Questão 35: Da dor e da tristeza em si mesmas.
Art. 7 — Se a dor externa é maior que a dor interna do coração.
(Infra, q. 37, a. 1, ad 3).
O
sétimo discute-se assim. — Parece que a dor externa é maior que a dor interna
do coração.
1. — Pois, a dor corpórea externa procede de uma causa repugnante à boa conservação do corpo, sede da vida, ao passo que a dor interna é causada por alguma imaginação do mal. Ora, sendo a vida mais amada que o bem é imaginado, resulta, conforme o que já foi dito 1, que a dor externa é maior que a interna.
2.
Demais — Mais move uma coisa real que a sua semelhança. Ora, a dor externa
provém da união real com algum contrário, ao passo que a interna, da semelhança
apreendida do contrário. Logo aquela é maior que esta.
3.
Demais — A causa é conhecida pelo seu efeito. Ora, a dor externa produz efeitos
mais fortes, assim o homem morre mais facilmente por causa de dores externas
que por causa da interna. Logo, a dor externa é maior e mais para evitar, que a
interna.
Mas,
em contrário, diz a Escritura (Ecl 25, 17): A tristeza do coração é
uma praga universal, e a maldade da mulher é uma consumada malícia. Logo, como
a malícia da mulher supera todas as outras, conforme desse texto se deduz,
assim a tristeza do coração excede todas as dores externas.
A dor externa e a interna têm um ponto comum e, dois, pelos quais diferem.
Têm de comum o serem ambas movimentos da virtude apetitiva, como já dissemos 2.
Mas diferem pelos dois elementos implicados na tristeza e no prazer, a saber, a
causa, que é o bem ou o mal anexo, e a apreensão. Ora, a causa da dor externa é
o mal anexo, repugnante ao corpo, ao passo que a da dor interna é o mal anexo
repugnante ao apetite. Além disso, a dor externa resulta da apreensão do
sentido, e especialmente do tacto, enquanto que a interna resulta da apreensão
interna, i. é, da imaginação, ou também da razão.
Se
portanto compararmos a causa da dor interna com a da externa, uma pertence, em
si mesma, ao apetite que abrange ambas as dores, mas a outra pertence-lhe imediatamente.
Assim, a dor interna provém de alguma coisa repugnar ao apetite directamente, e
a externa, de lhe repugnar a este por já ter repugnado antes ao corpo. E como
sempre o existente por si tem prioridade sobre o existente por outro, por este
lado a dor interna tem proeminência sobre a externa. — E o mesmo resulta se
considerarmos a apreensão. Pois a apreensão racional e imaginativa é mais
elevada que a do sentido do tacto. Donde, absolutamente falando e em si mesma,
a dor interna é mais forte que a externa. E a prova é que aceitamos
voluntariamente, as dores externas, para evitarmos a interna. E enquanto a dor
externa não repugna ao apetite interior, torna-se de certo modo deleitável e
agradável à alegria interior.
Às
vezes, porém, a dor externa é acompanhada da interna, e então a dor aumenta.
Pois a interna é, não só maior que a externa, mas também mais universal. Assim,
tudo o repugnante ao corpo pode repugnar ao apetite interno, e tudo o
apreendido pelo sentido pode ser apreendido pela imaginação e pela razão, mas
não inversamente. E por isso a autoridade aduzida diz expressamente: a tristeza
do coração é uma praga universal, porque as dores dos flagelos exteriores estão
compreendidas na tristeza interna do coração.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A dor interna pode também ser causada pelo
que contraria a vida. E assim não devemos pensar que a relação existente entre
a dor externa e a interna se funde nos males diversos causados pela dor, antes,
se funda na relação diversa dessa causa da dor com o apetite.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — A tristeza interior não procede da semelhança da coisa apreendida,
como de causa. Pois o homem não se contrista, internamente, com a semelhança da
coisa apreendida, mas com a própria coisa, de que apreende o símile. E essa
coisa é tanto mais perfeitamente apreendida, pela sua similitude, quanto mais
imaterial e abstracta esta for. E portanto, a dor interna, considerada em si
mesma, é maior, como causada por um maior mal existente, pois o mal é mais
conhecido pela apreensão interna.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — As imutações corpóreas são causadas sobretudo pela dor externa,
quer por um princípio de corrupção anexo ao corpo ser a causa dela o que
implica a apreensão do tacto, quer também por ser o sentido externo mais corpóreo
que o interno, assim como o apetite sensitivo o é mais que o intelectivo. E por
isso, como já antes dissemos, é sobretudo pelo movimento do apetite sensitivo
que o corpo sofre imutação, e semelhantemente, mais pela dor externa do que
pela interna.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1.
Q. 35, a. 6.
2.
Q. 35, a. 1.
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