Questão 17: Dos actos
ordenados pela vontade.
Art. 9 ― Se os membros do corpo obedecem à razão.
(I, q. 81, a . 3 ad 2, infra,
q. 56 a . 4, ad 3, q. 58, a . 2, II Sent., dist. XX, q. 1, a . 2, ad
3, De Pot., q. 3, a . 15, ad 4).
O
nono discute-se assim. ― Parece que os membros do corpo não obedecem à razão.
1. ― Pois como se sabe, distam mais da razão que as virtudes da alma vegetativa. Ora, estas não obedecem à razão, como já se disse 1. Logo, muito menos os membros do corpo.
2.
Demais. ― O coração é o princípio do movimento animal. Ora, os movimentos do
coração não estão sujeitos ao império da razão, pois, como diz Gregório Nisseno
(Nemésio), seu pulsar não é regulado pela razão 2. Logo, o movimento
dos membros corpóreos não está sujeito ao império da razão.
3.
Demais. ― Como diz Agostinho, o movimento dos órgãos da geração, ora, é
importuno e involuntário, ora, não obedece à vontade, quando querido e o corpo
fica frígido quando a concupiscência ferve na alma 3. Logo, o
movimento dos membros não obedece à razão.
Mas,
em contrário, diz Agostinho: A alma ordena que a mão se mova e esta o faz com
tanta felicidade, que apenas se distingue a ordem, da execução 4.
Os membros do corpo são por assim dizer os órgãos das potências da alma, e
portanto, do modo por que estas obedecem à razão, desse mesmo também obedecem
aqueles. Ora, como as virtudes sensitivas estão sujeitas ao império da razão,
mas não as naturais, assim também, todos os movimentos dos membros resultantes
das potências sensitivas estão sujeitos ao sobredito império, não o estão
porém, os resultantes das virtudes naturais.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Os membros não se movem a si mesmos mas são
movidos pelas potências da alma, das quais certas mais se aproximam da razão
que as virtudes da alma vegetativa.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― No que respeita ao intelecto e à vontade, primeiro encontramos o
que é natural, donde o mais deriva, assim, do conhecimento natural dos
primeiros princípios deriva o conhecimento das conclusões, do fim naturalmente
desejado pela vontade resulta a eleição dos meios. Assim também, nos movimentos
corpóreos, o princípio é natural. Pois, o princípio do movimento corpóreo
procede do movimento do coração, e por isso este é natural e não voluntário,
resultando, como acidente próprio, da vida, que procede da união do corpo com a
alma. Semelhantemente, o movimento dos corpos graves e leves resulta da forma
substancial dos mesmos, e por isso se diz que são movidos pelo gerador,
conforme o Filósofo 5. E daqui vem que esse movimento se chama
vital. Donde, diz Gregório Nisseno (Nemésio), que assim como a potência
geratriz e a nutritiva não obedecem à razão, assim também não obedece o
movimento pulsativo, que é vital, assim designado essa expressão o movimento do
coração, que se manifesta pelas veias pulsáteis.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― Como diz Agostinho 6, é por pena do pecado que o
movimento dos membros genitais não obedece a razão, de modo que a alma sofra a
pena da sua desobediência a Deus, precisamente no membro pelo qual o pecado
original se transmite aos descendentes. Mas como pelo pecado dos nossos
primeiros pais, conforme a seguir se dirá 7, a natureza foi
abandonada a si mesma, privada do dom sobrenatural, que fora divinamente
conferido ao homem, vejamos qual a razão natural por que, em particular, o
movimento desses membros não obedece à razão. Aristóteles, no livro De causis
motus animalium descobre a causa em os movimentos do coração e dos membros
pudendos serem involuntários, pois, estes movem-se em consequência de alguma
apreensão, em virtude da qual o intelecto e a fantasia representam algo de que
resultam paixões da alma, provocadoras de tal movimento. E não se movem
conforme a injunção da razão ou do intelecto porque para o movimento de tais
membros é necessária alguma alteração natural ― a calidez ou a frieza ― que não
está sujeita ao império da razão. ― E isso se dá especialmente com esses dois
membros porque cada um deles é como que um animal separado, enquanto princípio
de vida, ora, o princípio é, virtualmente, o todo. Assim, o coração é o
princípio dos sentidos, e do membro genial procede a virtude seminal que
constitui, virtualmente, todo o animal. E por isso tem naturalmente movimentos
próprios, por ser necessário que os princípios sejam naturais, como já se
disse.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
___________________________
Notas:
1.
Q. 17, a. 8.
2.
De Nat. Hom., cap. XXII.
3.
XIV De civ. Dei, cap. XVI.
4. VIII Confess., cap. IX.
5.
VIII Phys., lect. VIII.
6.
XIV De Civit. Dei, cap. XVII.
7.
Q. 85 a. 1.
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