07/11/2014

Tratado do verbo encarnado 22

Questão 3: Da união relativamente à pessoa que assumiu

Art. 5 — Se alguma outra Pessoa divina, que não a Pessoa do Filho, podia ter assumido a natureza humana.

O quinto discute-se assim. — Parece que nenhuma outra Pessoa divina, que não a Pessoa do Filho, podia ter assumido a natureza humana.

1. — Pois, essa assunção tornou Deus o Filho do homem. Ora, seria inconveniente que conviesse ao Pai ou ao Espírito Santo o ser filho, o que redundaria em confusão das Pessoas divinas. Logo, o Pai e o Espírito Santo não poderiam assumir a carne.

2. Demais. — Pela Encarnação divina os homens alcançaram a adopção de filhos, segundo as palavras do Apóstolo. Vós não recebestes o espírito de escravidão para estardes outra vez com temor mas recebestes o espírito de adopção de filhos. Ora, a filiação adoptiva é uma semelhança participada da filiação natural, que não convém nem ao Pai nem ao Espírito Santo. Donde o dizer o Apóstolo: Os que ele conheceu na sua presciência também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho. Logo, parece que nenhuma outra Pessoa podia ter-se encarnado, que não a Pessoa do Filho.

3. Demais. — Diz-se que o Filho foi enviado, e gerado, na sua natividade temporal, como encarnado que foi. Ora, ao Pai não convém o ser enviado, pois é inascível, como se estabeleceu na Primeira Parte. Logo, ao menos a Pessoa do Pai não podia encarnar-se.

Mas, em contrário, tudo o que pode o Filho pode o Pai, do contrário os três não teriam o mesmo poder. Ora, o Filho pode encarnar-se, Logo semelhantemente, o Pai e o Espírito Santo.

Como dissemos, a assunção implica duas coisas: o acto próprio de quem assume e o termo da assunção. Ora, o princípio do acto é a virtude divina, e o termo é a pessoa. Mas, todas as Pessoas têm o poder divino comum e igualmente. E a mesma é a razão comum da personalidade nas três Pessoas, embora as propriedades pessoais sejam diferentes. Ora, sempre que uma virtude existe igualmente em vários sujeitos, pode terminar a sua acção em qualquer deles, tal como se dá com as potências racionais, que podem aplicar-se a coisas opostas, podendo realizar uma ou outra. Donde, a virtude divina podia unir a natureza humana à pessoa do Pai ou à do Espírito Santo, como a uniu à pessoa do Filho. Por isso, concluímos que o Pai ou o Espírito Santo podiam, tão bem como o Filho, assumir a carne.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A filiação temporal em virtude da qual Cristo é chamado Filho do Homem, não lhe constitui a pessoa, como a filiação eterna, mas é uma certa consequência da natividade temporal. Donde se deste modo o nome de filiação se transferisse ao Pai ou ao Espírito Santo, daí não resultaria nenhuma confusão das divinas Pessoas.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A filiação adoptiva é uma certa semelhança participada da filiação natural, mas realiza-se em nós apropriadamente pelo Pai, que é o princípio da filiação natural e pelo dom do Espírito Santo, que é o amor do Pai e do Filho, segundo o Apóstolo: Mandou Deus o Espírito de seu Filho, que chama — Pai, Pai. Donde, assim como pela encarnação do Filho, recebemos a filiação adoptiva, à semelhança da sua filiação natural, assim, se o Pai se tivesse encarnado teríamos recebido dele a filiação adoptiva como do princípio da filiação natural, e do Espírito Santo, como do nexo comum entre o Pai e o Filho.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Ao Pai convém ser inascível, segundo a natividade eterna, o que não excluiria a natividade temporal. Mas, dizemos que o Filho é enviado, segundo a Encarnação como procedente de outro, sem o que a Encarnação não realizaria plenamente a ideia de missão.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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