08/02/2013

Tratado dos actos humanos 26


Art. 4 — Se a vontade é necessariamente movida por Deus.


(I, q. 83, a . 1, ad 3, De Verit., q. 24, a . 1, ad 3, De Malo, q. ad 3).



O quarto discute-se assim. ― Parece que a vontade é movida necessariamente por Deus.





1. ― Pois, todo agente a que se não pode resistir move necessariamente. Ora, não se pode resistir a Deus, cujo poder é infinito, pois por isso diz a Escritura (Rm 9, 19): Quem é o que resiste à sua vontade? Logo, necessariamente, Deus move a vontade.

2. Demais. ― Como já se disse 1, a vontade é movida necessariamente quanto ao que naturalmente quer. Ora, diz Agostinho, é natural a cada ser que Deus nele opere 2. Logo, a vontade quer necessariamente tudo quanto a que é movida por Deus.

3. Demais. ― É possível o que, posto, não causa nenhuma impossibilidade. Ora, admitir-se que a vontade não quer aquilo a que Deus a move, resulta uma impossibilidade, a saber que a operação de Deus seria ineficaz.

Mas, em contrário, diz a Escritura (Ecle 15, 14): Deus criou o homem desde o princípio e deixou-o na mão do seu conselho. Logo, não lhe move necessariamente a vontade.

Como diz Dionísio, é próprio à providência divina, não corromper, mas conservar a natureza das coisas 3. Donde, move todas as coisas conforme a condição delas, e, assim, por moção divina as causas necessárias produzem necessariamente os seus efeitos, e as causas contingentes, contingentemente os seus. Ora, a vontade é um princípio activo não determinado a um só termo, mas comportando-se indiferentemente em relação a muitos. Donde, Deus move-a sem determiná-la necessariamente a um termo, permanecendo-lhe, antes, o movimento contingente e não necessário, salvo naquilo ao que é naturalmente movida.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — No poder da divina vontade está não somente operar por meio da coisa que move, mas ainda, fazer tal de modo congruente a essa coisa. E por isso, mais repugnaria à moção divina ser a vontade movida necessariamente, o que não lhe convém à natureza, do que livremente, como lhe convém.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― É natural a um ser tudo o que Deus nele opera para que seja o que é, assim, a cada ser convém o que Deus quer lhe convenha. Ora, ele não quer que tudo o operado nas coisas seja natural ― p. ex., que os mortos ressuscitem ― mas sim, que cada ser natural esteja submetido ao poder divino.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― Se Deus move a vontade para alguma coisa, é impossível mas não absolutamente, que a vontade para esta não seja movida. Donde não se segue que a vontade seja necessariamente movida por Deus.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. Q. 10, a. 2 ad 3.
2. XXVI Contra Faustum, cap. III.
3. De div. nom., lect. XIII. 

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