03/11/2014

Tratado do verbo encarnado 18

Questão 3: Da união relativamente à pessoa que assumiu

Em seguida devemos tratar da união relativamente à pessoa que assumiu.

E nesta questão discutem-se oito artigos:

Art. 1 — Se à Pessoa divina convém assumir a natureza criada.
Art. 2 — Se à natureza divina convém assumir.
Art. 3 — Se, abstraída a personalidade pelo intelecto, a natureza pode assumir.
Art. 4 — Se uma Pessoa pode assumir a natureza criada, sem assumir outra.
Art. 5 — Se alguma outra Pessoa divina, que não a Pessoa do Filho, podia ter assumido a natureza humana.
Art. 6 — Se duas Pessoas divinas poderiam assumir uma natureza numericamente a mesma.
Art. 7 — Se uma mesma Pessoa divina pode assumir duas naturezas humanas.
Art. 8 — Se era mais conveniente ter-se encarnado o Filho de Deus, que o Pai ou o Espírito Santo.

Art. 1 — Se à Pessoa divina convém assumir a natureza criada.

O primeiro discute-se assim. — Parece que não convém a Pessoa divina assumir a natureza criada.

1. — Pois, uma Pessoa divina significa um ser perfeito em sumo grau. Ora, perfeito é aquilo a que não se pode fazer nenhum acréscimo. Mas, sendo assumir o tomar para si. (ad se sumerey), de modo a ficar o assumido acrescentado ao que assume, parece que à Pessoa divina não convém assumir a natureza criada.

2. Demais. — O ser para o qual um outro é assumido comunica-se de certo modo ao primeiro, assim, uma dignidade comunica-se a quem foi a ela elevada. Ora, a pessoa é por natureza incomunicável, como se disse na Primeira Parte. Logo, não convém à Pessoa divina assumir, isto é, tomar para si. (ad se sumere).

3. Demais. — A pessoa é constituída pela natureza. Ora, é inconveniente que o constituído assuma o constituinte, porque o efeito não age sobre a sua causa. Logo, não convém à Pessoa assumir a natureza.

Mas, em contrário, Agostinho diz: Esse Deus, isto é, o Unigénito, recebeu a forma, isto é, a natureza do servo, na sua Pessoa. Ora, o Deus Unigénito é uma Pessoa. Logo, à Pessoa convém receber a natureza, o que é assumi-la.

A palavra assunção implica duas coisas, isto é, o princípio e o termo do acto, pois, assumir é como tomar para si (ad se sumeres). Ora, dessa assunção a Pessoa é o princípio e o termo. O princípio, porque à pessoa propriamente cabe o agir, ora, essa assunção da carne foi feita pela pessoa divina. Semelhantemente, também a Pessoa é o termo dessa assunção, pois, como se disse, a união fez-se na Pessoa, não na natureza. Donde é claro que apropriadamente cabe à Pessoa assumir a natureza.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Sendo a Pessoa divina infinita, não se lhe pode fazer nenhuma adição. Por isso Cirilo diz: Nós não entendemos esse modo de união como uma ???, Assim como na união do homem com Deus, pela graça de adopção, nada se acrescenta a Deus, mas, o divino opõe-se ao homem. Donde não é Deus, mas o homem, quem se aperfeiçoa.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Dizemos que a pessoa é incomunicável, por não poder ser predicada de muitos supostos. Mas, nada impede que da pessoa se façam muitas predicações. Donde, não é contra a essência da pessoa comunicar-se de modo que subsista em várias naturezas. Pois, também na pessoa criada podem acidentalmente concorrer várias naturezas, assim como a pessoa de um determinado homem tem quantidade e qualidade. Mas, por causa da sua infinidade, é próprio da divina Pessoa, que nela exista o concurso das naturezas, não acidentalmente, mas segundo a subsistência.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Como se disse, a natureza humana não constitui a Pessoa divina, absolutamente falando, mas constitui-a enquanto denominada por uma tal natureza. Assim, não é da natureza humana que o Filho de Deus tira a sua existência absoluta, pois já existia abeterno, mas só a sua existência humana. Mas, segundo a natureza divina a Pessoa divina é constituída de modo absoluto. Donde, não dizemos da Pessoa divina que assumiu a natureza divina, mas a humana.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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