóstolo adolescente,
com o firme carinho que sentia por Jesus, pois amava Cristo com toda a pureza e
toda a ternura de um coração que nunca se corrompera, exclamou: É o Senhor!
Simão
Pedro, mal ouviu dizer que era o Senhor, cingiu a túnica e lançou-se ao mar.
Pedro é a fé. E lança-se ao mar, com uma audácia maravilhosa. Com o amor de
João e a fé de Pedro, aonde podemos nós chegar!?
267
As almas são de Deus
Os
outros discípulos foram com a barca, porque não estavam distantes de terra,
senão duzentos côvados, tirando a rede cheia de peixes. Em seguida põem a pesca
aos pés do Senhor, porque é sua, para que aprendamos que as almas são de Deus,
que ninguém nesta terra pode atribuir a si mesmo essa propriedade, que o
apostolado da Igreja - a palavra e a realidade da salvação - não se baseia no
prestígio de algumas pessoas, mas na graça divina.
Jesus
Cristo interroga Pedro por três vezes, como se lhe quisesse dar a oportunidade
de reparar a sua tripla negação. Pedro já aprendeu, escarmentado com a sua
própria miséria: está profundamente convencido de que são inúteis aqueles seus
alardes temerários; tem consciência da sua debilidade. Por isso, põe tudo nas
mãos de Cristo: Senhor, tu sabes que eu te amo... Senhor, tu sabes tudo, tu
sabes que eu te amo. E que responde Cristo? Apascenta os meus cordeiros;
apascenta as minhas ovelhas. Não as tuas, não as vossas; as minhas! Porque foi
Ele quem criou o homem, Ele quem o redimiu, Ele quem comprou cada alma, uma a
uma, repito, com o preço do seu Sangue.
Quando
os donatistas, no século V, lançavam os seus ataques contra os católicos,
diziam ser impossível que o bispo de Hipona, Agostinho, professasse a verdade,
porque tinha sido um grande pecador. E Santo Agostinho sugeria aos seus irmãos
na fé como haviam de replicar: Agostinho é bispo na Igreja Católica. Ele leva a
carga, de que há-de dar contas a Deus. Conheci-o entre os bons. Se é mau, ele o
sabe; se é bom, nem por isso deposito nele a minha esperança. Porque a primeira
coisa que aprendi na Igreja Católica foi a não pôr a minha esperança num homem.
Não
fazemos o nosso apostolado. Então, como havemos de dizer? Fazemos - porque Deus
o quer, porque assim no-lo mandou: ide por todo o mundo e pregai o Evangelho -
o apostolado de Cristo. Os erros são nossos; os frutos, do Senhor.
(cont)
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