Em seguida devemos tratar do reato da
pena. E, primeiro, do reato em si mesmo. Segundo, do pecado mortal e do venial,
que se distinguem entre si pelo reato. E, na primeira questão discutem-se oito
artigos:
Art. 1 — Se o reato da pena é efeito
do pecado.
Art. 2 — Se um pecado pode ser pena de
outro.
Art. 3 — Se algum pecado implica o
reato da pena eterna.
Art. 4 — Se ao pecado é devida uma
pena quantitativamente infinita.
Art. 5 — Se todo pecado implica o
reato da pena eterna.
Art. 6 — Se o reato da pena permanece
depois do pecado.
Art. 7 — Se toda pena tem como causa
uma culpa.
Art. 8 — Se alguém pode ser punido
pelo pecado de outrem.
Art.
1 — Se o reato da pena é efeito do pecado.
(II
Sent., dist. XXXII, q. 1, a. 1; IV, dist. XIV, q. 2, a. 1, qª 2; III Cont.
Gent., cap. CXL: De Malo, q. 7, a. 10).
O primeiro discute-se assim. — Parece
que o reato da pena não é efeito do pecado.
1. — Pois o acidente não pode ser
efeito próprio da sua substância. Ora, o reato da pena é um acidente do pecado,
por estar fora da intenção do pecador. Logo, esse reato não é efeito do pecado.
2. Demais. — O mal não pode ser a
causa do bem. Ora, a pena, sendo justa e infligida por Deus, é boa. Logo, não é
efeito do pecado, que é um mal.
3. Demais. — Agostinho diz: toda alma
desordenada é a sua própria pena. Ora, uma pena não pode causar o reato de
outra, pois isso levaria ao infinito. Logo, o pecado não causa o reato da pena.
Mas, em contrário, diz a Escritura (Rm
2, 9): A tribulação e a angústia virá sobre toda a alma do homem que obra mal.
Ora, obrar mal é pecar. Logo, o pecado implica a pena, designada pelo nome de
tribulação e de angústia.
Como na ordem natural, também
na humana, uma coisa que se opõe a outra sofre detrimento por parte desta.
Assim, vemos, naquela ordem, que um contrário age mais veementemente quando
sobrevém o outro; e isso explica que a água aquecida se congela mais
compactamente, como diz Aristóteles. Assim também, vemos dar-se o mesmo com os
homens, por natural inclinação reprimimos quem se insurge contra nós.
Ora, como é manifesto, tudo o que está
contido numa certa ordem se unifica, de algum modo, em dependência do princípio
da ordem. Por onde e consequentemente, o que se insurge contra uma ordem
determinada será reprimido por ela e por quem é o seu princípio. Ora, sendo o
pecado um acto desordenado, é manifesto que quem peca age contra uma
determinada ordem. Donde é consequente que seja reprimido por ela própria. E
essa repressão constitui uma pena. Por isso, o homem pode ser punido por uma
tríplice pena, relativa à tríplice ordem a que está sujeita a vontade humana. Pois
primeiramente, a natureza humana está sujeita à ordem da própria razão; depois,
à de quem nos governa as acções externas, espiritual ou temporalmente, política
ou domesticamente; em terceiro lugar, à ordem universal do governo divino. Ora,
qualquer destas ordens fica pervertida pelo pecado, porque o pecador encontra a
razão, a lei humana e a divina. Daí o incorrer em tríplice pena: a proveniente
de si mesmo, que é o remorso da consciência; a outra, proveniente do homem; e,
a terceira, de Deus.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— A pena é consecutiva ao pecado, enquanto este é um mal em razão da sua
desordem. Donde, assim como o mal é acidental, no acto do pecador, estando-lhe
fora da intenção, assim também o reato da pena.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Uma pena justa
pode ser infligida tanto por Deus como pelo homem; por isso, a pena não é um
efeito do pecado, directamente, mas só dispositivamente. Ora, o pecado torna o
homem réu da pena, que é um mal; pois, como diz Dionísio, mal é, não o ser
punido, mas tornar-se digno de pena. Por isso, o reato da pena é, directamente
considerado, efeito do pecado.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Essa pena da
alma desordenada é devida ao pecado por perverter a ordem da razão. Mas também
se torna réu de outra pena, por perverter a ordem da lei divina ou humana.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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