Art. 3 — Se quem peca por
malícia intencional peca por hábito.
(II Sent., dist. XLIII, a. 2;
In Matth., cap. XII).
O
terceiro discute-se assim. — Parece que quem peca por malícia intencional peca
por hábito.
1.
— Pois, diz o Filósofo, que nem todos podem praticar actos injustos, ao modo do
injusto, i. é, por eleição, mas, só o que tem o hábito para tal. Ora, pecar por
malícia intencional é fazê-lo, com eleição do mal, conforme já se disse. Logo,
só quem tem o hábito pode pecar por malícia intencional.
2.
Demais. — Orígenes diz que ninguém se anula ou falha subitamente, mas só
paulatinamente e aos poucos há-de resvalar. Ora, o máximo deslize é pecar por
malícia intencional. Logo, não é repentinamente e desde o princípio, mas por um
costume diuturno, capaz de gerar o hábito, que chegamos a pecar por essa
malícia.
3.
Demais. — Sempre que pecamos por malícia intencional, necessariamente a vontade
por si mesma inclinar-se-á ao mal que elegeu. Ora, pela própria natureza da
potência, o homem não se inclina para o mal, mas ao contrário, para o bem.
Logo, se escolhe o mal fá-lo necessariamente por alguma coisa sobreveniente, a
saber, a paixão ou o hábito. Ora, quem peca por paixão não peca por malícia
intencional, mas por fraqueza, como já se disse. Logo, quem peca por malícia
intencional há-de, sempre e necessariamente, pecar por hábito.
Mas,
em contrário. — O hábito bom está para a eleição do bem, como o mau, para a do
mal. Ora, podemos sem termos o hábito da virtude, escolher o que é
virtuosamente bom. Logo, também podemos eleger o mal, sem termos um hábito
vicioso, e isso é pecar por malícia intencional.
A vontade comporta-se, de um modo, em relação ao bem e, de outro, ao mal.
Pois, pela natureza da sua potência, inclina-se para o bem racional como para o
objecto próprio, e por isso todo pecado é considerado contrário à razão.
Portanto e necessariamente, só por alguma causa estranha a eleição da vontade
se inclina para o mal. E, isso às vezes dá-se por deficiência da razão, como
quando pecamos por ignorância, outras, por impulso do apetite sensitivo, como
quando pecamos por paixão. E em nenhum destes casos pecamos por malícia
intencional, mas só quando a vontade se move propriamente para o mal. O que pode
dar-se de dois modos. — Primeiro, por alguma disposição corrupta, inclinante
para o mal, de modo a, em vista dessa disposição, algum mal nos ser conveniente
e semelhante, para o qual, em razão da semelhança, a vontade tende como se
fosse bem. Pois, cada ser tende, em si mesmo, ao que lhe é conveniente. E essa
disposição corrupta é ou um hábito adquirido pelo costume, que se converteu em
natureza, ou algum hábito corpóreo doentio, como quando temos certas
inclinações naturais para certos pecados, por causa da corrupção da nossa
natureza.
De
outro modo, a vontade pode tender, por si mesma, para o mal, pela remoção de um
obstáculo proibitivo. Assim, se nos abstivermos de pecar, não propriamente por
nos desagradar o pecado, mas pela esperança da vida eterna, ou pelo temor da
Geena, uma vez perdida a esperança, pelo desespero, ou o temor, pela presunção,
resultará o pecarmos por malícia intencional e quase sem freios.
Donde
fica claro, que o pecado, cometido por malícia intencional, sempre pressupõe alguma
desordem no homem, que contudo nem sempre é habitual. Portanto, quem peca por
malícia intencional nem por isso peca por hábito, necessariamente.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Proceder como o injusto é, não somente
praticar actos injustos por malícia intencional, mas ainda com prazer, e sem
grave oposição da razão. Ora, isso só o faz quem assim age habitualmente.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Não é repentinamente que resvalamos, pecando por malícia
intencional, mas isso pressupõe uma causa que nem sempre é um hábito, como já
se disse.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — O que inclina a vontade para o mal nem sempre é um hábito ou
paixão, mas podem ser algumas outras coisas, como já se disse.
RESPOSTA
À QUARTA. — A eleição do bem e a do mal não têm o mesmo fundamento. Pois, ao
passo que o mal nunca existe sem o bem natural, o bem pode existir sem o mal da
culpa perfeita.
Revisão da tradução portuguesa por ama
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