Art.
4 — Se a graça está na essência da alma como no sujeito, ou em alguma das duas
potências.
[Sent., dist. XXVI, a. 3, IV, dist,
IV, q. 1, a. 3, qª 3, ad 1, De Verit., q. 27, a. 6].
O quarto discute-se assim. — Parece
que a graça não está na essência da alma, como no sujeito, mas numa das suas
potências.
1. — Pois, diz Agostinho, a graça está
para a vontade, ou para o livre arbítrio, como o cavaleiro para o cavalo. Ora,
à vontade ou livre arbítrio é uma potência, como já dissemos na Primeira Parte
(q. 83, a. 2). Logo, a graça está na potência da alma como no seu sujeito.
2. Demais. — Da graça derivam os
méritos do homem, como diz Agostinho. Ora, o mérito depende do acto procedente
de alguma potência. Logo, a graça é a perfeição de alguma das potências da
alma.
3. Demais. — Se a essência da alma
fosse o sujeito próprio da graça, a alma haveria necessariamente de, na sua
essência, ser capaz da graça. Ora, isto é falso, porque daí resultaria que toda
alma é capaz da graça. Logo, a essência da alma não é o sujeito próprio da
graça.
4. Demais. — A essência da alma é-lhe
anterior às potências. Ora, o anterior é concebível independentemente do
posterior. Donde resulta que podemos conceber a graça, na alma, sem recebermos
nenhuma parte ou potência da alma, e nem à vontade, nem o intelecto, nem
qualquer faculdade. Ora, isto é inadmissível.
Mas, em contrário, regenerados pela
graça, tornamo-nos filhos de Deus. Ora, a geração termina, antes na essência,
que nas potências. Logo, a graça está na essência da alma, antes de lhe estar
nas potências.
Esta questão depende da
precedente. Pois, se a graça é o mesmo que a virtude, há-de necessariamente
estar nas potências da alma como no sujeito, porque elas são o sujeito próprio
da virtude, como já dissemos (q. 56, a. 1). Se, ao contrário, difere da virtude,
não se pode dizer que as potências da alma sejam o sujeito dela, porque toda
perfeição das potências da alma tem natureza de virtude, como já dissemos (q.
55, a. 1, q. 56, a. 1). Donde se conclui, que a graça, assim como tem
prioridade sobre a virtude, tem também um sujeito às potências da alma, a
saber, a essência desta. Ora, pela potência intelectiva e pela virtude da fé, o
homem participa do conhecimento divino, e, pela potência da vontade e pela
virtude da caridade, participa do amor divino. Assim também, pela natureza da
alma participa, por uma certa semelhança, da natureza divina, regenerando-se,
de algum modo, e como criada de novo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— Assim como da essência da alma decorrem as suas potências, que são os
princípios das obras, assim também, da graça decorrem virtudes para as potências
da alma, que a movem aos seus actos. E sendo assim, a graça está para a vontade
como o motor, para o móvel, ou, o que é o mesmo, como o cavaleiro, para o
cavalo, não, porém, como o acidente, para a substância.
E daqui se deduz também clara a
RESPOSTA À SEGUNDA OBJECÇÃO. — Pois, a graça é, mediante as virtudes, o
princípio das obras meritórias, assim como a essência da alma é, mediante as
potências, o princípio das operações vitais.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Alma é o
sujeito da graça, enquanto pertencente à espécie da natureza intelectual ou
nacional. Ora, a alma não se especifica por meio de alguma potência, pois as
potências são propriedades naturais da alma, resultantes da espécie. E
portanto, a alma, por essência, difere especificamente das almas dos brutos e
das plantas. E por isso, de ser a essência da alma humana sujeito da graça não
se segue possa qualquer alma ser tal sujeito, pois, isso convém à essência da
alma, enquanto pertencente a uma determinada espécie.
RESPOSTA À QUARTA. — Sendo as
potências da alma propriedades naturais, resultantes da espécie, a alma não
pode existir sem elas. Mas, dado que o pudesse, ainda a alma seria chamada,
conforme a sua espécie, intelectual ou racional. Não por ter essas potências, actualmente,
mas por causa da sua essência específica, de que naturalmente decorrem tais
potências.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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