Art.
4 — Se em Cristo existia a esperança.
O quarto discute-se assim. — Parece
que em Cristo existia a esperança.
1. — Pois, diz a Escritura, da pessoa
de Cristo, segundo a Glosa: Em ti, Senhor, esperei. Ora, a virtude da esperança
é a pela qual esperamos em Deus. Logo, Cristo teve a virtude da esperança.
2. Demais. — A esperança é a
expectação da bem-aventurança futura, como demonstramos na Segunda Parte. Ora,
Cristo esperava algo de pertinente à bem-aventurança, a saber, a glória do
corpo. Logo, parece que nele houve a esperança.
3. Demais. — Cada qual pode esperar o
que lhe condisser com a perfeição, se for futuro. Ora, havia algo de futuro,
pertinente à perfeição de Cristo, segundo o Apóstolo: Para a consumação dos
santos em ordem à obra do ministério, para edificar o corpo de Cristo. Logo,
parece que cabia a Cristo ter esperança.
Mas, em contrário, o Apóstolo: O que
qualquer vê como o espera? Donde é claro que, como a fé tem por objecto o que
não vemos, assim, também a esperança. Ora, não havia fé em Cristo, como se
disse. Logo, nem esperança.
Assim como é da essência da
fé o assentirmos no que não vemos, assim, é da essência da esperança termos a
expectação do que ainda não possuímos. E assim como a fé, enquanto virtude
teologal, não tem por objecto qualquer ser não visto, mas só Deus, assim também
a esperança, enquanto virtude teologal tem por objecto a própria fruição de
Deus, o que principalmente temos em vista pela virtude da esperança. Mas, por
consequência, quem possui a virtude da esperança pode também esperar o auxílio
divino em outras matérias, assim como quem tem a virtude da fé não somente crê em
Deus, em se tratando das coisas divinas, mas de tudo o mais que lhe tenha sido
divinamente revelado. Ora, Cristo, desde o momento da sua concepção, teve a
plena fruição divina, como a seguir demonstraremos. E portanto, não teve a
virtude da esperança. Mas tinha a esperança relativamente a certas coisas que
ainda não havia alcançado, embora não tivesse a fé relativamente a quaisquer coisas.
Pois, embora conhecesse todas as coisas, o que dele totalmente excluía a fé,
contudo, ainda não tinha plenamente tudo quanto lhe pertencia à perfeição, por
exemplo a imortalidade e a glória do corpo, que podia esperar.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— O lugar aduzido não se aplica a Cristo, quanto à esperança, como virtude
teologal, mas porque esperava algumas coisas que ainda não tinha, como se
disse.
RESPOSTA À SEGUNDA. — A glória do
corpo não pertence à bem-aventurança como o que ela principalmente consiste,
mas, por uma certa redundância da glória da alma, como se disse na Segunda Parte.
Donde, a esperança, enquanto virtude teologal, não respeita à bem-aventurança do
corpo, mas à da alma, que consiste na fruição divina.
RESPOSTA À TERCEIRA. — A edificação da
Igreja, pela conversão dos fiéis, não pertence à perfeição de Cristo, enquanto
perfeito em si mesmo, mas enquanto leva os outros a participar da sua
perfeição. E como a esperança propriamente é dita em relação aquilo que quem
espera está na expectativa de possuir, não se pode propriamente dizer que a
virtude da esperança conviesse a Cristo, pela razão aduzida.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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