06/02/2014

Tratado dos vícios e pecados 03


Questão 71: Dos vícios e dos pecados em si mesmos.


Art. 3 ― Se o vício, i. é, o hábito mau, é pior que o pecado, i. é, o acto mau.





O terceiro discute-se assim. ― Parece que o vício, i. é, o hábito mau, é pior que o pecado, i. é, o acto mau.

1. ― Pois, assim como tanto melhor é o bem, quanto mais diuturno, assim, quanto mais diuturno, tanto pior é o mal. Ora, o hábito vicioso é mais diuturno que os actos viciosos, rapidamente transitórios. Logo, o hábito é pior que o acto vicioso.

2. Demais. ― Muitos males são mais para se fugirem, que um só mal. Ora, o hábito mau é causa virtual de muitos actos maus. Logo, o hábito vicioso é pior que o acto vicioso.

3. Demais. ― A causa tem preeminência sobre o efeito. Ora, o hábito aperfeiçoa o acto, tanto na sua bondade como na sua malícia. Logo, tanto em relação a esta como àquela, o hábito tem preeminência sobre o acto.

Mas, em contrário. ― Somos justamente punidos por um acto vicioso; não porém por um hábito vicioso não actualizado. Logo, o acto vicioso é pior que o hábito vicioso.

O hábito ocupa posição média entre a potência e o acto. Ora, é manifesto que, tanto em relação ao bem como ao mal, o acto tem preeminência sobre a potência, conforme diz Aristóteles 1, pois, é melhor agir bem que poder fazê-lo, e semelhantemente, merece maior vitupério agir mal, que poder fazê-lo. Donde também se segue que, tanto em relação à bondade como à malícia, o hábito ocupa um grau médio entre a potência e o acto, e assim, de um lado, o hábito, bom ou mau, tem preeminência, pela sua bondade ou malícia, sobre a potência, e, de outro, é dependente do acto. E isto bem claramente resulta de não se chamar bom ou mau o hábito senão por inclinar a um ato bom ou mau. Por onde, por causa da bondade ou da malícia do acto, dizemos que um hábito é bom ou mau. E assim o acto, tanto na sua bondade como na sua malícia, tem preeminência sobre o hábito, pois o que dá a um ser a sua vitalidade a tem com maior razão.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― Nada impede que uma coisa tenha, absolutamente, preeminência sobre outra a qual é, de certo modo, inferior. Pois, absolutamente falando, julgamos superior o que tem preeminência sobre outra coisa, levando em conta o que, numa e noutra, é essencial, e relativamente falando, a que tem preeminência quanto ao que é, em ambas, acidental. Ora, como já demonstramos, da própria noção de acto e de hábito resulta que aquele, tanto na sua bondade como na sua malícia, tem preeminência sobre este. E o ser o hábito mais diuturno que o acto resulta, acidentalmente, de que um e outro existe numa natureza tal que não pode agir sempre, e cuja acção se opera por um movimento transitivo. Logo, absolutamente falando, o acto, tanto na bondade como na malícia, tem preeminência, mas, o hábito tem-na, relativamente.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Um hábito não é constituído, de modo absoluto, de muitos actos, senão só de modo relativo, i. é, virtualmente. E por isso não se pode concluir daqui, que ele tenha, absolutamente, quanto à bondade ou à malícia, preeminência sobre o acto.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― O hábito é causa do acto, no género da causa eficiente, mas, este é causa daquele no género da causa final, apoiados na qual distinguimos as noções de bem e de mal. Logo, quanto à bondade e à malícia, o acto tem preeminência sobre o hábito.

Revisão da tradução portuguesa por ama

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Notas:
1. IX Metaph., lect. X.




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