23/11/2013

Tratado das virtudes em geral 2


Questão 55: Das virtudes quanto à sua essência.
Art. 2 — Se é da essência da virtude humana ser um hábito operativo.

(III Sent., dist. XXIII. Q. 1, a. qª 1).

O segundo discute-se assim. — Parece que não é da essência da virtude humana ser um hábito operativo.

1. — Pois, diz Túlio, o que se dá com a saúde e a beleza do corpo se dá também com a virtude da alma 1. Ora, a saúde e a beleza não são hábitos operativos. Logo, também a virtude não o é.

2. Demais — Há, nos seres naturais, virtude, não só para agir, mas também para existir, pois, vemos claramente no Filósofo 2, que certos seres têm a virtude de existir sempre, outros a de existir, não sempre, mas durante um determinado tempo. Ora, a virtude natural comporta-se, nos seres naturais, como a virtude humana, nos racionais. Logo, também a virtude humana é relativa, não só ao agir, mas também ao existir.

3. Demais. — O Filósofo diz 3, que a virtude é uma disposição do perfeito para o óptimo. Ora, o óptimo, para o qual o homem se dispõe pela virtude, é o próprio Deus, como Agostinho 4 prova, para o qual ela se dispõe pela assimilação. Logo, parece que a virtude deve ser denominada uma certa qualidade da alma ordenada para Deus, enquanto nos torna semelhantes a ele, e não, ordenada para a operação. Logo, não é um hábito operativo.

Mas, em contrário, o Filósofo diz, que a virtude de um ser é o que lhe torna boa a operação 5.

A virtude, conforme o significado próprio da palavra, implica uma certa perfeição da potência, com já se disse 6. Ora, como há dupla potência — uma relativa ao ser e outra, ao agir — a perfeição de uma e outra chama-se virtude. A potência para o ser, porém, funda-se na matéria, que é um ser potencial, ao passo que a potência para agir se funda na forma, que é o princípio da acção, porque um ser age na medida em que é actual. Ora, na constituição do homem, o corpo comporta-se como matéria e a alma, como forma. Ora, o homem tem corpo como os brutos, como também tem as potências comuns ao corpo e à alma. Só as faculdades próprias à alma, i. é, as racionais, é que pertencem exclusivamente ao homem. Donde, a virtude humana, de que agora tratamos, não pode pertencer ao corpo, mas somente ao que é próprio da alma. Logo, ela não implica em ordenar-se para o ser, mas antes, para a acção. E, portanto, é da essência da virtude humana ser um hábito operativo.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.— O modo da acção é consequente à disposição do agente, pois um ser, assim como é, assim age. Donde, sendo a virtude o princípio de certas operações, é necessário que preexista no agente, relativamente à virtude, alguma disposição que lhe seja conforme. Ora, a virtude é que torna a operação ordenada. Donde, a virtude, em si mesma, é uma disposição ordenada da alma, pela qual as potências desta se ordenam, de certo modo, uma para as outras e para o que lhes é exterior. E portanto, a virtude, enquanto disposição conveniente da alma, assimila-se à saúde e à beleza, que são disposições próprias do corpo. Mas isto não impede que a virtude seja também um princípio de operação.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A virtude relativa ao existir não é própria do homem, mas só a relativa à actividade da razão, é que lhe é própria.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A substância de Deus, sendo a sua acção, a suma assimilação do homem com Deus é fundada em alguma operação. Donde, como já se disse 7, a felicidade ou bem-aventurança, pela qual o homem sobretudo se conforma com Deus, fim da vida humana, consiste na acção.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. IV De Tuscul. Quaest.
2. I De Caelo.
3. VII Physicorum
4. De moribus Ecclesiae, cap. III, XIV.
5. II Ethic., lect. VI.
6. Q. 55, a. 1.
7. Q. 31, a. 2.


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