09/11/2013

Tratado dos hábitos 8


Questão 50: Da substância dos hábitos
Art. 5 — Se a vontade é susceptível de algum hábito.

(II Sent., dist. XXVII, a. 1, ad 2, III, dist. XXIII, q. 1, a. 1, De Verit., q. 20, a. 2, De Virtut., q. 1, a. 1).

O quinto discute-se assim. — Parece que a vontade não é susceptível de nenhum hábito.

1. — Pois, os hábitos existentes no intelecto são espécies inteligíveis, pelas quais ele intelige em acto. Ora, a vontade não opera por meio de nenhumas espécies. Logo, a vontade não é sujeito de nenhum hábito.

2. Demais — Não o julgamos susceptível de nenhum hábito o intelecto agente, ao contrário do que se dá com o intelecto possível, que é uma potência activa. Ora, a vontade é, por excelência, uma potência activa, porque move todas as potências a concorrerem aos seus actos, como já se disse 1. Logo, nela não há nenhum hábito.

3. Demais — Nas potências naturais não há nenhum hábito, pois por natureza são determinadas a um certo termo. Ora, a vontade, por sua natureza, ordena-se a tender para o bem ordenado pela razão. Logo, a vontade não é susceptível de nenhum hábito.

Mas, em contrário, a justiça é um hábito. Ora, ela existe na vontade, pois é o hábito pelo qual queremos e obramos o que é justo, como já se disse 2. Logo, a vontade pode ser sujeito de algum hábito.

Toda potência que pode ordenar-se diversamente à acção necessita de um hábito pelo qual se dispõe bem para o seu acto. Ora, a vontade, sendo uma potência racional, pode ordenar-se diversamente à acção. Logo, é necessário admitirmos nela algum hábito pelo qual se disponha bem para o seu acto. Demais, da sua própria noção resulta que o hábito se ordena principalmente à vontade, pois é o de que usamos quando quisermos, segundo já ficou dito 3.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Assim como no intelecto há uma espécie que é semelhança do objecto, assim é necessário haver na vontade e em qualquer potência apetitiva algo pelo qual ela se inclina ao seu objecto, pois o acto da virtude apetitiva não passa de uma inclinação, como já dissemos 4. Ora, aquilo a que uma potência se inclina suficientemente, pela sua própria natureza não exige nenhuma qualidade inclinante. Mas como é necessário, para o fim da vida humana, que a potência apetitiva se incline para um objecto determinado, para o qual não se inclina pela própria natureza, que é relativa a muitos e diversos objectos, é necessário que haja na vontade e nas outras potências apetitivas certas qualidades inclinantes, chamadas hábitos.

RESPOSTA À SEGUNDA. — O intelecto agente é só agente e, de nenhum modo paciente. A vontade porém e qualquer potência apetitiva é motora e movida, como já se disse 5. Logo, não há semelhança, em ambos os casos, pois, ser susceptível de hábito convém ao que está de certo modo em potência.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A vontade, pela sua própria natureza, inclina-se para o bem da razão. Mas, como este bem se diversifica de múltiplas maneiras, necessário é a vontade inclinar-se por algum hábito, a um determinado bem da razão, para que daí resulte mais pronta a operação.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. Q. 9, a. 1.
2. V Ethic. (lect. I).
3. q. 50, a. 1.
4. Q. 6, a. 4.
5. III De anima (lect. XV).


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