19/06/2013

Tratado das paixões da alma 56



Questão 34: Da bondade e da malicia dos prazeres

Art. 2 ― Se todo prazer é bom.


(IV Sent., dist. XLIX, q. 3, a. 4, qa. 1, VII Ethic., lect. XI, X, lect. IV, VIII).



O segundo discute-se assim. ― Parece que todo prazer é bom.


1. ― Pois, como dissemos na primeira parte 1, o bem divide-se em três espécies ― o honesto, o útil e o deleitável. Ora, tudo o que é honesto é bom, bem como tudo o que é útil. Logo, todo prazer também é bom.

2. Demais. ― É bom em si o que não é buscado em vista de outro fim, como diz Aristóteles 2. Ora, o prazer não é buscado em vista de outro bem, pois é ridículo perguntar a alguém porque quer gozar. Logo, o prazer é em si mesmo bom. Ora, o que se diz em si mesmo, de um ser, dele se diz universalmente. Logo, todo prazer é bom.

3. Demais. ― O desejado por todos é em si mesmo bom, pois bem é o que todos os seres desejam, como diz Aristóteles 3. Ora, todos desejam algum prazer, mesmo as crianças e os animais. Logo, o prazer é em si mesmo bom e portanto todo prazer é bom.

Mas, em contrário, diz a Escritura (Pr 2, 14): Que se alegram depois de terem feito o mal, e triunfam de prazer nas piores coisas.

Assim como certos estóicos disseram que todos os prazeres são maus, assim os epicuristas, ensinavam, ser o prazer em si mesmo bom, e por consequência, que todos os prazeres são bons. E uns e outros se enganaram por que não distinguiram entre o absoluta e o relativamente bom. Ora, é bom absolutamente o bom em si mesmo. Pode porém suceder, e de duplo modo, que aquilo que não é em si mesmo bom venha a sê-lo para alguém num determinado caso. De um modo, por lhe ser conveniente, pela disposição em que actualmente se acha, embora esta não lhe seja natural, assim, a um leproso é, às vezes, bom comer certos alimentos envenenados, não absolutamente convenientes à compleição humana. De outro modo, quando o não conveniente é considerado como o sendo. E sendo o prazer o repouso do apetite no bem, se este o for, absolutamente, o prazer será absoluto e absolutamente bom. Se porém o bem não o for, absoluta, mas relativamente, também o prazer não é absoluto, mas relativo a um determinado caso, nem é absolutamente bom, mas bom, relativa ou aparentemente.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― É relativamente à razão que consideramos um bem como honesto e útil, e portanto, nada é honesto ou útil sem ser bom. O deleitável porém é relativo ao apetite, que às vezes tende ao não conveniente à razão. Donde, nem tudo o deleitável tem bondade moral, dependente da razão.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― O prazer não é procurado como meio para a obtenção de outro bem porque é o repouso no fim. Ora, este pode ser bom e mau, embora não seja nunca fim senão enquanto bem de um determinado indivíduo. E o mesmo se dá com o prazer.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Todos os seres buscam o prazer do mesmo modo por que buscam o bem, pois o prazer é o repouso do apetite no bem. Mas como pode acontecer que nem todo o bem desejado seja bem em si mesmo e verdadeiramente, assim também nem todo prazer é em si mesmo e verdadeiramente bem.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. Q. 5, a. 1.
2. I Ethic., lect. VII.
3. I Ethic., lect. I.

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