Art.
4 — Se Cristo tinha alguma ciência experimental adquirida.
O quarto discute-se assim. — Parece
que Cristo não tinha nenhuma ciência experimental adquirida.
1 — Pois, tudo o conveniente a Cristo
ele tinha excelentissimamente. Ora, Cristo não tinha uma ciência adquirida
excelentíssima, pois, não se aplicou ao estudo das letras pelo qual se adquire
perfeitissimamente a ciência. Assim, refere o Evangelho: E admiravam-se os
Judeus dizendo — Como sabe este, letras, não as tendo estudado? Logo, parece
que Cristo não tinha nenhuma ciência adquirida.
2 Demais. — Ao completo nada se lhe
pode acrescentar. Ora, a potência da alma de Cristo ficou completada pelas
espécies inteligíveis infundidas por Deus, como se disse. Logo, não se lhe
podiam acrescentar à alma quaisquer espécies adquiridas.
Demais. — Quem já possui o hábito da
ciência não adquire novos hábitos pelo que conhece por meio dos sentidos,
porque então nele coexistiriam duas formas da mesma espécie, mas, o hábito que
havia antes é confirmado e aumentado. Logo, como Cristo tinha o hábito da
ciência infusa, parece que, pelo que percebia pelos sentidos, não adquiriu
nenhuma outra ciência.
Mas, em contrário, o Apóstolo: Sendo
Filho de Deus, aprendeu a obediência pelas coisas que padeceu, isto é, que
experimentou, comenta a Glosa. Logo, Cristo teve uma ciência experimental, que
é a ciência adquirida.
Como do sobredito resulta,
nada do que Deus infundiu na nossa natureza faltou à natureza humana assumida
pelo Verbo de Deus. Ora, é manifesto que em a natureza humana Deus não somente
infundiu o intelecto possível, mas também o intelecto agente. Donde
necessariamente se conclui, que a alma de Cristo não somente tinha o intelecto
possível, mas também o agente. Se pois, nos outros seres, Deus e a natureza não
fizeram nada em vão, como diz o Filósofo, com muito maior razão nada fez de vão
na alma de Cristo. Ora, é vão o que não tem uma operação própria, no dizer de
Aristóteles, pois, todo ser é feito para as suas operações, como também ele o
diz. Ora, a operação própria do intelecto agente é tornar as espécies inteligíveis
em acto, abstraindo-as dos fantasmas, donde o dizer-se que o intelecto agente é
o que tem o poder de fazer todas as coisas. Donde é necessário concluir-se que
em Cristo havia certas espécies inteligíveis, pela acção do intelecto agente
recebidos no seu intelecto possível. O que é ele ter tido uma ciência adquirida,
a que alguns chamam experimental.
Portanto, embora noutro lugar tivesse
escrito diferentemente, devemos dizer que Cristo teve uma ciência adquirida. A
qual é propriamente uma ciência ao modo humano, não só por parte do sujeito
recipiente, mas ainda pelo lado da causa agente. Pois, atribuímos a Cristo essa
ciência segundo o lume do intelecto agente, conatural à alma humana. Ao passo
que a ciência infusa lhe é atribuída segundo o lume infuso do alto, e esse modo
de conhecer é proporcionado à natureza angélica. Mas a ciência da bem-aventurança,
pela qual é vista a própria essência mema de Deus, é própria e conatural só a
Deus, como dissemos na Primeira Parte.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— Há dois modos de se adquirir a ciência: a invenção e a disciplina. A invenção
é o modo principal, o pela disciplina é secundário. Donde o dizer Aristóteles:
Ultimo é o que sabe tudo por si mesmo, bom, porém, quem aproveita tudo que lhe
ensinam. Por isso, a Cristo antes cabia ter a ciência adquirida pela invenção
do que pela disciplina, sobretudo porque Deus o ia dar a todos como Doutor,
segundo a Escritura: Alegrai-vos no Senhor vosso Deus, porque ele vos deu um
doutor que ensinará a justiça.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A inteligência é
capaz de uma dupla contemplação. Uma, do que lhe é superior. E por esta a alma
de Cristo tinha a plenitude que lhe dava a ciência infusa. A outra é do que lhe
é inferior, isto é, dos fantasmas, cuja natureza é mover a inteligência humana
por virtude do intelecto agente. Ora, era necessário, que também por essa
contemplação a alma de Cristo tivesse a plenitude da ciência. Não que a
primeira plenitude não bastasse por si mesma, à inteligência humana, mas porque
lhe era necessária a perfeição também relativamente aos fantasmas.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Uma é a
natureza do hábito adquirido e outra, a do hábito infuso. Assim, o hábito da
ciência adquire-se pela relação da alma humana com os fantasmas, por isso, pelo
mesmo ponto de vista não pode um hábito ser repetidamente adquirido. Mas, o hábito
da ciência infusa tem outra natureza, como descendo de um superior, para a alma
e não segundo uma proporção com os fantasmas. Logo, não há paridade entre um e
outro hábito.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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